Carmita Abdo explica que se trata de uma relação acordada entre as partes, uma nova forma de aquisição de repertório sexual que cresceu com o advento da internet
O bondage se torna atrativo porque busca ampliar o prazer sexual do casal, amarrando, prendendo ou restringindo consensualmente o parceiro – Foto: macrovector
Bondage, ou BDSM, é uma prática sexual que consiste em disciplina, dominação, submissão, sadismo e masoquismo. O Brasil ocupa o sexto lugar entre os países que mais procuram parceiros que têm esse tipo de relação. O ranking, realizado a partir de um estudo feito por um aplicativo de relacionamentos fetichistas, KinD, mostrou que Estados Unidos e Canadá estão na liderança entre os países com mais usuários do aplicativo, seguidos por Alemanha, Austrália e Índia. Mas o que isso representa e por que há uma procura maior por esse tipo de relação? Como acontece essa relação? Carmita Abdo, psiquiatra, professora da Faculdade de Medicina da USP e coordenadora do Programa de Estudos em Sexualidade do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da USP, explica que essa é uma relação acordada entre as partes. “Esse crescimento representa uma nova forma de aquisição de repertório sexual através do conhecimento que a internet dissemina de práticas antes restritas a ambientes menos expostos. Tudo o que se vê uma, duas, três, várias vezes acaba sendo incorporado ao nosso cotidiano, é considerado natural.”
O bondage se torna atrativo porque busca ampliar o prazer sexual do casal, amarrando, prendendo ou restringindo consensualmente o parceiro. Segundo Carmita, “essa prática se torna atrativa, seja pela curiosidade que desperta no início ou pelo desafio que acaba representando ao longo do tempo, com mais e mais situações de dominação versus submissão sendo testadas por meio de algemas, lençóis, cordas ou outros instrumentos para amarração. Ao longo do tempo, a satisfação que causa, de parte a parte, vai fazendo com que ela se mantenha no relacionamento, porque um busca submeter, enquanto o outro deseja ser submetido para poder sentir um prazer mais intenso durante o ato sexual”.
Os riscos são calculados e o objetivo é que ninguém se machuque com um acordo definido de parte a parte. No entanto, no calor da emoção e do prazer pode haver descontrole. Não dá para garantir de forma absoluta que exageros não aconteçam, mesmo contra a vontade dos envolvidos e contra aquilo que foi previamente definido, bem diferente de um abuso sexual ou tortura.
Repertório sexual
O bondage ainda não faz parte do repertório sexual tradicional dos casais mais conservadores, independentemente do gênero, explica a professora. “A busca por esse tipo de prazer envolve homens e mulheres. Os homens costumam submeter, já as mulheres preferem ser submetidas, mais frequentemente. Mas há casos, e não são raros, de homens que sentem grande prazer na vulnerabilidade diante de parceiras poderosas.”
Apesar dessa prática ter se disseminado, especialmente após o advento da internet, com filmes de cunho erótico, mais facilmente acessados por maior número de pessoas, o bondage muitas vezes é usado como uma forma de apimentar a relação, de reavivar o interesse sexual que vai sendo desgastado pelo tempo e pela rotina. A especialista explica que uma tendência a esse tipo de exercício, “submeter e ser submetido”, é necessária para que o casal se decida pela prática. Muitos casais não se sentem ali representados e identificados, mas sair do usual e livrar-se do tédio de uma relação repetitiva, sem novos elementos, pode ser o gatilho para que o bondage seja incluído na vida sexual daqueles que já têm uma tendência, ainda que não revelada, a essa prática.