Talento

Pesquisadores da Unicamp tem projeto selecionado por fundação do Facebook
O projeto da Unicamp e do INCA foi o aºnico selecionado da Amanãrica Latina e propaµe uma análise dos processos inflamata³rios que ocorrem nos tecidos adiposos de pessoas obesas e não obesas.
Por Felipe Mateus - 15/05/2020

Um projeto de pesquisa apresentado pelos professores Marcelo Mori e Pedro Moraes-Vieira, do Instituto de Biologia (IB) da Unicamp, e por Mariana Boroni, pesquisadora do Instituto Nacional do Ca¢ncer (INCA), foi um dos 29 selecionados no mundo pela Chan Zuckerberg Iniciative (CZI), fundação criada por Mark Zuckerberg, fundador do Facebook, e sua esposa, a pediatra Priscilla Chan, que incentiva a ciência e ações educacionais e filantra³picas. A chamada selecionou projetos de pesquisas relacionadas a processos inflamata³rios no organismo humano. O projeto da Unicamp e do INCA foi o aºnico selecionado da Amanãrica Latina e propaµe uma análise dos processos inflamata³rios que ocorrem nos tecidos adiposos de pessoas obesas e não obesas. 

"Foi uma chamada extremamente competitiva, conhea§o grupos internacionais que mandaram projetos forta­ssimos e não foram selecionados. Aqui mesmo no Brasil, concorremos com grupos que nos fazia pensar o quanto seria difa­cil", releva Pedro Moraes-Vieira. A seleção era direcionada a projetos interdisciplinares que envolvessem atétrês pesquisadores principais. Segundo informações da CZI, 80 pesquisadores foram contemplados, a maior parte deles dos Estados Unidos e Europa. Cada projeto aprovado recebera¡ o financiamento de 175 mil da³lares por pesquisador, totalizando o investimento de até525 mil da³lares por projeto. Ao todo, a fundação deve investir 14 milhões de da³lares em estudos que sera£o realizados por dois anos, a partir de setembro de 2020.

Mariana Boroni (INCA), Pedro Moraes-Vieira e Marcelo Mori (IB-Unicamp) integram
projeto selecionado

"Estamos inseridos em um grupo seleto, ésão olhar para as universidades que foram selecionadas. a‰ bom ter a Unicamp ao lado delas", comenta Marcelo Mori. Os professores explicam também que o projeto integra ainda as ações da Human Cell Atlas, rede internacional de pesquisas com o objetivo de mapear, descrever e catalogar os diferentes tipos e funções celulares do corpo humano, grupo por meio do qual eles tiveram contato com a chamada da CZI. "A ideia éque os protocolos e dados sejam compartilhados, de forma ana´nima, com diferentes grupos internacionais por meio do Human Cell Atlas e do pra³prio CZI, Assim faremos parte de uma plataforma mundial de análise de single cell", explica Pedro. 

Ana¡lise de 10 mil células, uma a uma

A obesidade desencadeia processos inflamata³rios no corpo humano. Conforme a gordura se acumula nos tecidos adiposos, localizados em diferentes partes do corpo, as células adiposas, chamadas adipa³citos, comea§am a se expandir e chegam a um limite ma¡ximo de sua capacidade de acumular lipa­deos. Quando isso ocorre, háum aumento da quantidade de a¡cidos graxos fora das células. O efeito ta³xico dessas substâncias faz com que células de defesa, chamadas macra³fagos, passem a absorver esses a¡cidos, desencadeando inflamações que podem ser nocivas ao organismo e culminar na chamada sa­ndrome metaba³lica, condição que aumenta os riscos de pacientes desenvolverem doenças carda­acas, diabetes e acidente vascular cerebral (AVC). 

"O que ébonito disso éque agora vamos poder implantar essa plataforma de análise single cell aqui na Unicamp, que éalgo que não tem consolidado no Brasil. Essa vai ser a primeira plataforma de análise single cell e vamos poder abri-la para o uso de outros pesquisadores de todo opaís"

Pedro Moraes-Viera

Por isso, o projeto apresentado pelos professores tem como objetivo principal estudar macra³fagos que atuam nos processos inflamata³rios do tecido adiposo, onde essas células são abundantes. A ideia éque sejam coletadas amostras do tecido adiposo de pessoas obesas e não-obesas, de diferentes partes do corpo, da gordura localizada abaixo da pele (subcuta¢nea) atéa que se acumula nas partes mais profundas do abda´men e envolve alguns órgãos internos (visceral). Para a coleta dessas amostras, a equipe contara¡ com o apoio do professor Elinton Chaim, cirurgia£o-chefe do Ambulata³rio de Cirurgia Baria¡trica do Hospital de Cla­nicas (HC) da Unicamp. 

A inovação que estara¡ presente na pesquisa éo uso da técnica de análise de canãlula única, tecnologia ainda pouco usada no Brasil. Com essa técnica, serápossí­vel verificar as caracteri­sticas de cada canãlula que compaµe uma amostra, tornando a análise mais precisa e permitindo a descoberta de novos grupos celulares e formas com que as células atuam no organismo e interagem entre si. "Antes a gente conseguia fazer isso em uma massa de tecido. Quando faza­amos isso, a gente conseguia uma expressão gaªnica de um grupo de células, mas agora a gente consegue saber o que cada canãlula expressa. Quando conseguimos fazer isso, a gente consegue encontrar mais diferenças individuais entre as células, podendo classifica¡-las em subpopulações que antes não ta­nhamos noção de que existiam. Podemos então olhar para a biologia tecidual com uma resolução muito maior", explica Marcelo Mori. 

Renan Garcia
Imagem de microsca³pio mostra adipa³citos (em verde), células endoteliais (em rosa) e
macra³fagos (em laranja)

No ina­cio, sera£o coletadas amostras do tecido adiposo de poucos pacientes, em torno de três de cada grupo, obesos e não-obesos, e identificados os macra³fagos localizados nesses tecidos. Nessa etapa, cada um dos macra³fagos identificados seráanalisado individualmente, o que resulta em cerca de 10 mil células por amostra. "Na³s podermos pegar esses macra³fagos, isola¡-los e fazer o sequenciamento de canãlula a canãlula de cada um desses tecidos. A gente vai analisar 10 mil células de cada um desses tecidos de forma individualizada, determinar o perfil transcripta´mico individualizado de 10 mil macra³fagos de cada um desses tecidos", comenta Pedro Moraes Vieira. Tudo isso serápossí­vel graças a recursos de bioinforma¡tica, que utilizam inteligaªncia artificial. Depois dessa análise inicial, com base nas caracteri­sticas identificadas das células, serápossí­vel envolver mais participantes no estudo, estabelecendo comparações entre pessoas que apresentam fatores de risco ou não, como diabetes e outras doenças metaba³licas, e também entre homens e mulheres. 

"Sera¡ que algum macra³fago especa­fico tem associação com os na­veis de glicemia da pessoa? Podemos tentar estabelecer essa relação. E conseguimos usar isso como uma plataforma para testar muito mais pacientes. Sera¡ que conseguimos identificar no tecido adiposo um tipo de macra³fago que nos diz se a pessoa tem risco de desenvolver diabetes? A questãodo sexo também, mulheres em geral são mais resistentes a doenças metaba³licas, homens são mais susceta­veis. Sera¡ que existe algum tipo de canãlula que contribui para isso? Essa éa pergunta final que queremos responder", reflete Marcelo.  

Avana§o para as pesquisas nopaís

A participação da Unicamp nos projetos que recebera£o o apoio do CZI devera¡ contribuir também para a internacionalização da universidade e para a atração de pesquisadores para opaís. Além de envolver alunos de graduação e pós-graduação orientados pelos professores, a pesquisa serádesenvolvida em interca¢mbio com outras que integram a chamada. Entre os projetos com os quais a Unicamp ira¡ compartilhar informações obtidas, Marcelo e Pedro citam um dos estudos que sera£o realizados na Universidade Harvard, nos Estados Unidos, e outro que envolve pesquisadores da Alemanha, Israel e Nova Zela¢ndia. 

Outra vantagem éo avanço que a pesquisa trara¡ para os estudos em biologia tecidual realizados nopaís. De acordo com eles, esta seráa oportunidade de ampliar os usos da tecnologia de análise de canãlula única no Brasil, algo que já ocorre em escala mais avana§ada em outrospaíses. "Essa éuma tecnologia revoluciona¡ria, ainda relativamente cara, mas o Brasil ainda éincipiente nessa tecnologia. Quando vamos a congressos internacionais, a gente vaª que ela já estãosendo utilizada. Nãodiria que já érotineira, mas vai se tornar uma rotina. Por que vocêvai analisar um pedaço de tecido complexo, que tem caracteri­sticas diferentes de células, sendo que há capacidade de analisar células únicas desse tecido? A gente estãoatrasado e precisamos correr atrás", explica Marcelo. 

Eles ressaltam que, com o projeto, a Unicamp montara¡ uma plataforma pioneira de análise de single cell (canãlula única) e se tornara¡ referaªncia para outras instituições de pesquisa que tiverem o interesse em colocar a tecnologia em prática . "O que ébonito disso éque agora vamos poder implantar essa plataforma de análise single cell aqui na Unicamp, que éalgo que não tem consolidado no Brasil. Essa vai ser a primeira plataforma de análise single cell e vamos poder abri-la para o uso de outros pesquisadores de todo opaís", comemora Pedro.

 

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