Tecnologia Científica

Bia³logo descobre “matéria escura” das bactanãrias que vivem em resíduos ta³xicos de mineração
Descoberta de novas espanãcies e estudo da interaça£o com outras bactanãrias podera¡ facilitar descontaminação de minas de cobre. O trabalho identificou duas novas espanãcies de bactanãrias do grupo Saccharimonadia, cujo genoma étão pequeno que el
Por Júlio Bernardes - 27/09/2019

Foto: Leandro Nascimento Lemos
Mineração de cobre potencializa drenagem a¡cida de mina, solução aquosa formada a partir da oxidação de minerais sulfetados, como a calcopirita, com altos teores de metais pesados e acidez, que pode contaminar a¡guas subterra¢neas e solo.

Nos resíduos de mineração de cobre, conhecidos como drenagem a¡cida, vivem bactanãrias que ainda não são cultivadas em laboratório e por isso são pouco estudadas, embora possam ser essenciais em processos de descontaminação dos resíduos. Para encontrar essas bactanãrias, conhecidas como “matéria escura microbiana”, uma pesquisa com participação do Centro de Energia Nuclear na Agricultura (Cena) da USP, em Piracicaba, reconstruiu seu genoma a partir do sequenciamento genanãtico de todas as espanãcies de micro-organismos em amostras da drenagem a¡cida de uma mina no Para¡. O trabalho identificou duas novas espanãcies de bactanãrias do grupo Saccharimonadia, cujo genoma étão pequeno que elas precisam associar-se a outras bactanãrias para sobreviver. Essa interação podera¡ levar a aplicação das espanãcies em conjuntos de micro-organismos usados para remediar a contaminação.

“Apesar dos benefa­cios econa´micos oriundos da mineração, esta atividade potencializa a produção de drenagem a¡cida de mina, que écaracterizada por uma solução aquosa formada a partir da oxidação de minerais sulfetados, como por exemplo a calcopirita”, explica o bia³logo Leandro Nascimento Lemos, que integrou o grupo de pesquisa. “Este material éconstitua­do por altos teores de metais pesados e pH a¡cido, extremamente baixo, que pode contaminar o solo e o lena§ol frea¡tico, ou seja, cursos de águasubterra¢neos.”

De acordo com o bia³logo, uma importante alternativa para controle da drenagem a¡cida de mina éa biorremediação. “A biorremediação éum processo que utiliza microrganismos, especialmente do pra³prio ambiente, que podem auxiliar na neutralização da acidez (pH)”, descreve. “Um grupo muito usado para esse fim são as bactanãrias redutoras de sulfato.”

O pesquisador destaca que as interações entre os membros das comunidades microbianas presentes na drenagem a¡cida são fundamentais para o desempenho da biorremediação. “O objetivo da pesquisa foi investigar o metabolismo de duas novas espanãcies do grupo Saccharimonadia e suas interações ecola³gicas com outras bactanãrias que estãopresentes em drenagem a¡cida de mina”, aponta. “O grande desafio foi reconstruir o genoma destes micro-organismos, tendo em vista que entre 85% e 99% deles ainda não são cultiva¡veis em laboratório, devido a dificuldade de simular as condições do ambiente em que vivem.”

Matanãria Escura Microbiana

A dificuldade de cultivo das bactanãrias estudadas no trabalho faz com que sejam consideradas por especialistas em microbiologia como “microbial dark matter”, isto anã, “matéria escura microbiana”. “A localização e identificação foi a partir do uso de abordagens avana§adas de metagena´mica (estudo de material genanãtico recuperado diretamente de amostras ambientais) e bioinforma¡tica”, relata Nascimento Lemos. “Inicialmente foram coletadas amostras de drenagem a¡cida da Mina do Sossego, em Canaa£ dos Carajás, no Para¡. “Por meio de técnicas de biologia molecular, baseadas na extração e sequenciamento massivo do DNA gena´mico de todas as espanãcies microbianas que estãonas amostras, foi possí­vel obter uma enorme quantidade de dados.”

Por se tratar de micro-organismos que ainda não foram cultivados, os genomas dessas novas espanãcies foram reconstrua­dos a partir de fragmentos presentes em uma comunidade microbiana de alta complexidade. “Este processo éana¡logo a  montagem de um quebra-cabea§a”, conta o bia³logo, “onde as pea§as individuais, que representam fragmentos de genomas de todas as espanãcies que estãona comunidade microbiana, são agrupadas com base em caracteri­sticas comuns.”

Investigando o genoma das bactanãrias, os pesquisadores descobriram que elas não apresentam genes associados a biossa­ntese de aminoa¡cidos, nucleota­deos, a¡cidos graxos e cofatores, que são moléculas fundamentais para a sobrevivaªncia de bactanãrias de vida livre. “Além disso, por apresentarem um genoma muito pequeno, menor que 1 Megabase (Mbp), quando uma bactanãria de solo, por exemplo, tem em média um genoma de 4.5 Mbp, foi levantada a hipa³tese de que elas poderiam estar vivendo em simbiose com outras bactanãrias”, ressalta o pesquisador.

Usando manãtodos computacionais baseados na Teoria de Redes Complexas, a pesquisa encontrou evidaªncias de co-ocorraªncia e dependaªncia metaba³lica com outras bactanãrias, tais como as do gaªnero Hydrotalea. “Por elas co-ocorrem com outras bactanãrias que são potenciais para o processo de biorremediação, mas que ainda não foram cultivadas, no futuro elas poderiam ser aplicadas em consãorcios microbianos para descontaminação de solos”, conclui Nascimento Lemos. O trabalho édescrito no artigo Genomic signatures and co‐occurrence patterns of the ultra‐small Saccharimonadia (phylum CPR/Patescibacteria) suggest a symbiotic lifestyle, publicado na revista Molecular Ecology em 25 de agosto.

A pesquisa foi realizada por um grupo multidisciplinar, coordenado pelo professor que Victor Pylro, da Universidade Federal de Lavras (UFLA), em Minas Gerais. A reconstituição do genoma das bactanãrias foi feita na Plataforma de Bioinforma¡tica do Instituto RenéRachou, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) de Minas Gerais. Tambanãm integraram o grupo de pesquisa Julliane Medeiros, da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Francisco Dini-Andreote, da The Pennsylvania State University (Estados Unidos), Gabriel Fernandes, da Fiocruz Minas, Alessandro Varani, da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e Guilherme Oliveira, do Instituto Tecnola³gico Vale, em Belanãm (Para¡).

 

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