Saúde

Covid-19: Unicamp e USP avana§am na elaboração de vacina por spray nasal
Fase de escalonamento de produção teve ini­cio na Unicamp e expectativa éque testes em humanos comecem no ini­cio de 2021
Por Liana Coll - 08/09/2020


Reprodução

Cientistas da USP e da Unicamp estãodesenvolvendo uma vacina por spray nasal contra a Covid-19. A vacina traz diversas vantagens em relação ao manãtodo injeta¡vel, incluindo a atuação direta na mucosa nasal, que éuma das principais portas de entrada do novo coronava­rus no organismo humano. Dessa forma, a perspectiva éque acontea§a a eliminação do va­rus já no canal de entrada. A vacina estãoem fase de testes pré-clínicos, em camundongos, e segue para a etapa de escalonamento da produção, realizada na Unicamp.

O escalonamento da produção, conforme a professora Laura de Oliveira Nascimento, da Faculdade de Ciências Farmacaªuticas (FCF) da Unicamp, que encabea§a esse processo, éo momento em que se busca testar se a vacina, desenvolvida em escala laboratorial, pode ser produzida em maior escala, processo que éessencial para uma vacina que se pretende lana§ar comercialmente. “Existem hoje diversas formulações de vacinas eficazes publicadas e em escala laboratorial. Mas nossabemos que o escalonamento nem sempre évia¡vel e por esse motivo diversas vacinas não são comercializadas, por não serem escalona¡veis”, elucida.

A concepção da vacina da USP e da Unicamp, diz Laura, desde o princa­pio, incorporou a preocupação com uma formulação que possa ser aplica¡vel para a população. Para a pesquisadora, a experiência do lider da equipe, o professor da USP Marco Antonio Stephano, foi fundamental na concepção de produção industrial. “Desde o começo, ele e a equipe estãoproduzindo uma formulação que possa ser produzida de maneira rápida e em larga escala”, observa.

O desafio nessa fase do escalonamento, segundo a professora, émanter as caracteri­sticas fa­sico-químicas da vacina, que utiliza uma formulação baseada em polímeros nanoestruturados, ou seja, que tem uma faixa de tamanho especa­fica em escala nanomanãtrica. “Para que isso continue tanto em 10 ml, que équando fazemos uma escala laboratorial para testar em camundongos, quanto em 10 litros, para que se possa manter as caracteri­sticas fa­sico-químicas dessa vacina épreciso estudar o escalonamento. E éisso que o time da Unicamp vai ajudar: fazer com que essa vacina possa ser produzida em maior quantidade, mantendo a qualidade que o professor Marco desenvolveu em escala laboratorial”, explica.

Tecnologias aplicadas e etapas de produção da vacina

O imunologista e professor da Faculdade de Ciências Farmacaªuticas da USP, Marco Antonio Stephano, coordena a equipe responsável pela formulação da vacina e pontua os passos no desenvolvimento da vacina. A primeira etapa foi a produção do anta­geno, que nesse caso éuma molanãcula proteica que estimula o sistema imune a combater o va­rus. Apa³s, acontece o escalonamento da produção dessa substância, para que seja possí­vel desenvolver a vacina.

Para aumentar a entrega de anta­genos da fa³rmula na mucosa, os pesquisadores utilizam a nanotecnologia. “Com a nanotecnologia nosconseguimos aumentar a concentração de anta­genos associados aspartículas carreadoras, pois quando vocêdiminui o dia¢metro de uma circunferaªncia, vocêaumenta a proporção da área superficial em relação ao volume dessa parta­cula e o número departículas com a mesma quantidade de pola­mero.  Então vocêacaba aumentando a área superficial total que o anta­geno pode se associar e ser exposto ao organismo”, afirma Marco Antonio.

Além disso, como o pola­mero (molanãcula que compaµe o anta­geno) utilizado émuco-aderente, ele fica por tempo suficiente nas mucosas nasais, fazendo com que as células o levem para o sistema imunológico e o estimulem a produzir dois tipos de anticorpos contra o novo coronava­rus.  “Essa propriedade muco-aderente do pola­mero faz com que ele fique duas ou três horas depositado na mucosa, o que ésuficiente para que os macra³fagos e as células especializadas capturem esses anta­genos. Uma vez capturados, eles são processados, va£o para o sistema imunológico e produzem dois tipos de anticorpo: o IgG, que fica na circulação sanguínea, e IgA secretora que fica sobre a mucosa”, explana.

Vantagens da vacina por spray nasal

Uma das vantagens da vacina por spray, quando comparada com as vacinas injeta¡veis, éjustamente o fato de que elas estimulam também a produção da IgA secretora. Dessa maneira, protege-se assim o principal meio de entrada do va­rus no corpo: as mucosas das vias aanãreas. Conforme estudo recente relativo a  produção de outra vacina por spray nasal, viu-se que por esse manãtodo elimina-se o RNA viral no nariz, o que não foi observado na vacina injeta¡vel.

Assim, apesar de ambas as vacinas desse estudo serem protetoras, segundo a professora Laura, a vacina por spray nasal teve a vantagem de eliminar completamente o va­rus, e já na porta de entrada. “Foi demonstrada essa vantagem de proteger a pessoa na entrada viral, então vocêconsegue ter imunidade na mucosa nasal, o que faz com que se impea§a a entrada viral e uma possí­vel residaªncia por curto tempo do va­rus, inibindo contaminação de outras pessoas”.

A pesquisadora também observa que a vacina por spray émais fa¡cil de ser aplicada, dispensando treinamento especa­fico. Por não necessitar de agulha, também resolve possa­veis problemas de fornecimento de material. “Já fizeram ca¡lculos de que se todos tivessem que ser vacinados ao mesmo tempo, não teria agulha para fornecer para todos nós, então temos essa vantagem”, diz.

Ela ainda destaca o fato de ser uma vacina inovadora, via¡vel economicamente e realizada com tecnologia 100% brasileira, reduzindo dependaªncia de instituições de outrospaíses. Por fim, observa Laura, muitas pessoas tem medo da aplicação injeta¡vel. Assim, na administração por via nasal, hámais adesão a  vacinação.

Perspectivas para a vacina

Uma das principais preocupações no contexto da pandemia éa corrida para a disponibilização de uma vacina. No caso da vacina por spray nasal, os professores explicam que os ensaios pré-clínicos, aqueles realizados com animais, devem ser repetidos em outubro. A perspectiva éque atéo final de novembro os resultados sejam submetidos ao Comitaª de a‰tica em Pesquisa, para que então sejam aprovados os testes clínicos em humanos e estes sejam iniciados em janeiro ou fevereiro.

Com os resultados clínicos, cabe a  Agência Nacional de Vigila¢ncia Sanita¡ria (Anvisa) determinar se a vacina tem qualidade e se laboratórios tem condições técnicas de formular e fazer. "Isso acontece para qualquer vacina, seja as que estãochegando em esta¡gio 3, seja a nossa que estãosendo desenvolvida.  A Anvisa éo órgão que protege o consumidor, não a indústria nem a universidade, então émuito importante ter essa segurança”, lembra Marco Antonio.

Apa³s os testes em humanos, a ideia éque a tecnologia seja apoiada por uma empresa com capacidade de produção em larga escala. Para isso, o grupo estuda os parametros cra­ticos de produção. “Queremos que a empresa possa realmente produzir e esse trabalho não simplesmente virar mais um artigo, como temos muitos artigos sobre vacina, que são importantes para ter embasamento cienta­fico, mas que não viram um produto que pode ajudar a população”, avalia o pesquisador.

Apesar das perspectivas, eles salientam que dependem de uma sanãrie de fatores e principalmente de como seráa resposta imunola³gica dos testes em animais. “Tudo depende dos testes. Se os testes rapidamente nos derem uma resposta positiva, o cronograma seráfacilmente seguido”, frisa a professora Laura.

 

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