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Comunidade amaza´nica transforma resíduos em recursos
A experiência vivida na área pode servir de exemplo para outras cidades brasileiras.
Por José Tadeu Arantes - 09/09/2021


Com o apoio de ONGs, universidades e empresas, os habitantes de pequenas cidades amaza´nicas praticam uma economia circular autossustenta¡vel, na qual os resíduos são convertidos em insumos para a produção. Crédito: Michel Xocaira Paes

Uma nova forma de cidadania e ação comunita¡ria estãoem exibição em algumas pequenas cidades da Amaza´nia brasileira. Segundo levantamento de campo realizado em Carauari - que fica a duas horas de voo ou cinco dias de barco saindo da capital amazonense, Manaus - os habitantes da cidade estãoaltamente organizados para praticar um tipo de economia circular que transforma resíduos em recursos. A experiência vivida na área pode servir de exemplo para outras cidades brasileiras.

Um artigo sobre o estudo aparece na npj Urban Sustainability .

“Carauari fica no rio Jurua¡, com 28.000 habitantes - 21.500 na parte urbana e 6.500 nas áreas rurais e florestais adjacentes. O governo federal tem pouca presença na regia£o, mas as associações locais estãofazendo parceria com organizações não governamentais, universidades e empresas com uma economia autossustenta¡vel baseada principalmente na pesca do pirarucu [Arapaima gigas], extração de la¡tex, coleta de aa§aa­ [Euterpe oleracea] e produção de a³leo vegetal, atividades que tem alcana§ado resultados expressivos em termos de conservação da biodiversidade local e bem-estar. Sa£o mantidos por uma organização social muito boa, graças ao envolvimento de redes de base como a Associação dos Produtores Rurais de Carauari [ASPROC],Associação dos Moradores da Reserva de Desenvolvimento Sustenta¡vel do Uacari [AMARU] e Cooperativa Mista da Reserva Extrativista do Manãdio Jurua¡ [Codaemj] ”, disse Michel Xocaira Paes, primeiro autor do estudo. Paes épesquisador do Departamento da Fundação Getaºlio Vargas da Administração Paºblica e seu Centro de Infraestrutura e Soluções Ambientais (CEISA-FGV).

Essas atividades produtivas se integram para formar uma economia circular, explicou Paes. Resa­duos de uma atividade não são um problema que polui o meio ambiente, mas são convertidos em recursos que alimentam outra atividade. Por exemplo, as cascas das sementes esmagadas para produzir a³leo vegetal são compostadas e as tripas dos peixes são processadas para fazer ração para tartarugas.

“As comunidades produzem cerca de 100 toneladas por ano de pescado beneficiado de acordo com os princa­pios da gestãosustenta¡vel. A atividade gera cerca de 7.500 kg de resíduos, que são reciclados e misturados com resíduos de outros processos, como a produção da farinha de mandioca, para a produção ração para tartarugas de águadoce. Essa estratanãgia éimportante para garantir a viabilidade econa´mica de um projeto comunita¡rio de criação de tartarugas de águadoce, outro bem-sucedido programa de conservação em andamento no Jurua¡ ”, disse Paes.

"O que vi foi uma comunidade fortalecida plenamente consciente de que um meio ambiente bem conservado éseu recurso principal, e que a floresta viva éincomparavelmente mais valiosa do que madeira morta ou terra desmatada. O que essa população estãofazendo ao converter resíduos em insumos estãomudando muito com sucesso de uma economia degradativa linear para uma economia regenerativa circular. "
 
Atéa implantação do novo modelo, tanto o pirarucu quanto a tartaruga eram espanãcies ameaa§adas de extinção na área. Essa ameaça foi evitada graças a  participação da comunidade. “Eles estãoobtendo bons resultados com muita atenção a  preservação do meio ambiente, associada ao investimento de parceiros como ONGs, instituições de pesquisa , universidades e empresas”, disse Paes.

Para coletar os dados utilizados no estudo, Paes fez um passeio de barco de 15 dias ao longo do Jurua¡, visitando várias aldeias espalhadas pela área, com 50-100 domica­lios cada.

A experiência de Carauari éum exemplo de alternativas que podem ser usadas para implementar uma economia circular em muitas das pequenas cidades da Amaza´nia. “Iniciativas de co-gestãopara proteger a biodiversidade local e agregar valor a s cadeias produtivas estãoem andamento em vários lugares”, disse Paes. “A integração da cogestãoe da economia circular éuma forma de fortalecer e expandir a urbanização sustenta¡vel vinculada a  agroindaºstria baseada na biodiversidade e na proteção da floresta. A superexploração de produtos da biodiversidade pode ser evitada respeitando princa­pios ecola³gicos muito simples, como colheita e pesca quotas e determinar os períodos e locais onde a colheita e a pesca são proibidas.

“A Amaza´nia éum reservata³rio extraordina¡rio de recursos como a¡gua, floresta, plantas e animais. Destruir toda essa riqueza com extração de madeira, mineração e outras atividades predata³rias, sem falar no desmatamento da floresta para pastar, reflete uma completa falta de visão para o presente e futuro. Os recursos disponí­veis devem ser usados ​​com moderação e inteligaªncia. O conhecimento necessa¡rio para que isso seja feito já existe. "

 

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