A mudança na composia§a£o genanãtica de uma espanãcie ao longo do tempo éuma forma de definir a evolua§a£o. Assim como outros seres vivos, o varus evolui.

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O material genanãtico do coronavarus que hoje circula pelo mundo causando a covid tem várias diferenças em relação a quele que começou a se espalhar no final de 2019. Essa transformação resulta de mutações, que são erros que ocorrem quando o material genanãtico écopiado. Algumas das mutações que surgiram se tornaram comuns. As linhagens do coronavarus, como a P.1, que se torna cada vez mais comum no Brasil, são definidas pela combinação de mutações que acumularam. A mudança na composição genanãtica de uma espanãcie ao longo do tempo éuma forma de definir a evolução. Assim como outros seres vivos, o varus evolui.
Ha¡ dois principais processos que explicam por que uma mutação no varus pode se tornar comum, com o passar do tempo. Um deles éo acaso. Se uma mutação não altera de modo importante o funcionamento do varus, ela pode tornar-se comum ou sumir por mero acaso, num processo chamado de deriva genanãtica. Por outro lado, hámutações que se tornam comuns pois trazem alguma vantagem. a‰ o caso da mutação D614G, presente numa linhagem do coronavarus chamada B.1, e que altera um aminoa¡cido da proteana que o varus usa para entrar em células humanas, tornando-o mais infeccioso. Nesse caso, estamos diante de uma mudança que resulta da ação da seleção natural.
Varus em geral, e com o coronavarus não édiferente, sofrem seleção natural constantemente. A seleção explica o aumento de frequência de mutações que os tornam capazes de resistir a drogas antivirais, de resistir a anticorpos gerados pela imunidade natural e a imunidade induzida pela vacina, ou de apresentar maior potencial de infecção. Os varus evoluem, e a evolução por seleção natural torna-os capazes de burlar nossas defesas. Ainda não sabemos quais das novas variantes foram selecionadas, mas háindacios de que algumas delas aumentem a transmissão e algumas reduzam a eficácia dos anticorpos geradas pela exposição a s formas mais antigas do varus.
Antivirais e vacinas exercem uma pressão seletiva sobre os varus, favorecendo a disseminação de formas resistentes. Pode então parecer que hálgo indesejável no uso de antivirais e vacinas, pois eles são agentes de mudança evolutiva indesejável. Mas analisando com atenção como antivirais e vacinas podem mitigar epidemias, e pensando sobre a forma ideal de usa¡-los, vemos que o risco de selecionarmos formas resistentes éalgo que pode ser minimizado, como explico agora.
As mutações acontecem quando o material genanãtico do varus écopiado. O varus não écapaz de ativamente “escolher†uma mutação que lhe seja vantajosa; dentre as milhares que ocorrem, ocasionalmente havera¡ aquelas que lhe conferem uma vantagem. O surgimento de uma mutação vantajosa anã, portanto, como “ganhar na loteriaâ€, um evento muito improva¡vel. Poranãm, considere o que acontece quando o varus se disseminou extensamente numa população, havendo muitas pessoas infectadas e altas taxas de transmissão. Nesse caso, havera¡ um número grande de varus tendo seu material genanãtico copiado: são milhares de bilhetes lotanãricos sendo vendidos, o que aumenta a chance de que entre eles surgira¡ uma variante que confere vantagem ao varus.
Repare então que entramos num ciclo perigoso: a maior proliferação do varus implica o surgimento de mais mutações, o que por sua vez aumenta as chances de que entre elas havera¡ uma variante que torna o varus mais infeccioso, ou mais resistente a tratamentos (digamos, por antivirais) ou a prevenção (por exemplo, usando vacinas). Controlar a disseminação do varus ospor isolamento fasico, pela vacinação extensa e rápida— ira¡ reduzir o número de ca³pias de varus circulando, encurralando o varus, no sentido de diminuir seus números a ponto de tornar mais improva¡vel que sejam originadas, por mutação, formas resistentes. Aluz desse raciocanio, não ésurpreendente que algumas das variantes que mais nos preocupam tenham se originado empaíses com grandes números de pessoas infectadas (Espanha, Reino Unido, áfrica do Sul, Brasil).
O ambiente ao qual o varus estãosubmetido émoldado por ações humanas. Quando criamos condições para o varus proliferar (pela ausaªncia de medidas de distanciamento, pela falta de tratamento médico, pela baixa vacinação), estamos favorecendo o surgimento de novas linhagens. Pior ainda, se essas linhagens surgem num ambiente em que háuma fração pequena da população vacinada, a exposição dessas variantes a s vacinas cria uma condição em que pode haver seleção favorecendo a disseminação de linhagens resistentes. Dessa forma, um processo de vacinação lento tem o potencial de favorecer o surgimento de linhagens resistentes: a baixa vacinação não diminui a população viral, permitindo que surjam mutantes, e expaµe as novas mutantes a seleção pelos indivíduos vacinados. Uma vacinação rápida e em massa diminuiria os riscos de surgimento de formas resistentes.
Outro cena¡rio preocupante éo da infecção de pessoas imunocomprometidas com o coronavarus. Nelas, o varus persiste por muito tempo, e na ausaªncia de defesas eficazes sua proliferação pode ser extensa, gerando muitas novas variantes. Um estudo recente mostrou que, num homem com uma história de imunossupressão, o varus gerou linhagens resistentes aos anticorpos com os quais ele vinha sendo tratado. Nesse caso, a evolução do varus ocorreu dentro de uma pessoa. Proteger pessoas imunocomprometidas seria, portanto, uma forma de proteger não são a sua saúde delas, mas também uma forma de reduzir as chances de surgirem linhagens com adaptações a drogas ou vacinas.
Varus evoluem. Para enfrenta¡-los, precisamos evitar que encontrem condições favoráveis para que surjam linhagens novas e perigosas, e que elas proliferem. Em termos práticos, sabemos o que fazer: tomar atitudes para diminuir a quantidade de varus circulando, realizar a vacinação de modo a¡gil e em massa, e monitorar o surgimento de novas linhagens, para sabermos como o varus estãoevoluindo. Essas são nossas estratanãgias. O varus, de seu lado, conta com a evolução. E com a evolução não se brinca.
As opiniaµes expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do(s) autor(es), não refletindo necessariamente a posição institucional do maisconhecer.com
Diogo Meyer
Professor do Instituto de Biociências da USP