Dissertaa§a£o defendida na Faculdade de Direito revela como os agentes da justia§a compreendem os meandros da alienação parental
Rafaella Malta: observação participante, coleta de dados e dia¡logos
“Ha¡ um medo por parte dos juazes de decidir. Eles sabem que não va£o conseguir promover a harmonia.†Essa observação feita pela advogada de familia Rafaella Malta resume o drama de magistrados obrigados a tomar decisaµes que interferem, de forma definitiva, na vida de ma£es, pais e criana§as envolvidos em disputas pela guarda ou pela ampliação do tempo de convavio com os filhos.
Durante dez meses, Rafaella reuniu material para um estudo etnogra¡fico sobre a guarda e a regulamentação de visitas em seis varas de familia do Forum Lafayette, em Belo Horizonte. Valendo-se da técnica da observação participante, ela acompanhou cerca de 40 audiaªncias, coletou e analisou dados e promoveu dia¡logos com as partes envolvidas e entrevistas com juazes, promotores, advogados e defensor paºblico, os quais ela chama de agentes da justia§a. “O que me interessava era ver como aqueles agentes contracenavam com os protagonistas dos conflitos, observar o cumprimento da lei da alienação parental e a visão daqueles que a aplicamâ€, conta a pesquisadora, que, em abril, defendeu, na Faculdade de Direito, a dissertação Alienação parental: notas etnogra¡ficas das varas de familia de Belo Horizonte.
Outro olhar
De acordo com Rafaella, que atua na área de conflitos familiares, a etnografia éum campo da antropologia que se caracteriza pela imersão do pesquisador em um ambiente diferente do seu para observar, na prática , aquilo que geralmente évisto na teoria. “a‰ como se fosse um outro olhar para o estudo do direitoâ€, explica a advogada.
Ao longo de sua imersão, Rafaella Malta percebeu que, na disputa pela guarda ou na batalha pela ampliação do tempo com os filhos, questões de gaªnero va£o surgindo de forma sutil. “A ma£e sempre deve provar que cuida do lar e das tarefas, enquanto o pai necessita mostrar que éum bom provedor e arca com suas despesasâ€, exemplifica. Em algumas situações mais graves, quando o pai éo alienador, háum prolongamento da violência doméstica conjugal: “Parece haver um desejo de retirar da mulher atéa oportunidade de ser ma£eâ€, comenta Malta.
Em relação aos casos de guarda e regulamentação de visita analisados por Rafaella, a alienação parental éalegada em 37% deles, de forma direta ou indireta. Na prática , a alienação parental não écrime. a‰ um fato que gera alguma forma de responsabilização, sendo a mais grave delas a retirada da criana§a do convavio do alienador.
Em algumas situações mais graves, quando o pai éo alienador, háum prolongamento da violência doméstica conjugal.
A advogada cita também uma dicotomia bastante presente nos discursos das partes e na forma como eles são interpretados pelos agentes da justia§a: “Na teoria, háuma discussão sobre alienação parental e sandrome da alienação parental, na visão dos agentes. A primeira éencarada como algo compreensavel e situacional para quem acabou de sair de um diva³rcio. A outra évista como uma patologia, um transtorno mental. No discurso das partes, ambos os elementos estãopresentes, embora nenhum deles seja predominanteâ€, afirma Rafaella.
No direito, a orientação anãtica éresolver o conflito para além do processo juradico, visando a satisfação dos envolvidos. No entanto, mesmo com a sentena§a do juiz, os casos julgados pelas varas de familia parecem ser de difacil resolução, e as decisaµes se revelam mais paliativas do que, de fato, satisfata³rias. Esse quadro éainda mais drama¡tico quando se olha mais atentamente para a efetividade da resolução do problema da criana§a ou do adolescente após todo o desgaste provocado pelo conflito. Segundo Rafaella, com frequência o menor parece não ser o centro das atenções, seja no discurso dos pais, seja na abordagem dos agentes da justia§a. “Muitas vezes, a criana§a évista menos como sujeito de direitos e mais como sujeito passivo, alguém que recebe uma ação, pura e simplesmente. A alienação parental foca muito nos pais que se comportam mal e não atribui a importa¢ncia devida a s consequaªncias dessa alienação para os filhos, principalmente se levarmos em conta que eles tem uma percepção própria da situação na qual estãoinseridosâ€, conclui.