Saúde

SARS-CoV-2 precisa de colesterol para invadir células e formar mega células
O colesterol, o composto ceroso mais conhecido por obstruir as artanãrias, ajuda o va­rus a abrir as células e deslizar para dentro, relata o laboratório Clifford Brangwynne, investigador do Howard Hughes Medical Institute.
Por Meghan Rosen - 23/01/2021


Os pesquisadores projetaram células para transportar uma protea­na (verde) do SARS-CoV-2 ou seu alvo humano ACE2 (magenta). Quando perto uma da outra, as membranas das células se fundiram. Os pesquisadores acreditam que um processo semelhante permite que o va­rus penetre nas células. Crédito: D. Sanders et al./bioRxiv.org

Pessoas que tomam medicamentos para baixar o colesterol podem se sair melhor do que outras se contraa­rem o novo coronava­rus. Um novo estudo mostra o porquaª: o va­rus depende da molanãcula de gordura para passar pela membrana protetora da canãlula.

Para causar COVID-19, o va­rus SARS-CoV-2 deve forçar seu caminho nas células das pessoas - e precisa de um caºmplice. O colesterol, o composto ceroso mais conhecido por obstruir as artanãrias, ajuda o va­rus a abrir as células e deslizar para dentro, relata o laboratório Clifford Brangwynne, investigador do Howard Hughes Medical Institute.

Sem colesterol, o va­rus não pode passar furtivamente pela barreira protetora de uma canãlula e causar infecção, a equipe escreve em um preprint publicado em bioRxiv.org em 14 de dezembro de 2020. O trabalho, que recriou o esta¡gio inicial da infecção em células cultivadas em laboratório, foi ainda não passou pelo processo de verificação cienta­fica de revisão por pares.

"O colesterol éparte integrante das membranas que circundam as células e alguns va­rus, incluindo o SARS-CoV-2. Faz sentido que seja tão importante para a infecção", diz Brangwynne, engenheiro biofa­sico da Universidade de Princeton.

A descoberta pode ser a base dos melhores resultados de saúde observados em pacientes com COVID-19 que tomam medicamentos para baixar o colesterol conhecidos como estatinas, acrescenta. Embora os cientistas ainda não tenham estabelecido o mecanismo responsável, este estudo e outro publicado no outono passado sugerem que as drogas impedem que o SARS-CoV-2 entre nas células negando-lhe o colesterol.

Esta descoberta da importa¢ncia do colesterol pode ajudar os cientistas a desenvolver novas medidas provisãorias para tratar o COVID-19 atéque a maioria das pessoas seja vacinada, diz Brangwynne. O trabalho também pode lana§ar luz sobre uma caracterí­stica estranha da doena§a: a formação de células gigantes compostas encontradas nos pulmaµes de pacientes com COVID-19. Em seus experimentos, os cientistas viram mega células semelhantes emergirem sob o microsca³pio.

Imitando uma infecção viral

Em tempos normais, a equipe de Brangwynne estuda as forças físicas que organizam as moléculas dentro das células. Mas na primavera de 2020, seu laboratório, como muitos outros em todo o mundo, mudou de foco, treinando sua experiência biológica em SARS-CoV-2. Eles começam a investigar como as protea­nas virais e humanas interagem e como essa interação permite que o SARS-CoV-2 entre nas células. “Nãosomos um laboratório de virologia, nunca trabalhamos neste espaço antes, então comea§amos a pensar sobre as ferramentas e abordagens que desenvolvemos que podera­amos usar”, diz ele.
 
O laboratório de Brangwynne costuma trabalhar com células cultivadas em laboratório. Para imitar a infecção por SARS-CoV-2, sua equipe projetou tais células para exibir uma de duas molanãculas, a "protea­na spike" viral ou a protea­na humana ACE2. (Para causar uma infecção, o va­rus deve fundir sua membrana a  membrana de uma canãlula. Este processo comea§a quando as protea­nas de pico encontram seu alvo celular, ACE2.)

No laboratório, os pesquisadores observaram a interação de células cultivadas em laboratório com essas protea­nas. Primeiro, minaºsculos tenta¡culos emergiram de células com ACE2 e se fixaram em protea­nas de pico em células próximas. Nesses pontos, as duas membranas celulares se fundiram e as aberturas se formaram, permitindo que o conteaºdo das células se misturasse. Eventualmente, as duas células se fundiram - semelhante a como os cientistas esperam que o va­rus se funda com uma canãlula para infecta¡-lo.

Os pesquisadores, incluindo David Sanders, Chanelle Jumper e Paul Ackerman, de Princeton, tentaram interromper essa fusão celular. Usando um sistema automatizado, eles testaram os efeitos de cerca de 6.000 compostos, bem como mais de 30 ajustes na protea­na do pico. Esses experimentos e outros sugeriram que, se a membrana do SARS-CoV-2 carece de colesterol, o va­rus não pode entrar na canãlula-alvo.

Esta não éa primeira evidência envolvendo o colesterol. O estudo anterior, feito por um grupo da Universidade da Califa³rnia, em San Diego, descobriu que a resposta imunola³gica do corpo ao va­rus produz um composto que esgota o colesterol - mas, neste caso, da própria membrana da canãlula, não do va­rus.

"O colesterol foi muito bem estudado como um fator importante em um grande número de infecções virais", diz Peter Kasson, um cientista da Universidade da Virga­nia que estuda os mecanismos fa­sicos das doenças virais. "O interessante éque o papel do colesterol na entrada viral varia muito entre os va­rus." Nãoestãoclaro exatamente como o colesterol ajuda a SARS-CoV-2, mas entender esse processo pode oferecer pistas sobre a biologia da infecção, diz Kasson, que não esteve envolvido na pesquisa.

O aparente efeito benanãfico das estatinas também se estende a outras infecções virais. Algumas pesquisas sugerem que essas drogas prejudicam o va­rus da gripe, privando-o de colesterol, diz Kasson. Mas essa pode não ser a única maneira que os medicamentos podem alterar o curso das infecções virais , diz ele. "a‰ um pouco complicado porque as estatinas também modificam a resposta imunola³gica."

Mega células misteriosas

Enquanto os experimentos de Brangwynne eram executados, sua equipe notou algo estranho. As células continuaram a engolir umas a s outras, espalhando seu conteaºdo como ovos quebrados em uma tigela. As células compostas, conhecidas como sinca­cios, que apareceram ao microsca³pio se assemelham a s encontradas em tecidos sauda¡veis, como maºsculos e placenta, e em algumas doenças virais.

"As pessoas já sabiam que o va­rus COVID-19 criara¡ sinca­cios, mas os pesquisadores foram capazes de visualizar o processo lindamente", disse Jennifer Lippincott-Schwartz, lider de grupo saªnior no Campus de Pesquisa Janelia do HHMI, que não estava envolvida na pesquisa. "A fusão canãlula-canãlula éem si uma área muito pouco estudada na biologia."

Os experimentos provavelmente ilustram como as mega células encontradas nos pulmaµes dos pacientes se formam, diz ela. "A formação de sinca­cios pode ser muito prejudicial no caso do COVID, onde pode destruir os tecidos pulmonares e levar a  morte."

Brangwynne diz que ainda não estãoclaro se os sinca­cios desempenham ou não um papel importante na progressão do COVID-19. Mas, escreve sua equipe, a descoberta da contribuição do colesterol pode ajudar os cientistas a combater a doena§a. "Nossas descobertas ressaltam a utilidade potencial das estatinas e outros tratamentos [semelhantes]."

 

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