Talento

Tese investiga livros não ficcionais para criana§as
Pesquisador da FaE se debrua§ou sobre obras que lana§am ma£o de elementos da literatura e das artes visuais
Por Itamar Rigueira Jr - 03/03/2020

No livro Plume, publicado em 2012, a escritora e ilustradora francesa Isabelle Simler oferece breve compaªndio de aves, desde as mais comuns, como a galinha e o pato, atéoutras menos conhecidas, como o a­bis e o martim-pescador. Destinado ao paºblico infantil, o volume fornece informações sobre os bichos osnesse sentido, énatural pensar que se trata de um livro restrito a  divulgação cienta­fica. Mas a autora introduz ao menos um elemento que incita a  imaginação: em cada pa¡gina, aparece um pedaço do corpo de um gato, de nome Plume (pena, em francaªs).

A obra de Isabelle Simler éexemplo claro de um produto ha­brido, que introduz elementos ficcionais na não ficção, e um dos 30 livros, brasileiros e estrangeiros, analisados na pesquisa de doutorado do biblioteca¡rio Marcus Vina­cius Rodrigues Martins, defendida em fevereiro deste ano no Programa de Pa³s-graduação em Educação da UFMG.

“Investiguei obras que apresentam a ideia de complementaridade, nas quais se encontra a ficção dentro da não ficção. Elas trabalham a informação e, ao mesmo tempo, a delicadeza e a imaginação”, comenta Marcus Vina­cius. Segundo ele, os livros não ficcionais superam a perspectiva do conteaºdo dida¡tico e escolarizante, oferecendo maneiras diferentes de as criana§as ampliarem seu repertório em Espaços como a casa, um museu, um parque ou uma biblioteca fora da escola.

Acervo da pesquisa
Pa¡gina de Plume: presença do gato estimula a imaginação

“Esses livros tem em comum um escape poanãtico, eles fazem a informação dialogar com a literatura e as artes visuais. Além disso, convocam a  participação do pequeno leitor, que interage com a obra. Faz-se uma aliana§a da voz da criana§a com a do adulto especialista. Em um dos volumes que estudei, o autor sugere que o leitor fotografe nuvens, antes de abordar o assunto do ponto de vista cienta­fico”, explica o pesquisador.

Paªndulo ampliado

De acordo com Marcus Vina­cius Martins, os estudos sobre obras não ficcionais para a infa¢ncia são incipientes, mesmo empaíses com tradição de pesquisa sobre livros infantis. A base bibliogra¡fica para seu trabalho incluiu produção tea³rica em portuguaªs, francaªs, espanhol e inglês. “Encontrei, com muita frequência, nesse material, uma separação bem marcada entre ficção e não ficção, o que parece explicar a falta de construções tea³ricas sedimentadas”, diz o biblioteca¡rio.

Marcus explorou a metodologia de expansão na arquitetura de sua análise. Com isso, ele logrou “ampliar o paªndulo entre ficcionalidade e não ficcionalidade para pensar a obra ha­brida e dar visibilidade ao uso de dispositivos ficcionais, como forma de quebrar a racionalidade cienta­fica tão presente na não ficcionalidade”, segundo trecho da tese.

O autor ressalta que, nas escolas, o interesse émaior pelos livros de ficção, e as obras não ficcionais são tratadas apenas como suporte dida¡tico para conteaºdos disciplinares. Ele considera que esses livros tem potencial mais amplo, de “abrir um tema e apresentar o mundo” ao paºblico infantil. Na tese, Marcus recorre a ideias da tea³rica canadense Nikola Von Merveldt para esclarecer a interação entre imagem e palavra. “Muitos livros não ficcionais equiparam o texto visual e o verbal na construção da informação. Assim, não hásobreposição de discursos para informar o leitor. Ademais, elementos como a fuga de convenções referentes a  divulgação cienta­fica e a multiplicidade de vozes dialogam para atingir um constructo verbal e visual coerente”, escreve o agora doutor em educação, que foi orientado pela professora Canãlia Abicalil Belmiro.

Um dos aspectos a que Marcus Vina­cius Martins pretende se dedicar éo da mediação. Segundo ele, épreciso discutir como conduzir rodas de leitura com base nas obras ha­bridas e apresentar esse gaªnero a mediadores em potencial, como professores, pedagogos e biblioteca¡rios. O pesquisador sugere ainda alguns temas para futuros estudos, como a presença de recursos como gra¡ficos, infogra¡ficos e mapas conceituais nas obras não ficcionais, novos direcionamentos para a divulgação de ciaªncia, o interca¢mbio da educação arta­stica com a cienta­fica e a estanãtica da não ficção.

 

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