Professor da Unesp identifica doença que acomete pescadores que passam muito tempo dentro da a¡gua
Pescadores na praia da Picinguaba, em Ubatuba, litoral norte de Sa£o Paulo. Foto: Vidal Haddad Junior/Unesp.
Uma doença que ataca principalmente pescadores de águadoce e salgada foi descrita pela primeira vez em um estudo liderado por Vidal Haddad Junior, professor da Faculdade de Medicina de Botucatu (FMB), da Unesp. A enfermidade se caracteriza pelo aparecimento de pequenas inflamações assanãpticas (sem infecção por agentes externos) nas pernas e pelo aparecimento de pontos de pus, causadas pela obstrução dos bulbos por onde nascem os pelos, semelhante a uma foliculite.
Vidal explica que a foliculite assanãptica de pescadores atinge principalmente esses trabalhadores que, em geral, passam muito tempo com o corpo na águado mar ou de rio para limpar a rede de pesca, por exemplo. O professor trabalha hámais de 30 anos com essa categoria de profissionais e foi a partir dessa vivaªncia que identificou a patologia.
“Essa éuma doença especafica da atividade de pesca. Uma vez que ela não inviabiliza o trabalho, o pescador não procura o tratamento e [ela] acaba se tornando uma doença culturalâ€, explica o professor. “Essa doença éprovavelmente tão antiga quanto a própria pescaâ€.
Inflamação por obstrução
Publicado no International Journal of Occupational and Environmental Medicine em coautoria com pesquisadores da Unesp, da Pontifacia Universidade do Parana¡ (PUC-PR) e da Universidade do Vale do Itajaa (Univali), o artigo reporta dois casos de indivíduos sauda¡veis que apresentaram as mesmas alterações dermatola³gicas: um pescador do Rio Tietaª da regia£o de Botucatu, portanto de águadoce, e outro da praia da Picinguaba, em Ubatuba, no litoral norte de Sa£o Paulo.
Segundo o docente da FMB, a inflamação dos folaculos ocorre porque a proteana queratina presente na pele amolece em contato com a águae obstrui a saada do pelo, formando pontos brancos de pus. O aspecto ésemelhante ao da foliculite, mas não se trata de uma infecção por bactanãrias ou fungos e sim de uma inflamação. A incidaªncia aumenta conforme a frequência com que os pescadores precisam ir ao mar e diminui assim que passam algum período sem entrar na a¡gua.
Perspectivas do estudo
Especialista em dermatologia, o professor Vidal começou seu trabalho com pescadores artesanais ainda em seu doutorado, quando pesquisou acidentes provocados por animais marinhos no litoral de Sa£o Paulo, ainda em 1999. Tendo atuado ao longo de décadas com esses profissionais, o pesquisador relata ter visto dezenas de casos de pescadores com o quadro de inflamação nos folaculos da perna, e hálgum tempo estava querendo descrever a doença em um artigo.
Com a suspensão das pesquisas em campo e das visitas a s comunidades de pescadores por conta da pandemia de Covid-19, o docente aproveitou para se dedicar a redação do material. A expectativa do professor da Unesp éque a descrição da doença estimule pesquisas sobre formas de tratamento, prevenção ou um estudo estatastico sobre a prevalaªncia da enfermidade nas populações de pescadores.
“A descrição dessa doença chama a atenção para uma classe que envolve cerca de um milha£o de trabalhadores, mas que continua completamente desassistida. Acho que a Universidade pode colaborar para jogar luz sobre essa populaçãoâ€, sugere o professor.