Saúde

Diretrizes cla­nicas priorizam uso de psicoterapia para tratar depressão
Medicamentos são recomendados apenas para casos graves; metade das diretrizes mais relevantes não aborda risco de suica­dio
Por Júlio Bernardes - 22/06/2020


Maioria das diretrizes cla­nicas para o tratamento da depressão indica o uso de
psicoterapia como primeira opção, são recomendando o uso de medicação em
depressaµes moderadas e graves; diretrizes auxiliam profissionais de saúde nas
decisaµes sobre o cuidado apropriado osImagem: Peggy und
Marco Lachmann-Anke osPixabay

As diretrizes cla­nicas para o uso de medicamentos no tratamento da depressão são analisadas em pesquisa da Faculdade de Ciências Farmacaªuticas (FCF) da USP. O estudo mostra que a maioria das diretrizes indica a psicoterapia como primeira opção, são recomendando o uso de medicação em depressaµes moderadas e graves. A pesquisa revela que apesar da depressão ser considerada o principal fator para o risco de suica­dio, e este estar presente nas primeiras semanas de tratamento com antidepressivos, somente 50% das diretrizes cla­nicas mais relevantes abordam a questãodiretamente, o que aponta uma lacuna em sua estratanãgia de implementação.

A pesquisa traz uma revisão das diretrizes para o tratamento farmacola³gico da depressão, produzidas por diversas instituições de saúde em todo o mundo, e que podem ser adaptadas para o contexto de cadapaís por instituições locais, seguindo critanãrios internacionais de validação. No Brasil, também existem as diretrizes da Associação Manãdica Brasileira (AMB).

“A pesquisa comparou as recomendações de diretrizes cla­nicas mais relevantes para o tratamento farmacola³gico da depressão, elaborando recomendações que possam facilitar processos locais de adaptação”, afirma a pesquisadora Franciele Cordeiro Gabriel, que realizou o estudo. “As diretrizes cla­nicas, quando são bem elaboradas, ou seja, desenvolvidas com transparaªncia e de forma sistema¡tica, auxiliam os profissionais da saúde nas decisaµes sobre o cuidado apropriado, com base nas melhores evidaªncias para questões cla­nicas especa­ficas.”


Variações entre diretrizes cla­nicas são motivadas por variações culturais entrepaíses,
estrutura dispona­vel para atenção da saúde, valores das instituições responsa¡veis
pelas diretrizes e custo das intervenções osImagem: Gerd Altmann osPixabay

Segundo Franciele, a maioria das diretrizes cla­nicas recomenda a psicoterapia como primeira opção, são então recomendando o uso de medicamentos para depressaµes moderadas e graves. “Como opção de primeira linha de tratamento farmacola³gico, as diretrizes cla­nicas recomendam os inibidores seletivos de recaptação de serotonina (ISRS)”, ressalta. “A decisão de apoiar determinada recomendação pela diretriz cla­nica pode variar de acordo com o contexto de saúde em que o paciente estãoinserido.”

A formulação das recomendações, bem como parte das variações entre diretrizes cla­nicas, éexplicada por uma sanãrie de fatores, aponta a pesquisadora. “As diferenças são motivadas por variações culturais entrepaíses, estrutura dispona­vel para atenção a  saúde, valores das instituições ou organizações responsa¡veis pela elaboração das diretrizes cla­nicas e valores dos pacientes, bem como o custo das intervenções”, enumera.

Tratamento

A maioria das diretrizes cla­nicas para depressão concorda com a indicação de psicoterapia em conjunto com fa¡rmacos antidepressivos para tratamento da depressão grave, tendo a indicação de fa¡rmacos ISRS como opção de primeira linha de tratamento. “Já o uso de antipsica³ticos como estratanãgia de potencialização éindicado apenas para pacientes que não respondam a intervenções farmacola³gicas iniciais”, observa Franciele. “Tambanãm éimportante frisar que muitos pacientes tem falha terapaªutica e podem precisar substituir o antidepressivo, considerando-se outras classes farmacola³gicas”, acrescenta a pesquisadora.

De acordo com a pesquisadora, antidepressivos tem o potencial de causar reações adversas e isso deve ser discutido com o paciente para nortear a tomada de decisão compartilhada. “Um aspecto que chamou muito a atenção na pesquisa éque, apesar de a depressão ser considerada o principal fator de risco de suica­dio, e este estar presente nas primeiras semanas de tratamento com antidepressivos, apenas 50% das diretrizes cla­nicas mais relevantes abordaram essa questãode forma direta”, destaca.

O estudo édescrito em dissertação de mestrado orientada pela professora Eliane Ribeiro, do Programa de Pa³s-Graduação em Ciências Farmacaªuticas da FCF, com bolsa da Coordenação de Aperfeia§oamento de Pessoal de Na­vel Superior (Capes). O trabalho faz parte da linha de pesquisa do grupo CHRONIDE, formado por professores e alunos da USP, Universidade Federal de Sa£o Paulo (Unifesp) e Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA). “Desde 2015, o grupo desenvolve a análise da qualidade e transparaªncia de diretrizes cla­nicas, e também das recomendações das diretrizes de melhor qualidade para o tratamento de doenças crônicas não transmissa­veis [DCNT] na atenção prima¡ria”, aponta Franciele.

“O trabalho do grupo pretende facilitar o processo de adaptação local de diretrizes cla­nicas, de modo que o cuidado do SUS possa ser realizado com base nas melhores evidaªncias cienta­ficas dispona­veis”, ressalta a pesquisadora. Tambanãm participaram do estudo a professora Daniela Oliveira de Melo, da Unifesp, e os pa³s-graduandos Natha¡lia Celini Leite, da FCF, e Rafael Augusto Mantovani Silva, da Unifesp. A discussão das recomendações das diretrizes cla­nicas teve a colaboração do professor Renanãrio Fraguas, da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP), com linha de pesquisa em depressão.

 

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