Humanidades

O caso da economia - pelos números
Um novo estudo examina 140.000 artigos de economia publicados de 1970 a 2015, registrando as citaa§aµes
Por Peter Dizikes - 03/03/2020


Um novo estudo examina 140.000 artigos de economia publicados de
1970 a 2015, registrando as citações "extramurais" que os artigos de economia
receberam em outras 16 áreas acadaªmicas, incluindo sociologia, medicina e
saúde pública. Crédito: Christine Daniloff, MIT

Nos últimos anos, foram feitas cra­ticas a  economia por serem insulares e despreocupadas com os problemas do mundo real. Mas um novo estudo liderado por estudiosos do MIT descobre que o campo se sobrepaµe cada vez mais ao trabalho de outras disciplinas e, em um desenvolvimento relacionado, tornou-se mais empa­rico e orientado por dados, enquanto produz menos trabalho de teoria pura.

O estudo examina 140.000 artigos de economia publicados em um período de 45 anos, de 1970 a 2015, registrando as citações "extramurais" que os artigos de economia receberam em 16 outros campos acadaªmicos - variando de outras ciências sociais, como sociologia, medicina e saúde pública. Em sete desses campos, a economia éa ciência social com maior probabilidade de ser citada, e estãovirtualmente ligada a  primeira em citações em outras duas disciplinas.

Nas revistas de psicologia, por exemplo, as citações de artigos de economia mais que dobraram desde 2000. Os artigos de saúde pública agora citam que a economia funciona duas vezes mais do que há10 anos, e as citações de pesquisas econa´micas em campos, da pesquisa operacional a  ciência da computação, aumentaram. bruscamente também.

Embora as citações de artigos de economia no campo das finana§as tenham aumentado um pouco nas últimas duas décadas, essa taxa de crescimento não émais alta do que em muitos outros campos, e a interação geral entre economia e finana§as não mudou muito. Isso sugere que a economia não tem sido incomumente orientada para questões financeiras - como alguns cra­ticos afirmaram desde o crash do setor banca¡rio de 2007-2008. E os autores do estudo afirmam que, a  medida que a economia se torna mais empa­rica, émenos dogma¡tica.

"Se vocême perguntar, a economia nunca foi melhor", diz Josh Angrist, economista do MIT que liderou o estudo. "Nunca foi tão útil. Nunca foi tão cienta­fico e mais baseado em evidaªncias".

De fato, a proporção de artigos de economia baseados em trabalhos empa­ricos - em oposição a  teoria ou metodologia - citados nos principais peria³dicos da área aumentou cerca de 20 pontos percentuais desde 1990.

O artigo, "Trabalho interno ou impacto profundo? Citações extramurais e a influaªncia da bolsa econa´mica", aparece na edição deste maªs do Journal of Economic Literature.

Os co-autores são Angrist, que éo professor de economia da Ford no Departamento de Economia do MIT; Pierre Azoulay, professor de administração de programas internacionais da MIT Sloan School of Management; Glenn Ellison, Professor de Economia Gregory K. Palm e chefe associado do Departamento de Economia; Ryan Hill, doutorando no Departamento de Economia do MIT; e Susan Feng Lu, professora associada de administração na Krannert School of Management da Purdue University.
 
Levando os cra­ticos a sanãrio

Como Angrist reconhece, um a­mpeto para o estudo foi a onda de cra­ticas que a profissão econa´mica enfrentou na última década, após a crise banca¡ria e a "Grande Recessão" de 2008-2009, que incluiu a queda do setor financeiro de 2008. O tí­tulo do artigo faz alusão ao filme "Inside Job" - cuja tese sustenta que, como Angrist diz, "a bolsa de economia como uma empresa acadaªmica foi capturada de alguma forma pelas finana§as, e, portanto, os economistas acadaªmicos devem ser responsabilizados pela Grande Recessão".

Para conduzir o estudo, os pesquisadores usaram o Web of Science, um banco de dados bibliogra¡fico abrangente, para examinar citações entre 1970 e 2015. Os pesquisadores desenvolveram técnicas de aprendizado de ma¡quina para classificar artigos de economia em subcampos (como macroeconomia ou organização industrial) e por pesquisa "estilo" - significando se os trabalhos estãopreocupados principalmente com a teoria econa´mica , análise empa­rica ou manãtodos economanãtricos.

"Na³s fizemos muitos ajustes finos nisso", diz Hill, observando que, para um estudo desse tamanho, uma abordagem de aprendizado de ma¡quina éuma necessidade.

O estudo também detalha a relação entre economia e quatro disciplinas adicionais de ciências sociais: antropologia, ciência pola­tica , psicologia e sociologia. Entre elas, a ciência pola­tica ultrapassou a sociologia como a disciplina mais envolvida com a economia. Os artigos de psicologia agora citam pesquisas econa´micas com a mesma frequência que citam obras de sociologia.

A nova conectividade intelectual entre economia e psicologia parece ser um produto do crescimento da economia comportamental, que examina a tomada de decisão financeira irracional e ma­ope dos indivíduos - um paradigma diferente das suposições sobre tomada de decisão racional encontradas na economia neocla¡ssica . Durante todo o período do estudo, um dos artigos de economia citados com mais frequência por outras disciplinas éo artigo cla¡ssico "Teoria da perspectiva: uma análise da decisão sob risco", dos economistas comportamentais Daniel Kahneman e Amos Tversky.

Além das ciências sociais, outras disciplinas acadaªmicas para as quais os pesquisadores estudaram a influaªncia da economia incluem quatro áreas cla¡ssicas de nega³cios - contabilidade, finana§as, gerenciamento e marketing -, além de ciência da computação, matemática, medicina, pesquisa operacional, física, saúde pública, e estata­sticas.

Os pesquisadores acreditam que essas citações "extramurais" da economia são um bom indicador do valor cienta­fico e da releva¢ncia da economia.

"A economia estãoobtendo mais citações de ciência da computação e sociologia, ciência pola­tica e psicologia, mas também vemos áreas como saúde pública e medicina comea§ando a citar artigos de economia", diz Angrist. "A parcela empa­rica da produção de publicações econa´micas estãocrescendo. Essa éuma mudança bastante acentuada. Mas ainda mais drama¡tica éa proporção de citações que fluem para o trabalho empa­rico".

Ellison enfatiza que, como outras disciplinas estãocitando economia empa­rica com mais frequência, isso mostra que o crescimento da pesquisa empa­rica em economia não éapenas uma mudança auto-reforçadora, na qual os estudiosos perseguem idanãias da moda. Em vez disso, ele observa, os economistas estãoproduzindo pesquisas empa­ricas amplamente aºteis.

"Os cientistas pola­ticos se sentiriam totalmente livres para ignorar o que os economistas escreviam se o que os economistas escreviam hoje não lhes interessasse", diz Ellison. "Mas tivemos uma grande mudança no que fazemos e outras disciplinas estãodemonstrando interesse".

Tambanãm pode ser que os manãtodos empa­ricos usados ​​na economia agora correspondam mais aos de outras disciplinas.

"A novidade éque a economia estãoproduzindo um trabalho empa­rico mais acessa­vel", diz Hill. "Nossos manãtodos estãose tornando mais semelhantes ... atravanãs de ensaios clínicos randomizados, experimentos de laboratório e outras abordagens experimentais".

Poranãm, como observam os estudiosos, háexceções ao padrãogeral em que um maior empirismo em economia corresponde a um maior interesse de outros campos. Os artigos de ciência da computação e pesquisa operacional, que citam cada vez mais a pesquisa de economistas, estãoprincipalmente interessados ​​no lado da teoria da economia. E a crescente sobreposição entre psicologia e economia envolve uma mistura de teoria e trabalho orientado a dados.

Em um grandepaís

Angrist diz que espera que o jornal ajude os jornalistas e o paºblico em geral a apreciar a variedade de pesquisas econa´micas.

"Falar sobre economia écomo falar sobre os Estados Unidos da Amanãrica", diz Angrist. "Os Estados Unidos são umpaís grande e diversificado e a bolsa de estudos em economia éuma empresa grande e diversificada, com muitos campos".

Ele acrescenta: "Acho a economia incrivelmente eclanãtica".

Ellison enfatiza esse ponto também, observando que a grande amplitude da disciplina oferece a  economia a capacidade de causar impacto em muitos outros campos.

"Realmente parece ser a diversidade da economia que faz bem em influenciar outros campos", diz Ellison. "Pesquisa operacional, ciência da computação e psicologia estãoprestando muita atenção a  teoria econa´mica. Socia³logos estãoprestando muita atenção a  economia do trabalho, marketing e administração estãoprestando atenção a  organização industrial, estata­sticos estãoprestando atenção a  econometria e ao paºblico as pessoas da saúde estãoprestando atenção a  economia da saúde. Praticamente tudo o que éecona´mico influencia em algum lugar ".

Por sua parte, Angrist observa que ele éum observador tendencioso: ele éum empirista dedicado e um dos principais profissionais de pesquisa que usa manãtodos quase experimentais. Seus estudos alavancam circunsta¢ncias nas quais, digamos, asmudanças nas políticas atribua­das aleatoriamente na vida ca­vica permitem que os pesquisadores estudem dois grupos de pessoas semelhantes, separados por uma coisa, como acesso a cuidados de saúde.

Angrist também foi orientador de pós-graduação da Esther Duflo Ph.D. '99, que ganhou o Praªmio Nobel de economia no outono passado, junto com Abhijit Banerjee do MIT - e Duflo agradeceram a Angrist em sua entrevista coletiva no Nobel, citando sua influaªncia metodola³gica em seu trabalho. Duflo e Banerjee, como co-fundadores do Laborata³rio de Ação contra a Pobreza Abdul Latif Jameel (J-PAL) do MIT, são defensores do uso de experimentos de campo em economia, que ainda éoutra maneira de produzir resultados empa­ricos com implicações políticas.

"Mais e mais do nosso trabalho empa­rico vale a pena prestar atenção, e as pessoas prestam cada vez mais atenção a ele", diz Angrist. "Ao mesmo tempo, os economistas são muito menos introspectivos do que costumavam ser".

 

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