Humanidades

Voltar ao passado? Ernesto Zedillo sobre o comanãrcio em um mundo pa³s-Trump
A pola­tica comercial dos EUA estãoem uma encruzilhada. Sera¡ que o presidente Biden rompera¡ totalmente com as políticas protecionistas de seu predecessor e adotara¡ o sistema comercial que os americanos ajudaram a criar no século passado?
Por Mike Cummings - 20/02/2021


Ernesto Zedillo, Ph.D.

A pola­tica comercial dos EUA estãoem uma encruzilhada. Sera¡ que o presidente Biden rompera¡ totalmente com as políticas protecionistas de seu predecessor e adotara¡ o sistema comercial que os americanos ajudaram a criar no século passado?

“ Comanãrcio no 21 st Century: Back to the Past?” (Brookings Institution Press), um novo volume coeditado por Ernesto Zedillo '81 Ph.D., Frederick Iseman '74 Diretor do Yale Center for Globalization, e economista Bernard Hoekman, examina as perspectivas de um retorno ao comanãrcio multilateral ordem em um mundo pa³s-Trump, bem como algumas das outras questões atuais relacionadas ao comanãrcio.

Zedillo, ex-presidente do Manãxico e professor da área de economia e pola­tica internacional em Yale, conversou recentemente conosco sobre o livro, os efeitos globais do protecionismo do governo Trump e por que ele acredita que o livre comanãrcio continua sendo o melhor caminho para o EUA e seus vizinhos norte-americanos. A entrevista foi editada e condensada.  

O que inspirou o livro?

O livro éum exerca­cio de brainstorming em torno dos principais desafios enfrentados pelo comanãrcio. Muitos capa­tulos tratam das políticas comerciais implementadas pela administração presidencial anterior. Com a recente mudança na Casa Branca, éum bom momento para considerar o futuro do comanãrcio internacional. Nosso trabalho apresenta várias idanãias sobre como restaurar, preservar e fortalecer o sistema de comanãrcio multilateral baseado em regras. Ele aborda problemas-chave, como a forma de lidar com a China, que éuma parte interessada importante e relativamente nova no sistema internacional.

Acreditamos que existem maneiras de atingir essas metas que produzira£o resultados ganha-ganha para todas as partes. Nãoafirmamos ter tudo certo, mas nossa esperana§a éque o livro fornea§a uma contribuição modesta para essa discussão.

Vocaª e seus autores contribuintes são cra­ticos das políticas comerciais da administração Trump. Qual éa base de sua cra­tica?

Nossa impressão geral éque o governo Trump não acreditava em um sistema baseado em regras e que seu objetivo era impor unilateralmente tudo o que quisesse em relação ao comanãrcio. E isso representava uma ameaça existencial a todo o sistema comercial que os Estados Unidos contribua­ram para o estabelecimento. O que torna a situação ainda mais interessante éque uma análise após a outra mostra que as políticas comerciais de Trump eram contra os pra³prios interesses dopaís.

Que medidas especa­ficas foram particularmente prejudiciais em sua opinia£o?

O primeiro exemplo concreto foi a retirada da Parceria Transpaca­fico, ou TPP, que, como afirmamos no livro, éprovavelmente o acordo comercial mais vantajoso que os Estados Unidos já negociaram. E, no entanto, logo após assumir o cargo, o presidente Trump retirou os Estados Unidos do acordo, provavelmente sem perguntar o que o acordo continha.

Outro exemplo éa renegociação do Nafta, que resultou em uma revisão do acordo que, a meu ver, diminui a competitividade global das economias norte-americanas.

E, claro, há guerra comercial de Trump com a China. Existem questões importantes com a China que dizem respeito a  pola­tica comercial, mas a abordagem agressiva do governo Trump não foi garantida pela análise ou pelo pensamento estratanãgico. E a prova estãono pudim. Quais são os resultados dessa estratanãgia? Ele atingiu zero. Agora, o novo governo tem uma situação distorcida e complicada para resolver em termos de comanãrcio com a China.

Como o acordo renegociado do NAFTA enfraqueceu a competitividade global da Amanãrica do Norte?

Existem vários exemplos, mas um drama¡tico envolveu a mudança das regras de origem para a indústria automotiva. As regras de origem são critanãrios usados ​​para definir opaís de origem de um produto, o que ajuda a determinar se ele se qualifica para o tratamento com ou sem tarifa reduzida.

Com o Nafta, a Amanãrica do Norte pa´de competir globalmente novamente na indústria automobila­stica porque os Estados Unidos, Manãxico e Canada¡ uniram forças. Mas o governo Trump buscou e recebeu regras de origem altamente restritivas e complicadas que, se muito, tornara£o a indústria automotiva norte-americana menos competitiva em relação a s indaºstrias automotivas europeias e asia¡ticas.

O pra³ximo passo nesse caminho, e espero que não acontea§a, éreagir a  redução da competitividade impondo tarifas mais altas aos automa³veis da Europa e da asia.

No final, quem pagaria por isso? Os consumidores americanos, mexicanos e canadenses desses vea­culos sim. Isso tornaria as indaºstrias que dependem da força da indústria automotiva da Amanãrica do Norte menos competitivas.

Trump fez campanha sobre políticas protecionistas em 2016, visando TPP, NAFTA e China. Por que essa mensagem ressoou com os eleitores?

Em primeiro lugar, não éverdade que haja uma oposição generalizada ao livre comanãrcio. a‰ claro que o comanãrcio nunca foi popular entre muitos interesses especiais que acreditam ter algo a ganhar com o protecionismo. Embora a globalização não seja tão amplamente aceita como era há15 ou 20 anos nos Estados Unidos, pesquisas de opinia£o realizadas no ano passado mostram um consenso bipartida¡rio entre os americanos em apoio ao comanãrcio internacional. Existem boas razões para isso.

Quais são alguns desses motivos?

Bem, por um lado, o comanãrcio impulsiona o crescimento econa´mico e a inovação. Os consumidores dos EUA se beneficiam diretamente de poder escolher entre uma seleção mais ampla de produtos de alta qualidade a prea§os mais baixos. Muitas pessoas nos Estados Unidos se beneficiam da presença de produtos americanos nos mercados globais.

Claro, todas as economias avana§adas perderam empregos na indaºstria. Existem localidades, comunidades e certamente indivíduos que foram afetados pela mudança na composição do comanãrcio. A questãoése devemos sacrificar os interesses da maioria ao adotar políticas protecionistas ou implementar intervenções políticas que protejam aqueles que são afetados negativamente pelo comanãrcio.

Parte do problema éque as políticas econa´micas e sociais gerais depaíses como os Estados Unidos não se destinam a fortalecer a rede de segurança social, o que deixa muitas pessoas vulnera¡veis. As consequaªncias dessas falhas políticas são frequentemente atribua­das a s políticas comerciais quando, de fato, o sistema pola­tico não estãooferecendo a todos uma oportunidade justa de participar da economia moderna. Acho que émuito importante enfatizar. Os pola­ticos tendem a culpar os bodes expiata³rios por suas próprias falhas e deficiências.

Vocaª dirige o Centro de Yale para o Estudo da Globalização desde 2002. O que vocêgosta de trabalhar na universidade?

Passei anos maravilhosos aqui buscando meu doutorado. em economia e éuma honra ter uma posição modesta na minha alma mater. O ambiente acadêmico émuito estimulante. A universidade tem feito um excelente trabalho nas últimas duas décadas, envolvendo-se com questões globais como comanãrcio, mudança climática, pobreza e segurança internacional. a‰ focado em fornecer aos alunos a oportunidade de se envolverem no tratamento dessas questões, o que émuito importante.

Além disso, adoro ensinar. a‰ um privilanãgio e uma parte muito importante da minha vida.

 

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