Tecnologia Científica

Conhecimento da estrutura da enzima Ohr abre caminhos para desenvolvimento de fa¡rmacos
A enzima Ohr (Organic Hydroperoxide Resistance Protein) écapaz de proteger as bactanãrias de oxidaa§aµes e lesões. A descoberta de seu funcionamento podera¡ proporcionar o desenvolvimento de novas formulaa§aµes para medicamentos
Por Antonio Carlos Quinto - 27/07/2020


Descobrir todos os mecanismos de funcionamento da enzima Ohr pode levar os cientistas a encontrarem o ‘calcanhar-de-aquiles’ das bactanãrias osFoto: Marcos Santos/USP Imagens
 
Cientistas do Centro de Pesquisa em Processos Redox em Biomedicina osRedoxoma e do Instituto de Biociências (IB) da USP estão“trilhando” um caminho que podera¡ levar ao desenvolvimento de novos medicamentos. Em um artigo recentemente publicado na revista ACS Catalysis, eles demonstraram como a enzima Ohr (Organic Hydroperoxide Resistance Protein) écapaz de proteger organismos unicelulares, como as bactanãrias, de oxidações e lesões. “Esta enzima faz com que uma bactanãria desenvolva resistência contra hidropera³xidos orga¢nicos, que oxidam sua estrutura. A oxidação éo processo que leva a  perda de elanãtrons por uma molanãcula (como DNA, por exemplo), alterando sua estrutura e muitas vezes levando a  perda de função. Assim, antioxidante éo composto que protege as células contra a ação de oxidantes. Se descobrirmos todo o seu funcionamento, poderemos atingir um ‘calcanhar-de-aquiles’ das bactanãrias”, observa o professor Luis Netto, do IB.

Netto conta que nesta pesquisa os cientistas conseguiram descrever seis estruturas cristalogra¡ficas da protea­na Ohr e analisaram asmudanças estruturais durante o seu ciclo catala­tico. Esse trabalho foi realizado no doutorado de Renato Mateus Domingos, que foi orientado por Netto, e éo primeiro autor do artigo Substrate and product-assisted catalysis: molecular aspects behind structural switches along Organic Hydroperoxide Resistance Protein catalytic cycle. “A descrição das estruturas da Ohr écomo termos a fechadura. O que nos falta agora éa chave para abrirmos essa porta”, descreve o professor. Quando ele se refere a  chave, nada mais édo que localizar moléculas capazes de inibir a Ohr e com isso fragilizar a bactanãria.

Netto destaca ainda que, como não existem enzimas semelhantes a  Ohr em mama­feros ou plantas, ela se torna um alvo atraente para o desenvolvimento de medicamentos. “A identificação de inibidores desta enzima também seria importante para a agricultura, na medida em que a protea­na Ohr já foi encontrada em patógenos osbactanãrias e fungos osque atacam plantas”, explica o pesquisador.

Papel central da Ohr

As relações entre patógenos e hospedeiros são complexas e foram moduladas durante o processo evolutivo. Quando são invadidos por microrganismos patogênicos (bactanãrias), plantas e animais disparam uma resposta do tipo inflamata³ria, com geração de oxidantes, dentre os quais os hidropera³xidos derivados de a¡cidos graxos. As bactanãrias, por sua vez, “contra-atacam” com um arsenal de enzimas, dentre elas a Ohr, para decompor esses oxidantes. Nessa resposta, como descreve Netto, a Ohr éuma das enzimas que desempenham um papel central. Por isso, a enzima tem sido associada a  virulência de várias bactanãrias, como Pseudomonas aeruginosa (que provoca pneumonia), Chromobacterium violaceum (pata³geno oportunista que pode causar abcessos no fa­gado, pulma£o e pele, bem como septicemias graves em humanos) e Bacillus cereus (bactanãria patogaªnica nota³ria de origem alimentar que pode produzir diarreia).

Superbactanãrias, ou microrganismos resistentes a maºltiplas drogas (MDR, multi-drug resistant microorganisms), são uma ameaça mundial a  saúde pública. A Organização Mundial da Saúde (OMS) vem alertando que podemos estar caminhando para uma era pa³s-antibia³tico, na qual infecções comuns e ferimentos leves podem voltar a matar. Por isso, a identificação de novos alvos para o desenvolvimento de tratamentos antimicrobianos éde urgência global.

Descrição do modelo

A descrição das estruturas da Ohr incluiu também a estrutura do complexo entre a enzima e seu substrato biola³gico, a dihidrolipoamida (DHL). “Usamos diversas abordagens, como cristalografia, dina¢mica molecular computadorizada e cinanãtica para descrever o nosso modelo, com foco na fase da redução no ciclo catala­tico da Ohr, que era a menos conhecida. A estrutura do complexo da enzima com seu substrato redutor serviu de base para as modelagens de simulação tea³rica. Conhecendo o mecanismo enzima¡tico émais fa¡cil osou menos difa­cil osdesenhar inibidores para a Ohr”, descreve Netto.

Nos laboratórios do IB, os cientistas retiraram a enzima Ohr das bactanãrias Chromobacterium violaceum e Pseudomonas aeruginosa (que provoca pneumonia). Mais especificamente, “o trabalho consistiu na retirada do DNA das bactanãrias que codifica para essas enzimas”, descreve Netto.

As estruturas cristalogra¡ficas foram obtidas usando a estrutura de laboratórios que geram luz sa­ncrotron: o Sa­ncrotron da Universidade de Stanford osStanford Synchrotron Radiation Light source (SSRL) ose o Laborata³rio Nacional de Luz Sa­ncrotron (LNLS) em Campinas.

A validação dessas estruturas foi feita em colaboração com os pesquisadores Raphael D. Teixeira e Shaker Chuck Farah, do Instituto de Quí­mica (IQ) da USP, e Pla­nio S. Vieira e Mario Murakami, do Laborata³rio Nacional de Biociências (LNBio) do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM).

O artigo também traz a assinatura dos seguintes pesquisadores: Raphael D. Teixeira (IQ), Ari Zeida e William A. Agudelo (Universidad de Buenos Aires, Argentina), Thiago G.P. Alegria (IB), JoséF. da Silva Neto (Faculdade de Medicina de Ribeira£o Preto da USP), Pla­nio S. Vieira e Mario T. Murakami (LNBio), Shaker Chuck Farah (IQ), Dario A. Estrin (Universidad de Buenos Aires, Argentina) e Luis E.S. Netto (IB).

 

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