Humanidades

Conflitos religiosos na andia despertaram o interesse de estudiosos de Stanford pela paz
A destruia§a£o violenta de um local sagrado mua§ulmano na andia levou a estudiosa de estudos religiosos Anna Bigelow a perguntar por que algumas comunidades sucumbem a  violência e outras não.
Por Sandra Feder - 15/11/2020

Depois de se formar no Smith College em estudos religiosos e inglês, Anna Bigelow teve a oportunidade de estudar por três meses na andia, umpaís que cativou seu interesse como estudante.

Anna Bigelow em casa
A experiência de conflito inter-religioso na andia despertou em
Anna Bigelow um interesse acadêmico em Espaços sagrados
compartilhados e pluralidade religiosa. (Crédito da imagem:
Andrew Brodhead)

Em 1992, Bigelow, agora professora associada de estudos religiosos em Stanford, ingressou em um programa de estudos budistas realizado em um mosteiro birmanaªs em Bodh Gaya, localizado no centro do norte da andia, onde seus dias consistiam em aulas de la­ngua, filosofia e antropologia e no aprendizado da meditação budista técnicas.

Perto do final desse programa, ocorreu um dos eventos mais catacla­smicos da história da andia. A mesquita Babri Masjid foi demolida por manifestantes hindus que alegaram que a mesquita, que existia desde o século 16, havia sido construa­da sobre o local de nascimento do deus hindu Rama.

O violento confronto gerou outros confrontos em todo opaís entre nacionalistas hindus e mua§ulmanos por causa de locais religiosos. Um aconteceu a apenas 2 milhas de distância de onde Bigelow estava hospedado.

Esses eventos permaneceram na mente de Bigelow por muito tempo depois que ela voltou para casa e viriam a moldar não apenas seus estudos de graduação, mas o resto de sua vida acadaªmica.

Estudando pluralismo religioso

Ao retornar aos Estados Unidos, Bigelow iniciou um programa de mestrado na Universidade de Columbia, onde descobriu abundantes estudos emergentes sobre os distúrbios que envolveram a andia enquanto ela estava la¡. A maior parte da pesquisa girou em torno do motivo dos tumultos em certos lugares, mas Bigelow ficou particularmente impressionado com o que não estava sendo discutido - ou seja, o que énecessa¡rio para manter a paz, particularmente em um espaço sagrado compartilhado. Afinal, inúmeros locais no sul da asia foram locais de adoração comunal paca­fica durante séculos.

Anna Bigelow falando com o zelador de um santua¡rio de tumba sufi em
Punjab Anna Bigelow falando com o zelador de um santua¡rio
de tumbasufi em Punjab, andia, 2001. (Crédito da imagem:
Cortesia de Anna Bigelow)

“Por muitos anos, atéa mesquita Babri Masjid foi compartilhada”, disse Bigelow, que ingressou na Escola de Humanidades e Ciências em 2019. “Isso me pareceu bastante nota¡vel, visto que não éalgo que vocêvaª muito no contexto dos Estados Unidos.”

Fascinado pela ideia de Espaços sagrados compartilhados e pluralidade religiosa, Bigelow retornou a  andia em 2000 como estudante de doutorado na Universidade da Califa³rnia, em Santa Ba¡rbara, para se aprofundar na relação complexa entre mua§ulmanos e não mua§ulmanos na regia£o norte da andia de Punjab. Ela estava particularmente ansiosa para examinar a cultura mua§ulmana na andia, porque, na anãpoca, a maior parte dos estudos sobre a vida mua§ulmana se concentrava no Oriente Manãdio.

Foi nessa viagem que ela foi apresentada a  cidade de maioria mua§ulmana de Malerkotla - uma comunidade onde a pluralidade religiosa estãoprofundamente enraizada em sua história. No ini­cio do século 18, a regia£o estava em guerra quando os dois filhos mais novos de um guru sikh foram capturados pelas forças moga³is adversa¡rias. Um aliado mua§ulmano da força de captura que era o governante de Malerkotla tentou salva¡-los da execução.

Embora o esfora§o não tenha sido bem-sucedido, o guru sikh ouviu falar dele e abena§oou o reino mua§ulmano. De acordo com a tradição local, foi essa baªnção que protegeu Malerkotla em 1947, durante a separação da andia do Paquistão e a violência que se seguiu, e continua a protegaª-la hoje.

Fraternidade e harmonia

A pesquisa de Bigelow em Malerkotla durante seu ano e meio la¡ lançou as bases para seu trabalho posterior e ainda éo foco de sua bolsa de estudos hoje. “Fiquei muito interessada no não-evento de violência e no que torna esta cidade em particular tão resiliente”, disse ela.

O que ela encontrou foi o compromisso de tornar o pluralismo paca­fico uma prioridade por meio de um conjunto de entendimentos, identidades, perspectivas religiosas e locais religiosos compartilhados. Essa pesquisa inicial levou ao seu primeiro livro, Sharing the Sacred: Practicing Pluralism in Muslim North India (Oxford University Press, 2010). “Havia uma identidade coletiva estruturada em torno dessa ideia de ser uma cidade baseada na fraternidade, na paz e na harmonia inter-religiosa”, disse ela.

Bigelow estãoatualmente trabalhando em seu segundo livro, que éum estudo comparativo de locais sagrados compartilhados na andia e na Turquia. Uma viagem aos doispaíses para continuar sua pesquisa foi adiada devido a  pandemia COVID-19.

“Existem muitas igrejas locais na Turquia a s quais os mua§ulmanos va£o com bastante regularidade, porque são os lugares que vocêvai para orar por certas coisas”, explicou Bigelow. Isso éespecialmente verdadeiro no caso de igrejas devotadas a Maria ou Sa£o Jorge, que estãoligadas a  figura sagrada do Isla£ conhecida como Hizir ou Khidr.

“A maioria dos humanos tem os mesmos problemas e necessidades dos outros humanos, seja qual for sua religia£o. Esses lugares tendem a reunir pessoas de todas as classes, gêneros e religiaµes ”, disse Bigelow. “Na andia, da mesma forma, háum amplo cruzamento de pessoas que acreditam que hálgo especial la¡. Que Deus estãoouvindo nesses lugares com mais atenção do que em outros lugares. ”

Pluralismo religioso hoje

O estudo de Bigelow sobre o que torna o pluralismo religioso bem-sucedido assumiu mais urgência recentemente, a  medida que os governos da Turquia e da andia se mobilizaram para promover suas religiaµes majorita¡rias.

Por exemplo, a Lei de Emenda a  Cidadania da andia, aprovada no ano passado, possibilitou que migrantes de certospaíses e religiaµes recebessem uma cidadania acelerada - com a exclusão dos praticantes do Isla£. Em toda a andia, ocorreram coma­cios e protestos contra o ato.

Malerkotla, a cidade que inspirou o interesse de Bigelow pela cooperação inter-religiosa, também foi nota­cia novamente.

“Malerkotla agora se tornou um centro regional de ativismo contra algumas dessas políticas e eventos anti-mua§ulmanos”, disse Bigelow. “Existem locais onde sikhs, hindus e mua§ulmanos estãose reunindo e fazendo demonstrações, protestos, leituras de poesia, teatro de rua e todos os tipos de formas criativas e adaptativas pelas quais estãoresistindo a s forças da polarização.”

De sua parte, Bigelow continua a se inspirar no compromisso de Malerkotla com sua história e no esfora§o necessa¡rio para que a comunidade mantenha sua identidade em um mundo em mudança. “Eles estãose lembrando de sua própria história de pluralismo e fraternidade multicultural”, disse ela, observando que o compromisso da cidade continua a ressoar em seu trabalho todos esses anos depois.

“Estou impressionado com a forma como as pessoas levam isso a sanãrio, pois exige esfora§o. Nãoéapenas algo que vocêpode considerar garantido ”, acrescentou Bigelow. “Vocaª tem que continuar trabalhando nisso se esta éa sociedade que vocêdeseja. Isso tem sido muito humilhante e impressionante de ver, e também emocionante. ”

 

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