Saúde

Defesa do nervo intestinal
Estudo de cientistas da Harvard Medical School em ratos mostra que nervos no intestino previnem infeca§a£o por Salmonella
Por Ekaterian Pesheva - 07/12/2019



Novas pesquisas de cientistas da Harvard Medical School descobriram que os nervos do intestino de ratos não apenas sentem a presença de  Salmonella,  mas ativamente protegem contra a infecção por essa bactanãria perigosa, implantando duas linhas de defesa.

O estudo, publicado hoje na Cell, lana§a sob uma nova luz a visão cla¡ssica do sistema nervoso como um mero ca£o de guarda que identifica o perigo e alerta o corpo para sua presena§a. Os resultados mostram que, interferindo diretamente na capacidade de Salmonella de infectar os intestinos, o sistema nervoso éum detector de perigo e um defensor contra ele.

"Nossos resultados mostram que o sistema nervoso não éapenas um sistema simples de sensor e alerta", disse o neuro-imunologista  Isaac Chiu , investigador principal do estudo e professor assistente de imunologia no Instituto Blavatnik na Harvard Medical School. “Descobrimos que as células nervosas no intestino va£o acima e além . Eles regulam a imunidade intestinal, mantem a homeostase intestinal e fornecem proteção ativa contra infecções. ”

Especificamente, os experimentos revelam que os neura´nios sensa­veis a  dor embutidos no intestino delgado e embaixo das células, chamados de adesivos de Peyer, são ativados pela presença de Salmonella , uma bactanãria transmitida por alimentos responsável por um quarto de todas as doenças diarranãicas bacterianas no mundo. Uma vez ativados, os nervos usam duas ta¡ticas defensivas para impedir que o inseto infecte o intestino e se espalhe pelo resto do corpo. Primeiro, eles regulam as portas celulares que permitem que microorganismos e várias substâncias entrem e saiam do intestino delgado. Segundo, eles aumentam o número de micróbios intestinais protetores chamados SFB (bactanãrias filamentosas segmentadas), que fazem parte do microbioma no intestino delgado.

As bactanãrias nos irritam
Sob condições normais, os adesivos de Peyer - aglomerados de tecido linfa¡tico e imunológico encontrados exclusivamente na parede do intestino delgado - examinam o ambiente, provam substâncias e determinam o que pode entrar no intestino. Para desempenhar essa função, os adesivos de Peyer são preenchidos com células microfoldadas, ou células M, que são canais celulares que abrem e fecham para regular o influxo de substâncias e microorganismos no intestino. As células M são os principais pontos de entrada que a salmonela  e outras bactanãrias perigosas exploram para invadir o intestino delgado. Para isso, a   bactanãria Salmonella injeta nos fatores de transcrição intestinal que estimulam as células intestinais a se tornarem células M. Em seguida,  Salmonella trava nos açúcares situados no topo das células M - os portaµes celulares - e usa seus tenta¡culos para sustentar os portaµes. A bactanãria então se move para o intestino.

Para entender o papel dos neura´nios intestinais sensa­veis a  dor na proteção contra infecções, os pesquisadores compararam como os ratos com e sem eles reagiram a Â  Salmonella . Um grupo de camundongos tinha neura´nios intestinais intactos, outro grupo teve esses neura´nios geneticamente desativados ou exclua­dos, e ainda outro grupo os teve quimicamente desativados.

Experimentos mostraram que, na presença de  Salmonella , os neura´nios do intestino disparam ao liberar um neuroqua­mico chamado CGRP, que diminui a diferenciação de células M, reduzindo assim o número de pontos de entrada que  Salmonella  pode usar. Além disso, os experimentos mostram que os neura´nios intestinais lana§am outra forma de defesa. Ao liberar o CGRP, eles aumentam a presença de micróbios SFB - microorganismos que, entre outras funções benanãficas, também protegem contra a   invasão de Salmonella . Precisamente, como eles fazem isso, ainda não estãoclaro, mas Chiu e seus colegas dizem que um mecanismo plausa­vel pode ser que o SFB use seus pequenos ganchos para se prender a  parede intestinal e formar um revestimento repelente que protege as bactanãrias causadoras de doena§as.

Ambos os mecanismos de defesa funcionavam de maneira confia¡vel em camundongos com neura´nios intestinais intactos. Nãoéassim, poranãm, em animais que carecem desses neura´nios intestinais. De fato, bia³psias intestinais de camundongos com neura´nios inativados mostraram as manchas de Peyer mais densamente infiltradas por  Salmonella  a uma taxa maior do que os animais com neura´nios intactos. Os animais deficientes em neura´nios também tinham menos micróbios protetores SFB em suas entranhas. Nãoéde surpreender que esses camundongos adoeceram de  Salmonella  a uma taxa maior e apresentavam uma doença mais disseminada do que os camundongos com fibras nervosas intactas.

“Descobrimos que as células nervosas no intestino va£o acima e além . Eles regulam a imunidade intestinal, mantem a homeostase intestinal e fornecem proteção ativa contra infecções”.


- Isaac Chiu, investigador principal

"Esta¡ ficando cada vez mais claro que o sistema nervoso interage diretamente com organismos infecciosos de várias maneiras para afetar a imunidade", disse Chiu. "As bactanãrias literalmente nos da£o nos nervos."

As descobertas estãoalinhadas com pesquisas anteriores do grupo de Chiu, mostrando uma poderosa interação de três vias entre infecção e sistema nervoso e imunológico. Mas, em contraste com as novas descobertas, o trabalho anterior mostrou que o sistema nervoso pode, a s vezes, ser explorado por organismos infecciosos em proveito pra³prio. Por exemplo, a pesquisa anterior de Chiu  descobriu que os nervos nos pulmaµes podem alterar a resposta imune em infecções pulmonares graves com a bactanãria  Staphylococcus aureus,  comumente conhecida como estafilococo. Em outro  estudo , a equipe de Chiu descobriu que a bactanãria que pode causar doenças devoradoras de carne sequestra os nervos como uma maneira de amortecer as defesas imunola³gicas e enfraquecer as defesas do corpo.

Um repertório diversificado

As novas descobertas aumentam o conhecimento, mostrando que o sistema nervoso tem um repertório muito mais amplo do que sinalizar para e a partir do cérebro.

"Nossas descobertas ilustram uma importante conversa cruzada entre o sistema nervoso e o sistema imunológico", disse a primeira autora do estudo, Nicole Lai, pesquisadora em imunologia no laboratório de Chiu. "a‰ claramente uma estrada bidirecional com os dois sistemas enviando mensagens e influenciando-se mutuamente para regular as respostas de proteção durante a infecção".

De fato, o intestino contanãm tantos nervos que costuma ser chamado de segundo cérebro. Como um sistema de alerta projetado para alertar o corpo sobre ameaa§as iminentes, o sistema nervoso age ultra-ra¡pido. Assim, as novas descobertas, disseram os pesquisadores, sugerem que a evolução aproveitou esse recurso para maior proteção.

"Se vocêpensar bem, o envolvimento do sistema nervoso na imunidade éuma maneira evolutivamente inteligente de proteger o intestino da infecção, redirecionando um recurso existente", disse Chiu.

Os pesquisadores dizem que suas descobertas também podem ajudar a explicar observações anteriores, mostrando que o uso de opioides - que silenciam fibras nervosas sensa­veis a  dor - e outras drogas moduladoras de nervos podem tornar as pessoas mais propensas a infecções.

"Se vocêreduzir a sinalização nervosa em um esfora§o para reduzir a dor, pode estar inadvertidamente diminuindo suas habilidades de proteção", disse Chiu. "Nossas observações apa³iam essa idanãia."

A interação entre os neura´nios intestinais e as células M de gatekeeper representa uma área propa­cia para pesquisas futuras, disse a equipe, porque as células M - as portas moleculares do intestino delgado - também são exploradas por outros organismos que causam doenças humanas graves, incluindo a bactanãria  E. coli, Shigella  e  Yersinia,  bem como pra­ons, aglomerados auto-propaga¡veis ​​de protea­na dobrada que podem causar condições neurodegenerativas raras, mas universalmente fatais.

Os resultados também apontam para uma possí­vel via terapaªutica que envolve a modulação da sinalização nervosa para aumentar a imunidade intestinal ou a inflamação intestinal.

"A idanãia seria que, se de alguma forma pudanãssemos estimular esses neura´nios intestinais protetores ou imitar sua atividade com uma droga, podera­amos ativar a resposta imune e aumentar a capacidade do organismo de combater infecções", disse Chiu.

Outros pesquisadores inclua­ram Melissa Musser, Felipe Pinho-Ribeiro, Pankaj Baral, Amanda Jacobson, Pingchuan Ma, David Potts, Zuojia Chen, Donggi Paik, Salima Soualhi, Yiqing Yan, Aditya Misra, Kaitlin Goldstein, Valentina Lagomarsino, Anja Nordstrom, Kisha Sivanathan, Antonia Wallrapp, Vijay Kuchroo, Roni Nowarski, Michael Starnbach, Hailian Shi, Neeraj Surana, Dingding An, Chuan Wu, Jun Huh e Meenakshi Rao.

Este trabalho foi financiado pelos Institutos Nacionais de Saúde concedidos DP2AT009499 e K08 AI108690, Instituto Nacional de Alergia e Doena§as Infecciosas R01AI130019, NIH, concessão R01 DK110559, Iniciativa Chan-Zuckerberg, Harvard Digestive Disease Center, Instituto Nacional de Diabetes e Doena§as Digestivas e Renais (concessão K08 DK110532), Sociedade Nacional de Esclerose Maºltipla (praªmio de transição de carreira TA3059-A-2), e Whitehead Scholar e Translating Duke Health Scholar.

 

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