As previsaµes de crescimento do PIB este ano, fortemente influenciadas pelo resultado do primeiro trimestre, podem estar muito sobrestimadas. A base de comparaça£o ébaixa e os fatores sazonais podem estar prejudicados pela pandemia.

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A divulgação do PIB do primeiro trimestre de 2021 com crescimento de 1,2% comparado com o quarto trimestre de 2020 e de 1 % quando comparado a igual trimestre de 2020, ocasionou uma onda de otimismo avassaladora. Já se fala atéem crescimento de 6% para este ano.
Ha¡ vários cuidados que devemos tomar quanto a esse otimismo. Em primeiro lugar o primeiro trimestre de 2020 não era dos mais promissores como já mostrava o Monitor do PIB nos meses de janeiro e fevereiro, antes mesmo da chegada da pandemia; e, a partir da segunda quinzena de mara§o com o inicio da pandemia nopaís e o isolamento social que influenciou bastante a atividade econa´mica. O IBGE registrou no primeiro trimestre de 2020 queda de 0,3% comparada ao mesmo período de 2019 e -2,2 comparada ao quarto trimestre de 2019. Ou seja, trata-se de uma base de comparação deprimida.
Ao par disso, neste primeiro trimestre do ano a economia se organizou e enfrentou a pandemia de forma mais a¡gil. O setor de servia§os em particular, que depende da interação social, superou algumas de suas dificuldades como no caso do comanãrcio com a adoção de compras por internet e das entregas em casa; e o serviço de alimentação fora da residaªncia que foi internalizado por parte das famalias com entregas variadas. Educação resolveu em parte com a adoção do ensino a distância e os atendimentos de saúde em que foram adotados cuidados necessa¡rios. Adicionalmente, parte da população aparentemente abandonou os cuidados necessa¡rios o que refletiu positivamente na economia, mas muito negativamente no espalhamento da doença e na média do número de mortos que chegou a ser superiores a 4 mil a³bitos dia¡rios, em alguns dias.
Mas o maior problema estãono andice dessazonalizado. Em geral, os fatores sazonais pouco mudam de um ano para outro e o efeito calenda¡rio com os maiores eventos não costumam ter um impacto tão grande quando se trata de sanãries de frequência trimestrais. No entanto, como a pandemia alterou fortemente o padrãoecona´mico isso acabou tendo impacto na sazonalidade nos modelos de ajuste sazonal. A partir do segundo trimestre de 2020 atéo momento o movimento tradicional sazonal desapareceu, dias trabalhados, fanãrias, feriados, Natal, Ano-Novo, Turismo no Vera£o, etc. não se realizaram. Tivemos um ano “flatâ€. Sabemos que os fatores sazonais pouco mudam, em condições normais, e o efeito calenda¡rio com os maiores eventos não costumam mudar quando se trata de trimestres. No entanto, o padrãosazonal do último ano (2º tri 2020 - 1º tri 2021) estãofortemente alterado e, ainda, não se consegue observar claramente a precisão dos pacotes de ajuste sazonal
Por esta raza£o, foi realizado exercacio heroico na sanãrie trimestral considerando os fatores sazonais de 2019, por ser o período de um ano inteiro anterior a pandemia. A partir disso, os fatores sazonais trimestrais de 2019 foram aplicados aos números dos mesmos trimestres da sanãrie encadeada de 2020 e do primeiro trimestre de 2021. O resultado do exercacio realizado na sanãrie do PIB do Monitor do PIB-FGV do primeiro trimestre, divulgado em 17 de maio mostrarammudanças significativas (de 1,7% para 1,2%, no resultado do exercacio). Repetimos agora o mesmo exercacio com os valores do PIB do primeiro trimestre do IBGE divulgados em 1º de junho, cujos resultados estãona tabela abaixo que mostram as taxas divulgadas pelo IBGE (primeira coluna) e a estimada em nosso exercacio (segunda coluna), e no gra¡fico as respectivas linhas de evolução.

Feito o exercacio, repara-se que o PIB do primeiro trimestre de 2021 continua apontando crescimento (+0,4%), poranãm a uma taxa significativamente menor do que na sanãrie ajustada habitualmente (+1,2%). Esta grande variação dos resultados ao adotar apenas efeitos sazonais do ano imediatamente anterior, mostra o quanto éimportante, neste momento de alta instabilidade da economia, ter bastante cautela na análise dessas informações. Os resultados podem não estar refletindo apenas as oscilações econa´micas, mas também questões estatasticas decorrentes das especificidades dos modelos de ajuste sazonal que podem distorcer a realidade.
Nãoháum consenso, neste momento, sobre qual a melhor forma de se ajustar sazonalmente essas sanãries, ainda mais que a pandemia continua impactando a economia. O que se sabe éque éimportante levar em consideração todas essas caracteristicas no momento de avaliar a real condição da economia.
As opiniaµes expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do(s) autor(es), não refletindo necessariamente a posição institucional do maisconhecer.com
Claudio Considera
Doutor em Economia (UFF), mestre em Economia (UnB), pa³s-graduado em Ana¡lise Econa´mica (CENDEC/IPEA) e graduado em Economia (UFF). Foi chefe das Contas Nacionais do IBGE (1986-1992), Diretor do IPEA (1992-1998) e Secreta¡rio de Acompanhamento Econa´mico do Ministanãrio da Fazenda (1999-2002). Atualmente coordena o Naºcleo de Contas Nacionais (NCN) da FGV IBRE, sendo um dos autores do Monitor do PIB-FGV e do IAE-FGV.
Juliana Trece
Economista do Naºcleo de Contas Nacionais do FGV IBRE sendo a analista responsável pela elaboração mensal do Monitor da Atividade Econa´mica (Monitor do PIB-FGV e IAE-FGV) do qual éuma das autoras.
Roberto Olinto
Doutorado em Engenharia de Produção COPPE/UFRJ, Foi Presidente (2017-2019), Diretor de Pesquisas (2014-2017) e Coordenador de Contas Nacionais (1995-2014) do IBGE, Membro do Advisory Expert Group em Contas Nacionais das Nações Unidas (2002-2019), Consultor do Departamento de Estatasticas do Fundo Moneta¡rio Internacional para contas nacionais, atualmente pesquisador associado do FGV IBRE.