Saúde

Deficiências do sistema imune explicam parte dos casos graves de covid-19
Anticorpos que atacam células de defesa e mutaa§a£o genanãtica rara contribuem para o agravamento da doença atéem jovens. Cientistas buscam tratamentos específicos para esses alvos
Por USP - 12/09/2021






O consãorcio internacional COVID Human Genetic Effort, composto de mais de 150 cientistas, com a participação de pesquisadores do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP, identificou duas causas genanãticas para o agravamento de casos da covid-19. Publicados na revista cienta­fica Science Immunology no maªs de agosto, os estudos mostram que autoanticorpos (anticorpos dirigidos para células e tecidos do pra³prio corpo) comprometem a atuação do sistema imunológico e são responsa¡veis por cerca de 14% dos casos cra­ticos de covid-19 e quase 20% do total de casos fatais. Além disso, uma mutação genanãtica encontrada em 1,8% dos homens explica a presença de infecção grave em alguns jovens.

O primeiro estudo destaca um erro no sistema imune que leva a  produção de autoanticorpos que neutralizam e destroem os interferons tipo 1 osglicoprotea­nas com alta atividade antiviral importantes para o combate a infecções. “O organismo comea§a a combater o va­rus e aparece um anticorpo que ‘puxa o freio de ma£o’ da sua resposta imunola³gica. a‰ como nadar contra a correnteza”, explica o médico e pesquisador Antonio Condino-Neto, membro do consãorcio e coordenador do Laborata³rio de Imunologia Humana do ICB.

“Os dados apontam que alguns indiva­duos, não apenas idosos, podem ter suscetibilidade genanãtica a  doena§a. E mostram por que algumas pessoas são mais resistentes e outras não, independentemente da idade osembora seja comum que o sistema imune fique enfraquecido com o envelhecimento. A descoberta fortalece nossa tese de que o problema dos casos graves não éapenas o va­rus, mas o sistema imune do indiva­duo”,

destaca o pesquisador.

Esse fena´meno foi observado em 13,6% dos pacientes com covid-19 grave e em 21% dos pacientes com mais de 80 anos. Esses autoanticorpos também foram detectados em 18% dos 1.124 pacientes que morreram. Para chegar a esses resultados, foram coletadas amostras de aproximadamente 3.600 pacientes de hospitais ao redor do mundo para sequenciamento genanãtico.

“Os dados apontam que alguns indiva­duos, não apenas idosos, podem ter suscetibilidade genanãtica a  doena§a. E mostram por que algumas pessoas são mais resistentes e outras não, independentemente da idade osembora seja comum que o sistema imune fique enfraquecido com o envelhecimento. A descoberta fortalece nossa tese de que o problema dos casos graves não éapenas o va­rus, mas o sistema imune do indiva­duo”, destaca o pesquisador.

Mutação genanãtica osJá o segundo estudo detalha o papel de uma mutação no gene TLR7 recessivo, ligado ao cromossomo X, que contribui para o desenvolvimento da covid-19 grave. Esse gene regula o toll-like 7, um receptor intracelular que lida com as respostas virais, reconhecendo padraµes e ativando mecanismos para atacar o va­rus. Com a mutação no gene, o receptor não atua conforme o esperado contra o coronava­rus, que acaba causando uma infecção grava­ssima.

Extremamente rara, a deficiência foi identificada em 1,8% dos homens com menos de 60 anos que tiveram pneumonia cra­tica inexplica¡vel por conta da covid-19 osincluindo dois meninos com idades entre 7 e 12 anos. Para isso, foram analisados 1.102 pacientes do sexo masculino entre seis meses e 99 anos de idade.

Possa­veis terapias

Os cientistas já tem uma hipa³tese de tratamento para contornar essas suscetibilidades. No pra³ximo ano, seráfeito um ensaio cla­nico internacional com o interferon beta, composto utilizado para o tratamento de doenças autoimunes, como a esclerose maºltipla. Trata-se de um medicamento com longa experiência de uso na cla­nica, o que ajudaria a acelerar os testes atéa sua aprovação. Já se sabe, por exemplo, o regime de doses para aplica¡-lo de maneira segura, assim como os seus possa­veis efeitos adversos.

“Realizamos testes in vitro e o medicamento funcionou para corrigir o problema apontado no primeiro estudo, dos autoanticorpos. Ele atua ativando os mecanismos da imunidade inata, para barrar o va­rus logo no começo, repondo os interferons que o sistema imune da pessoa estãotentando destruir”, afirma Condino-Neto. “Imagine que o sistema imune desses pacientes éuma rua cheia de buracos e lombadas: o medicamento iria recapear seu asfalto”, complementa.

No caso das mutações no gene TLR7, ainda são necessa¡rias mais pesquisas para trazr uma estratanãgia terapaªutica. “Uma de nossas melhores hipa³teses éo pra³prio interferon beta, porque quando o receptor toll-like 7 não funciona, ele não consegue deflagrar os mecanismos de sa­nteses de citocinas. Então, deve faltar interferon beta nesse indiva­duo. Mas ainda precisamos comprovar isso”, detalha o professor.

Pra³ximos passos

O grupo também seguira¡ buscando novos genes que impactem no agravamento da covid-19. No ICB, o pesquisador Condino-Neto e sua equipe, composta pela doutoranda Lucila Barreto e pela pa³s-doutora Leta­cia Gomes de Pontes, coletam amostras de pacientes e geram dados de sequenciamento genanãtico, detalhando não são a atuação dos autoanticorpos mas também os perfis das protea­nas. “Teremos dados de cerca de 120 pacientes brasileiros. Ao terminarmos de gerar e analisar essas informações, poderemos fazer estudos de meta-análise, cruzando-os com outras bases de dados”, afirma.

Além da equipe do ICB, outros pesquisadores brasileiros também participam do consãorcio, como Carolina Prando, do Hospital Pequeno Pra­ncipe de Curitiba, a professora Mayana Zatz, do Instituto de Biociências (IB) da USP, além de colaboradores da Faculdade de Medicina (FM) da USP.

 

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