Apa³s a condenação do jogador de futebol Robinho por estupro e pela Justia§a Italiana, háuma preocupaa§a£o sobre o efetivo cumprimento da pena de 9 anos de prisão. Houve respeito a suas garantias processuais...

Tanto Robinho quanto o Santos já foram punidos pelo cancelamento de um importante patrocanio
Apa³s a condenação do jogador de futebol Robinho por estupro e pela Justia§a Italiana, háuma preocupação sobre o efetivo cumprimento da pena de 9 anos de prisão. Houve respeito a suas garantias processuais e o processo alcana§ou seu último degrau no dia 19 de janeiro de 2022, com sua condenação definitiva. Poranãm, Robinho deixou a Ita¡lia durante as investigações e estãono Brasil, imaginando com isso ficar longe do alcance da jurisdição italiana. Entretanto, o mundo mudou e três pontos merecem ser analisados com maior profundidade.Â
Vale lembrar que tanto Robinho quanto o Santos, onde estava, já foram punidos pelo cancelamento de importante patrocanio, ameaça de cancelamento de outros patrocanios que poderiam causar um rombo de 20 milhões de reais por ano, segundo a imprensa noticiou em 2020, e suspensão do jogador pelo Santos, contendo o tsunami de cancelamentos de patrocanios que então se formava. Sa³ o prejuazo a imagem do time e do pra³prio desportista já foram significativos. Mas, naturalmente, em nada se comparam a dor de uma vatima em caso de estupro, como foi o caso.Â
Ha¡ quem defenda que, por estar no Brasil, seria impossível fazer o jogador pagar por seu crime. Mas háoutra corrente, no sentido contra¡rio, que demonstra que ele pode ser preso aqui no Brasil.Â
Normalmente, quando uma pessoa écondenada empaís diferente daquele em que ela se encontra, lana§a-se ma£o da extradição, que éinstrumento de cooperação juradica internacional visando executar a pena ou instruir o processo. De fato, a Constituição Federal, no seu art. 5º, inc. LI, proabe a extradição de brasileiros natos. Dessa forma, se um brasileiro nato for condenado no exterior, ele realmente não pode ser entregue a s autoridades estrangeiras. Logo, o caminho éverificar se ele pode cumprir aqui a pena a que foi condenado no exterior. Nesse sentido, énecessa¡rio avaliar os tratados celebrados pelo Brasil com opaís da condenação.
No caso especafico do Robinho, por ter sido uma condenação na Ita¡lia, háquem raciocine a partir do Decreto 862, de 1993, que internalizou o Tratado sobre Cooperação Judicia¡ria em Matanãria Penal, entre a República Federativa do Brasil e a República Italiana, de 1989. O art. 1º de tal tratado delimita o objeto a que ele se destina regular, excluindo desse objeto a execução de condenações. Realmente, esse tratado deixou de fora o cumprimento de pena. Assim, o nacional brasileiro não poderia ser extraditado e, se condenado na Ita¡lia, não poderia ser preso no Brasil. Pareceria que Robinho se deu bem por ter voltado ao Brasil.Â
Todavia, quem assim pensa se esquece que, juntamente com o mundo, o direito mudou para muito mais atédo que o cancelamento reputacional, que atinge patrocanios, inclusive os miliona¡rios do mundo da bola. Mas o que mudou? Antes, poranãm, vale ressaltar, não houve necessidade de mudar a Constituição. O art. 5o, LI, já permitia que o nacional brasileiro pudesse cumprir pena nopaís que lhe da¡ nacionalidade. Assim, seria possível fazer que o sujeito cumprisse pena aqui, permitindo, após o cumprimento da pena, uma diminuição de vulnerabilidade, pois buscar reinserção social de migrante ésempre mais complexo do que a de um nacional, por mais que essa também seja complicada. Logo, a Constituição Federal veio para diminuir vulnerabilidades, cabendo a s autoridades fazerem acordos de cooperação ou adequações legislativas.Â
Em 1989, quando o Brasil celebrou o tratado com a Ita¡lia sobre cooperação em matéria penal, que se constituiu no Decreto 862, acima citado, não havia, no ordenamento juradico brasileiro, a execução por título estrangeiro. Assim, não era possível prender no Brasil quem fosse condenado no exterior, o que torna a exceção do art. 1o, n. 3, do Tratado com a Ita¡lia totalmente compreensavel. O Brasil não poderia se comprometer com algo que a lei interna vedava. Todavia, em 2017, foi promulgada a Lei 13.445, que entrou em vigor em 20 de novembro daquele ano, a qual permite a execução no Brasil de condenação havida no exterior, haja vista o art. 100 dessa lei, conhecida como Lei de Migração. Tal norma, no para¡grafo aºnico, inc. I, autoriza a transferaªncia de execução da pena nos casos em que "o condenado em territa³rio estrangeiro for nacional ou tiver residaªncia habitual ou vanculo pessoal no Brasil", que éexatamente o caso do Robinho. E, vale lembrar, desde 2008, com a decisão do RE 466.343, no STF, tratados internacionais possuem hierarquia de lei federal, se não forem de Direitos Humanos. No caso, étratado de cooperação, que tem hierarquia de lei federal, podendo ser alterado por lei federal posterior, se houver entendimento de que existe incompatibilidade entre o tratado e a Lei de Migração, apesar de poder ser vista complementaridade entre elas.Â
Em outras palavras, a Constituição Federal não era e continua a não ser obsta¡culo, mas égarantia para que o brasileiro cumpra pena no seupaís; a Lei de Migração traz a possibilidade de cumprir pena aqui, ressaltando que isso pode ser feito apesar do tratado, pois ela indica o caminho da promessa de reciprocidade também.
Portanto, não háobsta¡culo juradico para que Robinho seja preso e cumpra pena no Brasil. Qualquer decisão pelo não cumprimento da pena tera¡ um cara¡ter eminentemente polatico e destoante do que se espera de uma nação que precisa atrair investimentos para manter o bem-estar de sua população, algo mais difacil no momento em que não são o Brasil piora em importante andice internacional de percepção de corrupção, como também após notacias a respeito de gigante fundo de investimentos internacional que não prevaª novos investimentos no atual momento polatico.
E, além de tudo, levar Robinho a prisão pode representar não são a punição por um crime grave, mas também a indicação clara de que o Brasil não éporto seguro para condenados no exterior. Sera¡ um precedente, o que traz um peso muito maior que o do pra³prio caso, e, ainda que não se deva comparar o que éincompara¡vel, sinalizara¡ que nenhum desportista estãoacima do bem ou do mal inclusive no Brasil, como já foi o caso recente do outro lado do planeta.Â
Luas Renato Vedovato éDoutor em Direito Internacional pela Faculdade de Direito da USP; Professor da Uicamp; Membro do Observatório das Migrações em Sa£o Paulo.
Roberto di Cillo éadvogado, professor de cursos de pós-graduação em compliance e autor de diversos textos sobre o tema.
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