No caso da Covid-19, uma emergaªncia de saúde pública, precisamos diminuir o risco de circulaa§a£o do varus, então penso que devem ser obrigata³rias para todos e todas que puderem ser vacinados se não possuarem algum tipo de contraindicaça£o,
O governador do Estado de Sa£o Paulo disse no último dia 16/10/2020 que, quando uma vacina for aprovada pela Agência Nacional de Vigila¢ncia Sanita¡ria (Anvisa), a vacinação contra a Covid-19 seráobrigata³ria no Estado para as 45 milhões de pessoas e, apenas, quem tiver atestado médico, afirmando que não podera¡ receber a vacina, serádispensado de receber o imunizante. O governador paulista afirmou inicialmente que a vacinação contra a Covid-19 poderia comea§ar no dia 15 de dezembro em Sa£o Paulo, desde que Anvisa autorize o uso emergencial, mas tudo indica que ficara¡ para 2021, pois atéo momento não houve nenhuma abertura dos estudos de fase 3 em termos de eventos de pessoas contaminadas, para que se possa comparar o grupo que tomou a candidata vacinal CoronaVac com o grupo placebo.
A Anvisa informou que a agaªncia dara¡ a resposta em termos de liberação de todas as vacinas no menor tempo possível. O Presidente da República afirma que a vacinação não seráobrigata³ria e ponto final. Nãopodemos aceitar a politização das vacinas como foi feito com os tratamentos a base de medicamentos para Covid-19. As vacinas salvam vidas e são fundamentais para o bem-estar coletivo, com enorme impacto para toda a sociedade. No caso da Covid-19, uma emergaªncia de saúde pública, precisamos diminuir o risco de circulação do varus, então penso que devem ser obrigata³rias para todos e todas que puderem ser vacinados se não possuarem algum tipo de contraindicação, sim.
Contradições
O Ministro da Saúde Eduardo Pazuello, em reunia£o com governadores no dia 20/10/2020, informou que o governo brasileiro compraria 46 milhões de doses da CoronaVac, após aprovação em fase 3 confirmando sua eficácia e após aprovação pela Anvisa. Mas hoje, 21/10/2020, o Presidente Bolsonaro, que classificou a CoronaVac como a "vacina chinesa de Joa£o Doria", afirmou que o Brasil não comprara¡ doses da CoronaVac, desautorizando o anaºncio feito pelo Ministro da Saúde. O Presidente afirmou que o povo brasileiro não serácobaia de ninguanãm e que a vacina precisa ser comprovada cientificamente pelo Ministanãrio da Saúde e certificada pela Anvisa.
Curioso que esta decisão veio logo após Mike Pompeo, secreta¡rio de Estado norte-americano, recomendar que o Brasil limitasse o comanãrcio com a China. Aa deu aquele na³ na minha cabea§a, pois esse mesmo presidente autorizou a compra da candidata vacinal de Oxford, ainda sem comprovação de eficácia e defendeu o uso indiscriminado das cloroquinas, sem qualquer evidência cientafica, indo contra as recomendações dos cientistas e da Anvisa. Aa sim, usando a população brasileira como cobaia e colocando vidas em risco. Governadores e secreta¡rios de saúde estãorevoltados com a decisão. A comunidade cientafica, assim como eu, estãoperplexa e incranãdula. A população brasileira precisa ter acesso a todas as vacinas seguras e eficazes aprovadas em fase 3. a‰ inaceita¡vel politizar a questãodas vacinas e colocar aspirações políticas pessoais acima da saúde pública da população brasileira.
Maior campanha de vacinação em massa da história
Essa sera¡, sem daºvida, a maior campanha de vacinação em massa da história. No Brasil, as futuras vacinas devem ser inseridas no Programa Nacional de Imunizações (PNI) para serem distribuadas para todo o Brasil. A questãosobre a logastica de produção e distribuição das vacinas para Covid-19 já foi discutida neste espaço aqui e neste outro artigo. Â
Para vacinarmos 80% da população brasileira, ou cerca de 170 milhões de pessoas, com duas doses, precisaremos adquirir 340 milhões de vacinas, o que implica em 340 milhões de agulhas, seringas, frascos, tampas de frascos, embalagens para as agulhas e seringas. E vamos torcer para não haver escassez e nem aumento nos prea§os dos insumos. a‰ importante lembrar que tanto a malha aanãrea, como os Espaços para armazenamento das vacinas nos aeroportos e nos poraµes dos aviaµes, com ca¢maras frias para o armazenamento adequado, também vai trazer desafios logasticos.
Sera£o necessa¡rias milhões de embalagens, de caixas de resfriamento e embalagens tanãrmicas para armazenamento das vacinas, com muito rigor, cuidado, planejamento e organização. Segundo a OMS, cerca de 25% das vacinas no mundo, quando chegam no local de destino, estãodegradadas, por falhas no armazenamento ou no transporte. Cerca de 50% das vacinas chegam nos locais de destino sem efica¡cia, por problemas de temperatura e demora para chegar nos locais de vacinação. Sera¡ preciso uma estratanãgia bem elaborada e coordenada.
A CoronaVac ésegura e eficaz?
A CoronaVac, que, ao que tudo indica, estãose mostrando bem segura, mostrara¡ boa eficácia se o número de infectados no grupo que tomou o placebo for bem superior ao número de infectados no grupo que tomou a potencial vacina. Para ter uma ideia inicial da eficácia da candidata vacinal, espera-se a conclusão inicial de 61 eventos, ou 61 voluntários infectados, entre os milhares de voluntários no grupo que tomou o placebo e no grupo que tomou a CoronaVac.
O ensaio sofreu pequenos atrasos pois o Instituto Butantan ainda não conseguiu recrutar todos os 13 mil voluntários previstos e nem todos os voluntários já tomaram as duas doses. Uma questãocuriosa éque os equipamentos de proteção individual reduziram o número de infecções, visto que os profissionais da saúde sendo testados estãoprotegidos por rigorosos protocolos de segurança, exatamente para evitar a infecção, o que vai contra o desejado em fase 3, que éter um determinado número de eventos ou pessoas infectadas.
O Instituto Butantan ainda não tem os primeiros 61 voluntários infectados desde que o estudo clanico de fase 3 foi iniciado. Apenas quando este número for alcana§ado, o estudo clanico seráaberto temporariamente para checar a que grupo pertencem os 61 voluntários infectados e ter uma análise preliminar. O ideal éque todos ou a maior parte dos infectados esteja no grupo placebo, o que mostraria boa eficácia da candidata vacinal. Como a pandemia estãoem uma fase descendente, pode demorar a ter resultados de eficácia em fase 3.
Com o objetivo de acelerar o tempo para alcana§ar o número manimo de 61 voluntários com diagnóstico de Covid-19 confirmado, o Instituto Butantan vai aumentar o número de voluntários da área de saúde. Quanto maior o número de voluntários, maior a chance de alcana§ar o número de 61 eventos com voluntários infectados. Como o espalhamento da doença diminuiu, mesmo os que tomaram o placebo ainda não adquiriram a doena§a.
Varus Sars-CoV-2 usado na CoronaVac éinativado
A empresa Sinovac e o Instituto Butantan apostaram no uso de uma plataforma conhecida, usando o varus Sars-CoV-2 inativado. Uma vez isolado e cultivado o varus, ele éinativado por uso de calor ou de reagentes quamicos. Esta estratanãgia apresenta algumas vantagens, pois assim como outras vacinas, como da raiva e da gripe, sabe-se que são poucos os efeitos colaterais adversos de curto, manãdio e longo prazo. Isto vem sendo confirmado nos ensaios de fases 1, 2 e 3 com esta candidata vacinal. Para isolar e cultivar o varus, énecessa¡rio usar um laboratório de segurança máxima e para isso precisa de investimentos.
Essa plataforma normalmente oferece resposta humoral, de produção de anticorpos neutralizantes, mas não resposta celular, com produção de células T, o que de fato foi observado com a CoronaVac. Essa candidata vacinal precisa do uso de adjuvantes para induzir uma boa resposta no sentido de estimular o sistema imunológico e levar a produção de anticorpos neutralizantes.
Outro ponto éa necessidade de duas doses para induzir boa reposta imune, o que tem se observado com praticamente todas as candidatas vacinais em fase 3 para a Covid-19. Este fato dificulta as estratanãgias de vacinação em massa, como já discutido em artigo aqui e neste outro aqui.Â
Uma vez aprovada em fase 3, certamente havera¡ divulgação de informações sobre em que grupos a vacina tem mais eficácia e quem não pode tomar. Mas após passar em todas as fases com enorme rigor cientafico e ser aprovada em fase 3, a população pode confiar e deve tomar a vacina.
Estudo clanico mostra que os antivirais remdesivir, hidroxicloroquina, lopinavir/ritonavir
e interferon beta-1a são ineficazes contra a Covid-19
O estudo clanico “Ensaio Solidariedade†(Solidarity Therapeutics Trial) foi realizado durante 6 meses em 405 hospitais de mais de 30países. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), os resultados publicados no dia 15/10/2020 trazem evidaªncias conclusivas de que os antivirais remdesivir, hidroxicloroquina, lopinavir/ritonavir e interferon beta-1a, são ineficazes contra a Covid-19. O “Ensaio Solidariedade†éum ensaio randomizado, padrãoouro, e envolveu 11.266 adultos, sendo 2.750 no grupo remdesivir, 954 no grupo hidroxicloroquina, 1.411 no grupo lopinavir/ritonavir, 651 no grupo interferon mais lopinavir, 1.412 no grupo Interferon e 4.088 no grupo placebo, que não recebeu nenhum medicamento.
O estudo mostrou resultados decepcionantes, sendo que os medicamentos não tiveram nenhum efeito sobre a diminuição da mortalidade, não levaram a diminuição do tempo de internação para pacientes hospitalizados com Covid-19, não ajudaram os pacientes a se recuperar mais rapidamente e ainda registrou 1.253 mortes. A Gilead Sciences, fabricante do remdesivir, emitiu uma nota questionando os resultados do estudo afirmando que os benefacios do remdesivir foram demonstrados em outros três ensaios clínicos.
The Great Barrington Declaration, uma manifestação arriscada
Uma manifestação de cerca de 6400 cientistas americanos e europeus, conhecida como “The Great Barrington Declarationâ€, defende que os idosos e doentes nos Estados Unidos e no Reino Unido sejam protegidos e fiquem em isolamento social, mas que as pessoas sauda¡veis levem sua vida trabalhando normalmente, socializando em bares e restaurantes e participando de eventos esportivos e culturais, aumentando a circulação do varus com o objetivo de acelerar a obtenção da imunidade coletiva, comunita¡ria, ou de rebanho (eu odeio esta palavra).
Os signata¡rios do documento defendem que o isolamento social produz efeitos adversos tanto na saúde mental e física das pessoas, assim como na saúde pública. Eu concordo com este último ponto, mas se estes mesmospaíses, tanto la¡ como ca¡, tivessem desde o inacio, adotado as medidas não farmacola³gicas preconizadas pela OMS e pelos cientistas, conscientizando a sua população, nosnão estaraamos nesta quarentena tão prolongada. O problema não éisolamento social, que salvou milhões de vidas, mas as quarentenas mal feitas em virtude de tanta desinformação.
Na³s aprendemos muito sobre a pandemia, ainda hámuito aprender, mas sabemos que podem haver casos de reinfecção, que não ésão uma questãode quem sobrevive e quem morre ao ser infectado, pois sabemos dos vários efeitos colaterais e das sequelas graves no coração, no pulma£o, no cérebro, principalmente em quem tem o quadro mais grave da doena§a. Ao circular livremente, as pessoas estara£o expostas ao varus, algumas ficara£o doentes, va£o infectar outras pessoas próximas, outras va£o morrer e algumas que sobreviverem tera£o sequelas que podem ser irreversaveis.
Na³s vimos o estrago que a Covid-19 causa em idosos, em pessoas com comorbidades, diabanãticos, cardaacos, imunodeprimidos e sabemos que mesmo os jovens sauda¡veis podem morrer. E essa declaração veio em um momento em que o número de hospitalizações estãocrescendo na Europa e próxima da eleição presidencial nos EUA.
Domanio paºblico
A pandemia da Covid-19 escancarou as desigualdades sociais, econa´micas, as discriminações estruturais e as mazelas da nossa sociedade. Uma outra publicação, assinada por cerca de 80 cientistas na revista médica The Lancet, afirma que a defesa da imunidade coletiva proposta na The Great Barrington Declaration éantianãtica e “uma fala¡cia perigosa sem evidência cientafica†e que a ausaªncia de medidas de controle não farmacola³gicas levaria a milhões de mortes, prolongando a pandemia, causando estragos na economia e paralisando os sistemas sanita¡rios.
Nãorestam daºvidas que as medidas não farmacola³gicas como distanciamento fasico, evitando aglomerações e Espaços mal ventilados, o uso de ma¡scaras, hábitos de higiene respirata³ria e de limpeza das ma£os, testes de diagnóstico confia¡veis, rastreamento de contatos das pessoas infectadas e o isolamento social são essenciais para reduzir a mortalidade e evitar o colapso dos servia§os de saúde.
Na³s ainda nem sabemos se as pessoas, que foram infectadas com a Covid-19 e se recuperaram, va£o desenvolver imunidade duradoura e, caso forem reinfectadas, podem ficar doentes e transmitir o varus. A melhor alternativa para se atingir a imunidade coletiva éuma cobertura vacinal ampla, com um imunizante seguro e eficaz.
Nova reinfecção
Um artigo publicado no dia 12/10/2020 na revista The Lancet Infectious Diseases mostrou um novo caso de reinfecção, descrito por pesquisadores do Laborata³rio de Saúde Paºblica do Estado de Nevada e da Universidade de Nevada, nos Estados Unidos. O paciente de 25 anos, que não pertence a grupos de risco, testou positivo para duas infecções por diferentes cepas do Sars-CoV-2 no período de apenas 48 dias. A segunda infecção foi considerada mais grave do que a primeira e ele precisou ser internado e receber suporte de oxigaªnio. Outros quatro casos de reinfecção foram confirmados na Banãlgica, Holanda, Hong Kong e Equador e comentados aqui.Â
Desafio humano
Um artigo publicado no dia 20/10/2020 na revista Nature destaca que o governo brita¢nico assinou um contrato com a organização comercial de pesquisa clanica Open Orphan e sua subsidia¡ria hVIVO, para realizar um estudo conhecido como desafio humano (human challenge). O objetivo étestar cerca de 30-50 voluntários sauda¡veis na faixa de 18-30 anos, sem qualquer comorbidade, para que eles recebam pequenas doses do varus Sars-Cov-2, que causa a Covid-19, atéserem infectados, no sentido de ajudar no desenvolvimento de vacinas. Todos os voluntários sera£o internados no Royal Free Hospital, em Londres, em uma área de segurançanível3, sob rigorosos cuidados médicos.
O desafio humano funciona assim, alguns voluntários recebem uma candidata vacinal e outros recebem um placebo e numa segunda etapa, todos sera£o infectados com o varus Sars-CoV-2. O estudo estãoprevisto para iniciar em janeiro de 2021, desde que receba a aprovação final regulamentar dos comitaªs de anãtica. A empresa nVivo, responsável pelo desafio, tem experiência em estudos anteriores com outros varus respirata³rios.
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maisconhecer.com
Luiz Carlos Dias
Professor Titular do Instituto de Química da Unicamp, membro titular da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Comendador da Ordem Nacional do Manãrito Cientafico e membro da Fora§a-Tarefa da UNICAMP no combate a Covid-19.