Tecnologia Científica

Artigo revela que população brasileira possui variações genanãticas inanãditas em bancos de dados globais
Ana¡lise foi feita por pesquisadores do Cepid Brainn e publicada na NPJ Genomic Medicine, peria³dico do grupo Nature
Por Divulgação CEPID-BRAINN - 22/10/2020


Reprodução

Pesquisadores do Cepid Brainn publicaram este maªs um estudo na NPJ Genomic Medicine, peria³dico cienta­fico do grupo Nature, que demonstra a importa¢ncia da obtenção e do compartilhamento de dados genanãticos da população brasileira. O artigo The Brazilian Initiative on Precision Medicine (BIPMed): fostering genomic data-sharing of underrepresented populations analisou dois bancos de dados gena´micos contendo informações de 358 indivíduos brasileiros. No total, foram identificadas mais de 800 mil variações que não estavam presentes em alguns dos maiores reposita³rios de dados genanãticos do mundo.

O trabalho destaca a importa¢ncia da realização de estudos gena´micos populacionais nopaís, seja para a implementação da medicina de precisão, seja para o avanço da compreensão das variações genanãticas e sua correlação com a predisposição a doena§as. O estudo também reforça a importa¢ncia do compartilhamento desses dados com a comunidade cienta­fica global.

O artigo publicado traz os resultados dos trabalhos do BIPMed, uma iniciativa de cinco grupos de pesquisa nacionais com o objetivo de facilitar a implementação da medicina de precisão no Brasil. O BIPMed, apoiado pela FAPESP, teve ini­cio em 2015, quando possua­a em seu reposita³rio dados genanãticos de 29 indiva­duos. Atualmente, o grupo já possui informações de mais de 890 indiva­duos, sendo o responsável por 03 dos 06 maiores bancos de dados genanãticos na plataforma Leiden Open Variation Database, um dos principais reposita³rios de informações desse tipo do mundo.

Os brasileiros, que correspondem a quase 3% da população do mundo, ainda são subrepresentados em bancos de dados genanãticos globais. Apesar de ser umpaís em que pesquisas com coletas de amostras genanãticas ocorram com frequência, o compartilhamento desses dados com a comunidade cienta­fica ainda éincipiente nopaís. Os resultados do estudo revelam a enorme importa¢ncia de se ter conhecimento especa­fico sobre as caracteri­sticas genanãticas das populações locais, integradas a grandes bancos de dados globais.

Em termos tecnola³gicos, este não éum desafio. O pra³prio BIPMed possui uma plataforma na qual grupos de pesquisa podem se cadastrar e enviar os dados de seus estudos genanãticos. Todos os parametros de confidencialidade dos dados e na­veis de acesso são cadastrados na plataforma e formalizados em um contrato, garantindo o bom uso das informações. Além disso, a própria equipe do BIPMed auxilia na padronização dos envios para incorporação aos bancos de dados.

“Atéhoje, não recusamos nenhum envio, e todos foram incorporados com sucesso a  plataforma”, conta Iscia Lopes Cendes, pesquisadora do Laborata³rio de Genanãtica Molecular da Faculdade de Ciências Manãdicas (FCM) da Unicamp, membro do Cepid Brainn e uma das autoras do estudo publicado. 

a‰ SEGURO COMPARTILHAR INFORMAa‡a•ES GENa‰TICAS?

Os conceitos de ‘DNA’, ‘genanãtica’ e ‘gena´mica’ são amplamente desconhecidos do grande paºblico em todo o mundo, inclusive empaíses com excelente educação pública, como o Japa£o

Talvez a questãoda privacidade dos dados seja a mais polaªmica quando o assunto éo uso compartilhado de informações genanãticas. Muitos pesquisadores e grupos de pesquisa, mesmo cientes dos benefa­cios que o compartilhamento de dados pode trazer a  sociedade, ainda se opaµe a partilhar informações. E o paºblico no geral parece concordar: estudo publicado também este maªs no The American Journal of Human Genetics [3], do grupo Cell, entrevistou mais de 36 mil pessoas, em 22países, e descobriu que a maioria delas preferiria não fornecer seus dados genanãticos para pesquisas cienta­ficas, além de não confiar no processo de compartilhamento desses dados entre grupos diferentes (médicos, pesquisadores, empresas etc). Nãosurpreende notar que, ainda segundo o artigo, os conceitos de ‘DNA’, ‘genanãtica’ e ‘gena´mica’ são amplamente desconhecidos do grande paºblico em todo o mundo.

Para pessoas de fora da área acadaªmica, há impressão de que o DNA traz informações médicas “especiais”, que exigiriam proteção também especial. Ainda segundo a pesquisa, dentre as pessoas familiarizadas com os conceitos de genanãtica, gena´mica e DNA, a vontade de compartilhar essas informações émaior. Missão, portanto, para a comunidade cienta­fica global: aumentar onívelde confianção do paºblico sobre o uso desses dados e sobre como a privacidade dos indivíduos pode ser protegida, de maneira ao mesmo tempo segura e que não impea§a os estudos cienta­ficos.

Atualmente, háinúmeros protocolos e maneiras de tornar os dados genanãticos ana´nimos, muitos deles sendo utilizados, inclusive, pela equipe do BIPMed e presentes no contrato de cessão de dados. Fato éque, com o devido conhecimento tanãcnico e tendo acesso a informações adicionais sobre doadores de material genanãtico, teoricamente ainda épossí­vel, em parte dos casos, correlacionar uma amostra genanãtica a um indiva­duo especa­fico; poranãm, este éum trabalho longe de ser trivial, e em termos práticos não deveria ser uma preocupação. Os benefa­cios do compartilhamento seguro e anonimizado de dados em muito suplantam os potenciais maus usos.

Em diversos locais do mundo, como nos Estados Unidos e na Unia£o Europeia, a divulgação pública e aberta dos dados éum requerimento que agaªncias de fomento, peria³dicos cienta­ficos e a própria sociedade já exigem para que um estudo genanãtico seja realizado. Aqui no Brasil, existe um movimento por parte das agaªncias de fomento neste mesmo sentido. Espera-se que, dentro de alguns anos, o compartilhamento de informações se popularize nopaís, tendo como alicerce uma compreensão aprofundada das maneiras como a privacidade dos participantes pode ser mantida e sobre como a propriedade desses dados possa também ser garantida.

“Nãoépor que os dados são paºblicos que podera£o ser utilizados de qualquer maneira, por qualquer grupo de pesquisa”, explica a dra. Iscia. “Já existem protocolos que garantem que os dados gerados em umpaís sejam devidamente identificados e tenham controle total nacional, o que éimportanta­ssimo para beneficiar as populações nativas e, ao mesmo tempo, permitir o avanço cienta­fico”.

BENEFaCIOS ADICIONAIS DO COMPARTILHAMENTO DE DADOS PARA O PAaS

Compartilhar dados também seráum passo fundamental para “internacionalizar” a Ciência brasileira osainda, em grande parte, avessa a colaborações internacionais. “A Ciência brasileira tem uma boa produção de artigos, de boa qualidade, mas com baixa citação e participação de colaboradores internacionais”, explica a pesquisadora. “A Argentina, por exemplo, que possui estrutura de pesquisa menor que a nossa, tem muito mais colaboração internacional. O compartilhamento de dados éum caminho essencial para se abrir estas novas frentes de desenvolvimento cienta­fico”.

 

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