O ano de 1969 éconsiderado o fim de uma era, mas cinquenta anos depois ainda estamos comprando um mito perigoso? O especialista em contracultura James Riley investiga a escurida£o dos anos sessenta para separar os fatos da fica§a£o psicodanãlica.
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Os anos sessenta são geralmente lembrados como uma era de liberdade, inovação e experiência visiona¡ria. Afinal, éo período que nos deu os Beatles, o Summer of Love, o movimento pelos direitos civis, o Festival de Woodstock e o Apollo 11 Moon-Landing. Dezenas de autobiografias, hagiografias e histórias culturais ajudaram a embelezar ainda mais esse status ica´nico, apresentando os anos sessenta como o cadinho do 'sonho' hippie, uma tentativa fracamente definida e liderada por jovens para estabelecer um mundo alternativo, harmonioso e pa³s-guerra. a‰ uma história gloriosa, mas que tende a terminar em traganãdia.
No "final dos anos sessenta", ou assim diz a história, o sonho hippie "morre". Foi interrompido na segunda metade de 1969, graças aos terraveis assassinatos cometidos por Charles Manson e 'a Famalia', as mortes atribuadas ao chamado 'Zodiac Killer' e a violência no show dos Rolling Stones no Altamont Speedway. Esses eventos parecem sustentar um espelho sombrio dos avanços sociais e culturais positivos dos anos anteriores.Â
"A década de 1960 foi repleta de violência, ansiedade e uma sensação de destruição iminente".
James Riley
Embora essa narrativa possa se adequar a matriz da cultura popular e da nostalgia que constitui os anos sessenta, ela tem pouca semelhança com a atualidade hista³rica da década de 1960. A década de fato deu inicio a uma onda de progressivismo e também teve seu lado sombrio, mas essa negatividade não se limitou aos seus dias finais. De qualquer forma, a escurida£o, por assim dizer, esteve presente desde o inicio e, nos anos 60, pairou particularmente perto da contracultura da década.
Assassinatos, tensaµes nucleares, conflitos globalizados, agitação civil, o crescimento de grupos religiosos apocalapticos: os anos 60 foram inundados com violência, ansiedade e uma sensação de destruição iminente. Uma década difacil e complicada, a década de 1960 deixou um legado social, cultural e econa´mico do qual ainda exerce uma poderosa influaªncia no mundo contempora¢neo.Â
Os anos sessenta, por outro lado, continuam a existir em uma bolha de lembrana§as reconfortantes, oferecendo regularmente mais um aniversa¡rio, exibição ou turnaª de reunia£o. Altamont e os assassinatos de Manson foram, éclaro, eventos muito reais, com um custo humano terravel, mas ambos se tornaram parte de uma narrativa de desastre que ajuda a sustentar esse excepcionalismo. O que mais podemos esperar de uma supernova de uma anãpoca como os anos sessenta do que uma cortina espetacular?
Imaginar o final desastroso do 'sonho' hippie e do projeto contracultural mais amplo anã, em última análise, uma ferramenta de celebração. Se ao menos Manson e a Famalia não tivessem aparecido, o trabalho aºnico dos anos sessenta continuaria e daria origem a um futuro bonito.
Para os que investiram na indústria da nostalgia do período, enquadrar os anos sessenta como uma espanãcie de Shangri-La cultural, um mundo perdido para o qual nos esforçamos para retornar écertamente melhor do que reconhecer a realidade dos pedestres de como os anos 1960 realmente terminaram. Esse éo verdadeiro horror: a lenta e inconseqa¼ente mudança de uma contracultura dina¢mica para a vida adulta, os subaºrbios e os empregos 'adequados' (a década de 1970, em outras palavras). Embora enganosa, essa visão do poder das flores que termina em uma cata¡strofe encharcada de sangue mantanãm seu domanio sobre a imaginação do paºblico. Caso em questão, o recente lana§amento do anãpico Era uma vez em Manson, de Quentin Tarantino, em Hollywood (2019).
O final da década de 1960 não marcou a 'morte' do 'sonho' hippie. Com a década de 1970, o ampeto contracultural apenas se recalibrou e fluiu em direções diferentes. Isso não impediu a cultura contemporâneade revisitar e repetir obsessivamente os eventos de 1969, como se eles sinalizassem algum tipo de tanãrmino, a ser totalmente compreendido.
Enquanto isso, o mundo do inicio do século XXI continua a mergulhar de cabea§a em seu pra³prio período profundamente perturbador da polatica pa³s-moderna, em soft power assustadoramente malanãvolo e em "notacias falsas" armadas. Quando vivemos em tempos tão interessantes, por que insistir nas ilusaµes e desilusaµes da década de 1960 e seu duplo?
Ha¡ cinquenta anos, protestos ocorreram em linhas de batalha razoavelmente bem definidas contra alvos claramente identifica¡veis. Agora, na esfera atual da realidade editada e das políticas que mudam o mais rápido que podem ser twittadas, édifacil identificar onde estãoa fonte de poder, quanto mais protestar contra ela. Para navegar nesse tipo de situação, éimportante entender a meca¢nica em jogo - como as representações são manipuladas e como as agendas são incorporadas em narrativas aparentemente ina³cuas. a‰ isso que a década de 1960 pode nos ensinar.
Ao interrogar e descompactar o elo entre a década e a era, as décadas de 1960 e 1960, podemos observar, no processo, as forças que transformam a história recente em mito moderno. Tambanãm éútil ficar chocado com o quanto as coisas mudaram. Se vocêestiver curioso, examine os detalhes do caso Manson e pense no que significou em 1969 "seguir" alguém . O que vocêencontra pode fazer vocêgastar um pouco menos de tempo no Twitter.Â