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Aves que mais dispersam sementes permanecem maior tempo na natureza
Espanãcies que mais contribuem em redes de dispersão tendem a ser mais esta¡veis e persistentes ao longo de milhões de anos
Por Júlio Bernardes - 25/05/2021


Mirlo comaºn

A participação de espanãcies de aves em redes ecola³gicas de dispersão de sementes tem relação com a permanaªncia dessas espanãcies na natureza, aponta pesquisa do Instituto de Biociências (IB) da USP. De acordo com o estudo, que analisou 468 espanãcies diferentes de aves, as linhagens que contribuem com maior importa¢ncia para os processos de dispersão tendem a ser mais esta¡veis e persistentes ao longo de milhões de anos. O trabalho também indica que essa relação tem maior intensidade em regiaµes mais quentes e aºmidas, como as florestas tropicais. Os resultados do estudo são apresentados em artigo publicado no site da revista Science, em 14 de maio.

“Nossa pesquisa visa a compreender se existe e como se da¡ uma relação entre a estabilidade e a persistaªncia de espanãcies de aves ao longo do tempo, numa escala de milhões de anos, e a posição que essas espanãcies ocupam nas redes ecola³gicas de dispersão de sementes”, relata o bia³logo Gustavo Burin, primeiro autor do artigo. “Para isso, usamos dados e metodologias de duas áreas do conhecimento, macroevolução e análise de redes de interação, resultando em uma abordagem bastante abrangente e inovadora.”

As redes de dispersão de sementes são estruturas que integram as diferentes espanãcies de animais e plantas que participam desse tipo de interação. “Elas são representações de um conjunto de interações entre espanãcies na natureza, e são construa­das atravanãs de observações diretas, como avistamentos de algum animal com um fruto, ou indiretas, por exemplo, por meio da análise de componentes fecais”, explica Burin.

“Nossa pesquisa visa a compreender se existe e como se da¡ uma relação entre a estabilidade e a persistaªncia de espanãcies de aves ao longo do tempo, numa escala de milhões de anos, e a posição que essas espanãcies ocupam nas redes ecola³gicas de dispersão de sementes.”

Muitas das espanãcies dependem exclusivamente de animais para dispersar suas sementes. “Esse processo éo responsável por levar as sementes dessas espanãcies de plantas para locais distantes da planta-ma£e”, conta o pesquisador. “Isso tem uma sanãrie de benefa­cios conhecidos para as plantas, como colonização de novos ambientes, minimização da competição com a planta que gerou a semente, entre outras.”

Dispersão de sementes

O estudo analisou dados de 29 diferentes redes de dispersão de sementes espalhadas pelo planeta, que envolvem um total de 468 espanãcies únicas de aves. “Para essas espanãcies, estimamos as taxas de especiação e extinção, ou seja, de formação e desaparecimento de espanãcies, e também calculamos algumas manãtricas que representam a posição que cada uma dessas espanãcies ocupa nas redes das quais participam”, explica Burin. “Essas duas informações foram combinadas usando modelos estata­sticos para testar se nossa hipa³tese de que espanãcies mais centrais nas redes tendem a pertencer a linhagens mais esta¡veis e persistentes ao longo do tempo se confirmava ou não.”

Os resultados da pesquisa indicam que as espanãcies mais centrais nessas redes de interação pertencem a linhagens que são mais esta¡veis e persistentes ao longo do tempo geola³gico. “Mesmo incorporando diferentes fontes de incerteza e rua­do, como, por exemplo, relações entre as espanãcies de aves ou espanãcies que participam de mais de uma rede, esses resultados se mantem”, ressalta o bia³logo. “Essa relação éainda mais intensa em regiaµes mais quentes, aºmidas e menos sazonais, como em florestas tropicais, o que destaca o papel do ambiente na montagem e estruturação dessas redes.”

Curruca capirotada

De acordo com o pesquisador, a pesquisa demonstra uma “assinatura” de processos que ocorrem ao longo de milhões de anos na montagem e estrutura de redes de interação, que são estruturas bastante flexa­veis. “Isso indica uma possí­vel ‘estrutura ba¡sica’ de redes de interação, e também evidencia uma conexão entre processos que ocorrem em escalas de tempo bastante distintas, milhões de anos ou algumas gerações”, salienta.

Burin explica que redes de interação são apenas representações do que acontece na natureza. “Nãoexiste na verdade uma estrutura ba¡sica, pois essa estrutura depende de inúmeros fatores como tipo de interação, tamanho da rede e localização geogra¡fica”, aponta. “Portanto, quando dizemos ‘estrutura ba¡sica’ nos referimos, na verdade, a esse padrãode que espanãcies mais esta¡veis tendem a ocupar posições mais centrais, enquanto que espanãcies menos esta¡veis aparecem na periferia dessas redes.”

O estudo, baseado na pesquisa de doutorado de Burin, realizada no IB, édescrito no artigo Macroevolutionary stability predicts interaction patterns of species in seed dispersal networks, publicado no site da revista Science em 14 de maio.

O artigo tem como autores Gustavo Burin, que atualmente épesquisador de pa³s-doutorado no Museu de Hista³ria Natural em Londres (Reino Unido), Paulo Roberto Guimara£es Junior e Tiago Bosisio Quental, professores do Departamento de Ecologia do IB. A pesquisa foi integralmente financiada pela Fundação de Amparo a  Pesquisa do Estado de Sa£o Paulo (Fapesp).

 

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