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Examinando a mudança evolutiva repentina
A descoberta acrescenta peso a  ideia de que a adaptaa§a£o pode ocorrer em grandes saltos, em vez de apenas se arrastar por longos períodos de tempo.
Por Universidade da Califórnia - Santa Bárbara - 16/02/2022


A columbine azul do Colorado mutante (esquerda) e do tipo selvagem são tão diferentes que um taxonomista pode atribua­-las a gêneros diferentes a  primeira vista. Crédito: Zachary Cabin

Quando Charles Darwin codificou pela primeira vez a teoria da evolução por meio da seleção natural, ele pensou nela como um processo gradual. "Nãovemos nada dessasmudanças lentas em andamento, atéque o ponteiro do tempo tenha marcado o longo lapso das eras", escreveu ele em seu trabalho seminal, "Sobre a Origem das Espanãcies".

Mas Darwin não tinha o quadro completo. "A evolução não necessariamente leva todas essas pequenasmudanças como Darwin propa´s", disse Scott Hodges, professor do Departamento de Ecologia, Evolução e Biologia Marinha da UC Santa Barbara.

Hodges, o estudante de doutorado Zachary Cabin e seus colegas acabaram de identificar um caso de mudança evolutiva repentina . Na revista Current Biology , os cientistas descrevem uma população de columbinas que perderam suas panãtalas, incluindo as esporas de nanãctar caracterí­sticas. Uma mudança dra¡stica causada por uma mutação em um aºnico gene. A descoberta acrescenta peso a  ideia de que a adaptação pode ocorrer em grandes saltos, em vez de apenas se arrastar por longos períodos de tempo.

Desde que a teoria da evolução foi apresentada, os bia³logos debatem se ela sempre ocorre em pequenos passos graduais ao longo de longos períodos de tempo ou a s vezes como um equila­brio pontuado pormudanças abruptas. Muitas vezes, grandesmudanças morfola³gicas aparecem dentro de escalas de tempo geola³gicas curtas, onde as formas intermedia¡rias podem não ter fossilizado. A questãoentão permanece se muitas pequenasmudanças ocorreram em um curto período de tempo, ou talvez se uma única mutação em grande escala possa ser responsável. Então, os pesquisadores realmente precisam pegar o desenvolvimento em ação se esperam construir um caso de quemudanças repentinas podem impulsionar a evolução.

Entre na columbine azul do Colorado. Em uma população, uma mutação fez com que muitas das plantas perdessem suas panãtalas com os ica´nicos esporaµes de nanãctar. Embora não seja uma ocorraªncia incomum em columbinas, a falta de espora£o parece ter permanecido nessa área: cerca de um quarto das plantas não possui a caracterí­stica distintiva.

Um aºnico gene

A equipe investigou o genoma da planta para encontrar a fonte da morfologia incomum. Eles consideraram um gene, APETALA3-3, conhecido por afetar o desenvolvimento do esta­mulo. Eles descobriram que esse aºnico gene controlava todo o desenvolvimento das esporas e necta¡rios da flor.

"O gene estãoligado ou desligado, então éa mudança mais simples que vocêpode obter", disse o principal autor Zachary Cabin. "Mas essa simples diferença causa uma mudança radical na morfologia."
 
Um aºnico gene quebrado faz com que as plantas mutantes desenvolvam flores sem panãtalas ou esporaµes de nanãctar.

Se essas flores fossem preservadas no registro fa³ssil, os cientistas poderiam classifica¡-las em dois gêneros totalmente diferentes. E haveria também uma lacuna intrigante: nenhuma forma intermedia¡ria documentando uma transição de uma morfologia para outra.

"Esta descoberta mostra que a evolução pode ocorrer em um grande salto se o tipo certo de gene estiver envolvido", disse Hodges. APETALA3-3 diz ao órgão em desenvolvimento para se tornar uma panãtala. "Quando estãoquebrado, essas instruções não estãomais la¡, e isso faz com que ele se desenvolva em um órgão completamente diferente, uma sanãpala", explicou ele.

APETALA3-3 éum tipo de gene homea³tico, que especifica o desenvolvimento de um órgão inteiro. Uma mutação em um desses genes pode ter um efeito dra¡stico na morfologia de um organismo. Por exemplo, uma mutação homea³tica faz com que uma mosca desenvolva pernas onde deveria ter antenas. "A maioria das mutações dessa natureza sera£o assim, simplesmente horra­veis", continuou Hodges. "O animal não tera¡ nenhuma chance de sobreviver. O bia³logo Richard Goldschmidt os chamou de 'monstros sem esperana§a'."

Mas, de vez em quando, uma dessasmudanças radicais pode fornecer uma caracterí­stica benanãfica em um ambiente especa­fico, criando um "monstro esperana§oso". E um monstro esperana§oso mostraria que a evolução pode ocorrer em saltos aºnicos e grandes, apoiando a hipa³tese do equila­brio pontuado.

"Nãotivemos um bom exemplo de um monstro esperana§oso devido a uma única mudança genanãtica", disse Hodges, "atéagora". Os pesquisadores precisam captar essasmudanças abruptas enquanto elas acontecem, caso contra¡rio elas desaparecem no genoma de um organismo. Por exemplo, outros parentes de columbinas perderam suas panãtalas e necta¡rios no passado, mas agora éimpossí­vel dizer se esses eventos ocorreram de uma são vez. O fato de estar acontecendo ativamente na columbine azul do Colorado permitiu que a equipe confirmasse seu status como um monstro esperana§oso.

“Definitivamente, hálguma sorte envolvida em estarmos por perto no momento certo para capturar isso”, disse Cabin.

Seleção surpreendente

Pegar a mudança em ação também oferece outro benefa­cio: a oportunidade de estudar a genanãtica e as pressaµes seletivas no trabalho.

A equipe descobriu cinco versaµes, ou alelos, de APETALA3-3, apenas uma das quais codifica uma panãtala com um espora£o de nanãctar funcional. Os outros quatro estavam quebrados, como Hodges disse. Eles também determinaram que a falta de esta­mulo éuma caracterí­stica recessiva. A flor se desenvolvera¡ normalmente desde que a planta tenha uma ca³pia do alelo funcional. Mas quaisquer dois dos alelos mutantes juntos impedira£o isso. "Vocaª pode mistura¡-los e combina¡-los", explicou Cabin.

Cerca de um quarto das columbinas azuis do Colorado nesta área exibem o traa§o recessivo de espureza, mais do que pode ser atribua­do ao mero acaso.

Em todas as espanãcies de columbinas épossí­vel encontrar indivíduos raros que desenvolvem flores sem esporaµes de nanãctar. Mas com um quarto da população do Colorado perdendo o recurso, Cabin e Hodges sabiam que isso era mais do que uma ocorraªncia casual. "Conseguir que muitos desse tipo mutante realmente sugere que háuma seleção favorecendo-o de alguma forma", disse Hodges, o que ele acha estranho, já que o espora£o produz nanãctar que atrai os polinizadores da planta.

Hodges estãoprofundamente familiarizado com columbinas, e todas as suas pesquisas anteriores sugerem que as esporas de nanãctar são importantes para o grupo. Mesmo pequenasmudanças na estrutura levaram a  especiação e diversificação do gaªnero. "Então, como diabos vocêpode perder suas esporas e ainda ser favorecido?" ele perguntou.

Atrair polinizadores éapenas um fator que contribui para o sucesso reprodutivo. Descobriu-se que as plantas mutantes realmente produziram mais sementes do que suas contrapartes, para surpresa da equipe. Eles começam a vasculhar suas observações, procurando uma explicação.

"A primeira vez que realmente percebemos que o padrãoestava no aeroporto a caminho de casa", lembrou Cabin. Ele estava lendo os dados enquanto Hodges os digitava no computador. "Scott podia ver o padrãose desenvolvendo, porque ele tinha todos os dados a  sua frente e estava ficando cada vez mais animado."

A equipe registrou herbivoria de lagartas, pulgaµes e veados nos diferentes morfos. Danos causados ​​por lagartas e pulgaµes podem prejudicar a produção de sementes, explicou Cabin, enquanto os cervos podem devastar uma planta inteira. E a  medida que os dados se acumulavam, surgiu uma tendaªncia clara: veados e pulgaµes preferiam flores com esporas de nanãctar.

Mudanças na morfologia floral são geralmente impulsionadas por polinizadores, mas a falta de esporas parece ser impulsionada pela herbivoria. "A seleção natural pode vir de fontes muito surpreendentes", disse Hodges. "Nem sempre éo que vocêespera que seja."

Tempo certo

Agora que eles identificaram seu monstro esperana§oso, Cabin e Hodges planejam investigar o DNA em torno de APETALA3-3 para construir uma linha do tempo de quando as mutações podem ter ocorrido. Quando o gene sofreu mutação pela primeira vez, apenas um dos cromossomos da planta foi afetado. Isso significa que cada descendente com essa mutação teria o mesmo ca³digo genanãtico em torno de APETALA3-3 por muitas gerações, explicou Hodges.

No entanto, os cromossomos trocam alelos ocasionalmente em um processo chamado recombinação. Ao rastrear a quantidade de recombinação acumulada em torno das diferentes versaµes do APETALA3-3, os cientistas podem estimar háquanto tempo cada mutação ocorreu. Mais variação requer mais tempo para acumular. E quanto mais próxima essa variação estiver do pra³prio APETALA3-3, mais eventos de recombinação ocorreram desde que uma mutação apareceu pela primeira vez.

Os pesquisadores também querem rastrear como a impulsividade estãose espalhando pela população. Os diferentes morfos se cruzam, mas evidaªncias genanãticas sugerem que hámenos acasalamento entre os dois grupos. A columbine azul do Colorado pode estar divergindo em espanãcies separadas, especialmente porque os dois tipos parecem depender de diferentes polinizadores. "Esse processo de divisão seria lento", disse Cabin, "mas háevidaªncias de que pode estar a caminho".

 

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