Talento

O pesquisador de energia que quer construir melhor para consumir menos
Em um cena¡rio global de demandas crescentes de energia e recursos finitos, Rihab Khalid decidiu entender como os edifa­cios podem se tornar mais eficientes em termos de energia.
Por Charis Goodyear - 19/09/2021


Rihab estudando na Biblioteca da Universidade 

Quando fui apresentado a  arquitetura com eficiência energanãtica, senti como se tivesse encontrado minha vocação. Para mim, a energia épessoal. Cresci em uma comunidade onde não ta­nhamos acesso a  eletricidade por até12 horas por dia. Foi a própria ausaªncia de energia que o tornou tão visível e valioso.

Descobrimos maneiras de contornar os apagaµes de energia. Extremamente cientes do nosso consumo de eletricidade, programamos nossas atividades com antecedaªncia e, muitas vezes, sincronizamos as prática s para aproveitar ao ma¡ximo o tempo em que a eletricidade estava dispona­vel. Embora o número de horas que ta­nhamos eletricidade por dia fosse limitado, muitas pessoas no Sul Global tem acesso a muito menos horas do que nós.

O acesso a  energia em umpaís em desenvolvimento como o Paquistão, onde cresci, éum problema muito real e generalizado. O Paquistão enfrenta um danãficit de eletricidade de 5.000 MW, com cerca de 26% de sua população (56 milhões de pessoas) ainda sem acesso ba¡sico a  eletricidade. Em todo o mundo, 13% das pessoas ainda não tem acesso a  eletricidade moderna, o que tem implicações para a educação, saúde e clima.

A classe média no Sul Global estãocrescendo dramaticamente. Na verdade, as definições de classe média são muito baseadas no consumo, que inclui recursos como energia. A pesquisa indica que em 2040, o consumo de energia no mundo em desenvolvimento tera¡ triplicado.

A imagem écomplexa. O acesso a  energia éessencial para acabar com a pobreza e dar a s pessoas oportunidades iguais. Simultaneamente, precisamos garantir que a energia seja o mais limpa e o uso mais eficiente possí­vel para proteger o futuro do nosso planeta.

Fornecer acesso a energia acessa­vel e sustenta¡vel para todos, garantindo o crescimento de cidades inclusivas e sustenta¡veis, faz parte dos Objetivos de Desenvolvimento Sustenta¡vel das Nações Unidas. Como os edifa­cios respondem por cerca de 40% da energia global, compreender e desenvolver uma arquitetura com eficiência energanãtica torna-se crítico a  medida que buscamos realizar esse objetivo com o aumento da urbanização e expansão populacional.

Ganhei uma bolsa de estudos para um doutorado em arquitetura com eficiência energanãtica em Cambridge. Sem a bolsa simplesmente não teria sido possí­vel estudar aqui. A partir daquele momento, senti um profundo sentimento de gratida£o e a responsabilidade de fazer algo pela minha comunidade. Mesmo se eu fosse capaz de fazer uma pequena diferença na vida de alguém , eu me consideraria bem-sucedido.

Quando comecei minha pesquisa, descobri que a maior parte do trabalho feito na área estava focado na eficiência tecnologiica, por exemplo, materiais de construção e técnicas de construção. Muito menos atenção estava sendo dada a como as configurações dos edifa­cios afetam o consumo de energia dos ocupantes e o uso do Espaço. Quando esses fatores foram considerados, foi de uma forma altamente padronizada que não levou em consideração a complexidade e a variabilidade da ação e do comportamento humano.

Inicialmente eu também tomei o caminho convencional - olhando para a eficiência dos aparelhos, investigando o isolamento e fazendo análises de custo-benefa­cio. Mas as questões permaneciam: por que o consumo de energia continuava aumentando no Sul Global, apesar das melhorias nos eletrodomanãsticos e nos tecidos para construção? Nossas casas contempora¢neas exigiam mais de nose atendiam a s nossas necessidades?

O comportamento humano évisto como o 'curinga' no campo arquiteta´nico, pois émuito difa­cil de quantificar. Mesmo assim, senti que, se pudesse desvendar esse fator, forneceria insights inestima¡veis.

Rihab estudando com laptop e livros   

Decidi incorporar teorias sociais em minha pesquisa que se concentrava na demanda doméstica de energia em moradias de classe média em Lahore, Paquistão. Isso significa que fui capaz de investigar como o design dos Espaços influencia o comportamento dos ocupantes e como isso, por sua vez, impacta o uso de energia. Outro aspecto importante foi considerar o contexto cultural subjacente.

Eu descobri que o consumo domanãstico de energia estava embutido nas estruturas materiais e sociais. Esses fatores estãointer-relacionados, o que significa que uma análise conjunta énecessa¡ria para que possamos realmente chegar ao cerne da gestãoda demanda de energia.

Outra descoberta importante foi a natureza de gaªnero do uso de energia. Devido a construções hista³ricas, culturais e religiosas no Paquistão, as mulheres são as principais responsa¡veis ​​pela maioria das prática s domésticas, como cozinhar, limpar e cuidar das criana§as, que consomem energia.

Embora a casa seja vista como doma­nio das mulheres, a realidade éque as mulheres normalmente não estãoenvolvidas na formulação de políticas de construção ou projetos de casas. Essa desconexão significa que suas necessidades de espaço e energia simplesmente não são atendidas.

O conflito entre projetos de construção e prática s culturais tem implicações para a eficiência energanãtica. Por exemplo, muitas das mulheres com quem conversei tinham reservas sobre layouts de plano aberto e grandes janelas, modelados em casas ocidentais, porque os projetos não ofereciam a segregação ou privacidade necessa¡ria para as mulheres realizarem as prática s domésticas.

Precisamos ter mais mulheres nonívelde tomada de decisão no planejamento urbano e no setor de energia. Dessa forma, podemos projetar políticas e casas que considerem as necessidades e prática s das mulheres e, nesse processo, tornem o uso de energia mais eficiente.

Faa§o parte de uma incra­vel rede de profissionais do sexo feminino que trabalham no setor de energia no Paquistão. Tem sido realmente animador ver que não são as mulheres la¡ fora, que abordam estes graves desafios que enfrentamos. Mas ainda hátrabalho a ser feito para garantir que as mulheres tenham representação quando decisaµes importantes estiverem sendo tomadas.

No ano passado, estive envolvido em um projeto que busca entender a equidade de gaªnero e o acesso a  energia no Sul Global. Recentemente, apresentamos nossas descobertas em um workshop no Paquistão com a participação de profissionais de todo o setor de pola­tica energanãtica. Foi uma excelente oportunidade para iniciar a conversa.

Tenho grandes esperanças - sinto que agora a maréestãose voltando para políticas mais inclusivas. Isso éo que énecessa¡rio, éfundamental para que as políticas de habitação e energia se tornem equitativas e sustenta¡veis. Ao reunir a pesquisa de energia com base nas perspectivas das ciências sociais e humanas, junto com vozes mais diversas, especialmente as das mulheres, acredito que podemos transformar a pola­tica de habitação e energia e, por sua vez, comea§ar a enfrentar alguns dos desafios globais que enfrentamos hoje .

 

.
.

Leia mais a seguir