Talento

Comunicar a beleza e complexidade da ciaªncia
Com um doutorado recanãm-formado, Fernanda de Araaºjo Ferreira agora explora o empreendimento cienta­fico atravanãs do jornalismo.
Por Bridget E. Begg - 16/07/2019


“Acho que quando alguém consegue tornar um conceito cienta­fico bonito, explica a s pessoas de fora a ciência como a ciência pode ser bonita. E acho que esse deve ser o objetivo de qualquer escritor de ciências ”, diz Fernanda de Araaºjo Ferreira.
Imagem: Gretchen Ertl

Alguns meses depois do seu doutorado em virologia na Universidade de Harvard, Fernanda de Araaºjo Ferreira sabia que algo não estava certo.

“A pós-graduação foi uma verificação da realidade. Quando vocêescolhe um doutorado, sua vida émapeada para você”, explica ela. “Mas quando eu comecei a faculdade, vi imediatamente as partes irritantes da academia: escrevendo cinco doações e recebendo uma, e os laboratórios sendo fechados por falta de financiamento. E isso parecia muito insta¡vel. ”

Em vez de deixar que essa dina¢mica a desiludisse, Ferreira decidiu canalizar seu entusiasmo pela ciência para a escrita. Apa³s concluir seu doutorado em 2019, ela ingressou no Programa de Pa³s-Graduação em Redação Cienta­fica do MIT (GPSW) atravanãs do MIT Comparative Media Studies / Writing - uma decisão que a abriu para a ciência de uma maneira totalmente diferente.

"Por mais que eu adorasse fazer pesquisas, um doutorado leva vocêa saber absolutamente tudo o que hápara saber sobre absolutamente nada", diz ela. "Ha¡ tanta ciência legal por aa­, mas a  medida que vocêavana§a para um doutorado, ela fica cada vez mais estreita." Uma carreira no jornalismo cienta­fico, ela acrescenta, éuma maneira de abrir isso novamente. "E ainda posso escrever sobre va­rus, mas também posso escrever sobre outras áreas!"

O GPSW éum programa de mestrado de um ano que se concentra no jornalismo cienta­fico atravanãs de uma variedade de ma­dias, desde impressão a podcasts e visualização de dados. O programa consiste em seis cursos obrigata³rios e dois eletivos, além de uma tese criativa de não-ficção de 6.000 palavras, na qual os candidatos demonstram sua capacidade de se envolver com um ta³pico cienta­fico de diversos pontos de vista - hista³rica, cultural e cientificamente.

“Acho que quando alguém consegue tornar um conceito cienta­fico bonito, isso explica a s pessoas de fora da ciência como a ciência bonita pode estar. E esse, acho eu, deve ser o objetivo de qualquer escritor de ciências. ”


Ferreira toma um cuidado especial para incorporar significantes culturais em todos os seus escritos cienta­ficos. Ao escrever sobre o bobo Tay , inadvertidamente trollish da Microsoft , Ferreira, por exemplo, Ferreira abriu com ELIZA, um antigo bate-papo com o nome de Eliza Doolittle, protagonista da pea§a de Pygmalion, de George Bernard Shaw. a‰ a maneira de Ferreira lembrar aos leitores que a ciência éum empreendimento profundamente humano, entrelaa§ado com a cultura da qual emerge.

Mantendo a ciência no jornalismo

Em retrospecto, ela admite que a mudança de Ferreira da academia para o jornalismo cienta­fico não étão surpreendente. Antes de se formar em biologia, ela considerou estudar escrita e história. Logo antes da pós-graduação, ela se lembra de ter visto um erro em um artigo de um jornal local brasileiro. “Confundiu os agentes do Na­vel 4 de Biossegurança, que são uma mistura de va­rus e bactanãrias, agindo como se todos os agentes do BSL4 fossem va­rus. E pensei: se eles estavam cometendo esse erro muito bobo sobre va­rus, que outros erros estavam cometendo em áreas de pesquisa muito mais complicadas? ”

Ferreira acredita que o bom jornalismo cienta­fico deve combater erros como esses. E, a  medida que a ciência se torna mais complicada, ela sabe que seu doutorado se tornara¡ ainda mais útil.

"Um doutorado ajuda a entender como a ciência éfeita, porque vocêtambém fez ciaªncia", diz Ferreira, que também escreveu artigos para o MIT News como estagia¡rio na Escola de Ciências. “E isso lhe da¡ um respeito pela seção de materiais e manãtodos, que éonde vocêdescobre se um artigo érealmente bom ou não. Algumas pessoas pulara£o isso, o que me enche de horror, porque hártigos que chamam tanta atenção na ma­dia porque o conceito éinteressante, mas se vocêos laª, vaª que eles nunca provaram o que dizem. ”

Em um mundo de nota­cias, jornalistas com treinamento cienta­fico são cada vez mais cra­ticos. Como virologista, Ferreira viu isso em primeira ma£o durante a pandemia de Covid-19. “Jornalistas cienta­ficos estãorelatando pesquisas enquanto elas estãosendo feitas, e nem todas as pesquisas são feitas igualmente”, diz ela. “Portanto, jornalistas que podem olhar além das conclusaµes de um artigo e ler o material e os manãtodos, analisam os resultados e ver se eles apoiam as conclusaµes do artigo são essenciais.”

Jornalistas cienta­ficos que podem colocar a pandemia em contexto também são importantes. Por exemplo, as raa­zes de muitas epidemias virais estãono desmatamento, diz Ferreira. “Com o desmatamento, não háuma zona de amortecimento enorme entre as grandes e grandes comunidades urbanas. Se vocêtem uma pequena comunidade rural e um va­rus se espalha por la¡, a quantidade de pessoas infectadas érelativamente pequena, mas se se espalhar para uma comunidade urbana, vocêtem muito mais pessoas que podem ser infectadas e o surto émais difa­cil de controlar . ”

Para sua tese de mestrado, Ferreira se concentrou em um ta³pico um pouco menos pesado: a possibilidade de projetar um sapato conforta¡vel de salto alto. “O legal dessa pea§a éque não se trata apenas de ciência direta. Eu tive que olhar para as pressaµes sociais, a história e a anedota, o que tornou muito divertido ”, diz ela. Para sua tese, Ferreira conversou com historiadores, designers e engenheiros de cala§ados, poda³logos e outros médicos, além do fundador de uma empresa que afirma ter criado saltos mais conforta¡veis. "Atécomprei um par, que usei exatamente uma vez", diz ela.

Viajando entre mundos

A transição de Ferreira para o MIT foi tranquila, envolvendo uma mudança pelo rio Charles, de Fenway para Cambridgeport. Ela ainda mantanãm a maioria de seus amigos da faculdade de Harvard. Recanãm-integrados a  sua vida social, seus colegas de classe do GPSW do MIT, adicionando uma terceira camada rica ao seu mundo.

"a‰ estranho, porque as conversas são muito diferentes!" ela diz. “No laboratório, hávários técnicos se inscrevendo na faculdade de medicina, então vocêestãofalando sobre isso. E seus amigos que se formaram estãotodos falando sobre empregos e trabalhando na indaºstria, enquanto os amigos de doutorado ainda estãofalando sobre hora¡rios de defesa. E meus amigos na GPSW estãofalando sobre esse prazo e a próxima história que vocêdeve escrever. a‰ como saltar entre mundos! ”

Viajar entre mundos éum passatempo favorito de Ferreira, que antes de Covid-19 assistia a produções teatrais locais uma ou duas vezes por maªs. De fato, ela e a ma£e reservaram sua defesa de doutorado em setembro passado com apresentações locais de "Six" e "Choir Boy".

“Se vocêvai ao cinema ou ao teatro, desliga o telefone por duas horas e étotalmente imersivo”, diz Ferreira. “Sim, o mundo continua a existir além dele, mas vocêestãonesse outro mundo por um tempo. Se a pea§a érealmente boa e vocêestãono estado de espa­rito certo, três horas podem passar, e vocêsai sabendo muito mais sobre o mundo. ” Boa escrita, ela acredita, tem o mesmo efeito. "E eu espero que meus escritos também consigam agarrar alguém por alguns minutos e apresenta¡-los a todo esse mundo".

Depois de todas as suas reviravoltas acadaªmicas, Ferreira simplesmente se sente compelida a levar a beleza e a complexidade da ciência para o resto do mundo: “Acho que quando alguém consegue tornar um conceito cienta­fico bonito, isso explica a s pessoas de fora da ciência como a ciência bonita pode estar. E esse, acho eu, deve ser o objetivo de qualquer escritor de ciências. ”

 

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