Danãcada cada vez mais perdida na economia brasileira e comparações internacionais
Os últimos sete anos (2020, inclusive) foram desastrosos do ponto de vista de crescimento econa´mico, pelo somata³rio dos três fatores (forte recessão, recuperaça£o lenta e gradual e coronavarus)

O Brasil passou por uma profunda recessão entre 2014 e 2016, de acordo com o Codace, o período com o pior biaªnio de crescimento econa´mico dos últimos 120 anos. Apa³s isto, a recuperação no triaªnio posterior foi lenta e gradual. Ocorreram alguns choques negativos nesses anos, como a greve dos caminhoneiros em 2018; e Brumadinho, crise argentina e incerteza internacional, com a guerra comercial entre EUA e China, em 2019,[1] que tiraram alguns pontos percentuais do crescimento brasileiro. Mas, independente desses choques, o crescimento foi bastante fraco. As perspectivas para 2020 eram positivas, de uma retomada um pouco mais forte da economia brasileira, com o PIB crescendo por volta de 2,0% neste ano.[2] Poranãm, este cena¡rio era anterior ao coronavarus. Com esta crise de saúde, que tem impactos na economia, a recessão no Brasil e no mundo seráforte em 2020. As expectativas de mercado, segundo o boletim Focus, indicam uma queda de 6,5% da atividade econa´mica brasileira neste ano, número pra³ximo da projeção do IBRE (-6,4%).
No final do ano passado, a economia brasileira estava 3,3% abaixo do pico pré-recessão, no 1T14. A maior perda acumulada, sempre em comparação com o pico pré-recessão 2014-16, foi no final de 2016 (-8,1%), no final da recessão. Com a recuperação lenta e gradual da economia brasileira, essa perda foi diminuindo em 2017, 2018 atéchegar em -3,3% em 2019. Com a queda do PIB no 1T20 em relação ao 4T19, a perda acumulada aumentou para 4,8%, mudando a trajeta³ria de redução do gap. Ou seja, antes de nos recuperarmos totalmente da recessão 2014-16, chegou a recessão de 2020, aumentando ainda mais esta perda. Para o 2T20, as perdas acumuladas podem chegar a 16%, ou atémais.
O começo da “década perdida atual†apresentou uma taxa média de crescimento de 3,0% a.a., entre 2011 e 2013. A partir de 2014 que a economia entrou neste processo de enfraquecimento presente atéos dias de hoje. Diante deste quadro, os últimos sete anos (2020, inclusive) foram desastrosos do ponto de vista de crescimento econa´mico, pelo somata³rio dos três fatores (forte recessão, recuperação lenta e gradual e coronavarus). Ao se calcular uma média ma³vel de sete anos (MM7A), o período 2014-2020 é(estãosendo) o pior, em termos de crescimento econa´mico, desde o inicio dos anos 1900, com uma queda média de 1,3% a.a. neste período.
A década atual (2011-2020) foi (estãosendo) a pior década em termos de crescimento econa´mico dos últimos 120 anos, pior do que os anos 1980, conhecidos como “década perdidaâ€[3] (Gra¡fico 1). No cena¡rio anterior a crise do coronavarus, o crescimento manãdio da década atual seria de 0,8% ao ano.[4] Com a recessão de 2020, a década vai ficar estagnada, podendo atéter taxas negativas. Segundo as expectativas de mercado para o PIB de 2020 (-6,5%), a taxa média real de crescimento do PIB da década já estãono territa³rio negativo (-0,1%). Ao se considerar as últimas (junho/20) projeções do FMI (-9,1%), a média da década atual passaria para -0,3% a.a..[5] Â

Um grande debate que já ocorreu, inclusive no Blog do IBRE,[6] foi sobre as origens da recessão 2014/16, se foi mais influenciada por fatores internos, principalmente relacionados a chamada “Nova Matriz Econa´micaâ€, ou por questões internacionais. Na minha opinia£o, os fatores domanãsticos tiveram um peso maior na recessão brasileira do que fatores externos.[7] Assim como a recuperação posterior, lenta e gradual, também ocorreu principalmente por problemas internos, tanto conjunturais como estruturais. Por outro lado, a recessão deste ano seráuma recessão mundial, fruto de uma pandemia que se fez presente em praticamente o mundo inteiro. E, incertezas locais também fazem com que a recessão brasileira fique mais grave ainda.
Numa comparação internacional da década atual (2011-20), utilizando as projeções de junho deste ano do FMI para os agregados (mundo, economias emergentes e Amanãrica Latina e Caribe), e a Focus para o Brasil, observa-se que nesse período, enquanto o mundo cresceu, em média, quase 3,0% a.a., puxado principalmente pelas economias emergentes[8] (grupo que o Brasil faz parte), com um crescimento manãdio de 4,0%, o Brasil ficou com uma década estagnada e levemente negativa. A taxa média real de crescimento da AL ébaixa também, mas 0,5 p.p. superior ao Brasil.[9] Poranãm, éimportante frisar que esse desempenho fraco da AL émuito influenciado pelos resultados do Brasil, dado que opaís éo principal componente do grupo. O peso[10] da economia brasileira na economia latino-americana éde 34,5% na década.

A Tabela 1 mostra as taxas médias reais de crescimento para o PIB[11] e o PIB per capita na década atual para algunspaíses selecionados da Amanãrica Latina (Chile, Cola´mbia, Manãxico e Peru) e com outras economias emergentes, que compaµe o BRICS junto com o Brasil (Raºssia, andia, China e áfrica do Sul). O desempenho do Brasil foi pior do que todos os novepaíses, tanto em relação ao PIB quanto ao PIB per capita. Na Tabela 1, também há diferença entre as taxas de crescimento dospaíses e do Brasil, bem como a média da AL ex-Brasil (média de Chile, Cola´mbia, Manãxico e Peru), e a média BRICS ex-Brasil (Raºssia, andia, China e áfrica do Sul). Em média, durante a década atual, o PIB dospaíses selecionados da AL cresceu 2,4 p.p. acima do PIB do Brasil. Já ospaíses do grupo dos BRICS cresceram 3,4 p.p. a mais do que o Brasil. Já sobre o PIB per capita, as diferenças foram de 2,0 p.p. e 3,5 p.p. respectivamente para ospaíses da AL e BRICS.

A pior consequaªncia deste período de fraqueza da atividade econa´mica no Brasil éo alto desemprego e a situação do mercado de trabalho, com dezenas de milhões de brasileiros numa situação mais vulnera¡vel do mercado de trabalho (quase 70 milhões, antes da crise do coronavarus). No contexto atual, a incerteza brasileira estãobastante alta,[12] em função das crises de saúde, econa´mica e também polatica, o que contribui para a década a ser cada vez “mais perdidaâ€. Diminuir as incertezas e voltar a agenda de reformas no pa³s-crise vai ser fundamental no processo de retomada da economia, para reduzir as perdas acumuladas das duas recessaµes (2014-16 e 2020) da década atual e diminuir os gaps com o resto do mundo.
*As opiniaµes expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva
do(s) autor(es), não refletindo necessariamente a posição institucional do
maisconhecer.com
Marcel Balassiano
Economista da área de Economia Aplicada do Instituto Brasileiro de Economia (FGV IBRE). Mestre em Economia Empresarial e Finana§as pela EPGE Escola Brasileira de Economia e Finana§as (FGV EPGE)