Estudo confirma atuação de substância derivada do diesel no desenvolvimento de diabetes e obesidade
Desenvolvida pela FCA da Unicamp (Campus de Limeira, SP), pesquisa mostrou que a exposia§a£o crônica ao composto 1,2-NQ induz a inflamaa§a£o do tecido adiposo
Foto: Antonio Scarpinetti

Em uma das ca¢maras o poluente élana§ado atravanãs de um nebulizador ultrassa´nico; na outra a nebulização éfeita apenas com a utilização do solvente.Â
Pesquisa desenvolvida no Laborata³rio de Investigação Molecular em Obesidade (LabIMO), da Faculdade de Ciências Aplicadas (FCA) da Unicamp (Campus de Limeira, SP), sugere que a exposição crônica ao composto 1,2-NQ, derivado da combustão do diesel, pode afetar a glicemia de jejum e levar a intolera¢ncia a glicose, que seria um quadro semelhante ao pré-diabetes nos humanos. Conduzido pelo doutorando Clilton Kraa¼ss de Oliveira Ferreira e orientado pela professora Patricia de Oliveira Prada, o estudo teve como objetivo investigar em animais os efeitos da exposição crônica a poluente atmosfanãrico proveniente da queima do diesel - presente em material particulado disseminado na atmosfera das cidades com tra¡fego de veaculos que usam esse combustavel - sobre o equilabrio energanãtico e glicaªmico e na indução da inflamação no tecido adiposo.
Trata-se da substância 1,2-naftoquinona (1,2-NQ), resultante da combustão do naftaleno, um dos componentes do diesel, que em geral se associa ao material particulado em suspensão no ar. O composto em questãofoi selecionado porque sua concentração na poluição atmosfanãrica vem crescendo em decorraªncia do aumento da utilização do diesel em veaculos automotivos.
Segundo a professora Patricia de Oliveira Prada, responsável pelo laboratório, o trabalho partiu da hipa³tese de que a presença desse poluente agregado em material particulado de até2,5 micrometros de dia¢metro, que compaµe a poluição atmosfanãrica, pode promover inflamação no sistema nervoso central e periferia, resistência a insulina, hiperglicemia e aumento de gordura visceral. Trabalhos já publicados evidenciam uma relação de causa e efeito entre poluição atmosfanãrica e diabetes mellitus. Contudo, não se sabe o efeito isolado de cada poluente presente nesse material particulado e ainda não estãoclaro se a exposição crônica a substância 1,2-NQ podera¡ atuar como agente lesivo, desencadeando reações inflamata³rias sistemicas e promovendo alterações na glicemia de jejum, na tolera¢ncia a glicose e no perfil inflamata³rio de células do sistema imunológico, os macra³fagos.
Em vista disso, constituiu foco da pesquisa investigar os efeitos da exposição crônica ao poluente quamico atmosfanãrico 1,2-NQ sobre o balana§o energanãtico e o perfil inflamata³rio do tecido adiposo em camundongos selvagens, adultos. Esses animais apresentaram aumento da glicemia de jejum e intolera¢ncia a glicose no teste utilizado (GTT), resultados que podem estar relacionados a também observada inflamação de tecidos perifanãricos.
Em vista dessa possibilidade, explica Clilton, “nossa hipa³tese foi a de que dois receptores inflamata³rios cla¡ssicos, o TNFR1 e o TLR4, poderiam estar participando do processo. Para comprovar esta hipa³tese, utilizamos mais duas linhagens de animais knockouts, geneticamente modificados, que não possuaam os referidos receptores para que pudesse ser verificado se eles, presentes naturalmente no organismo, poderiam ser os deflagradores da inflamação quando expostos ao poluenteâ€. Neste caso, esperava-se que os camundongos geneticamente modificados, que não expressam TLR4 e TNFR1, não apresentassem os efeitos da exposição ao poluente verificado nos camundongos selvagens. E isso efetivamente ocorreu, corroborando a hipa³tese de que a inflamação éresponsável pelos efeitos adversos nestes animais.
Experimentos
Para a investigação inicial foram utilizados camundongos selvagens machos, com oito semanas de vida, que receberam dieta padra£o. Eles foram então separados em dois grupos. Em um deles os animais foram expostos ao poluente 1,2-NQ, por nebulização, em concentração igual a encontrada no ambiente, por 17 semanas, durante 15 minutos em cinco dias da semana e sempre na mesma hora. Já o grupo controle, submetido ao mesmo processo, recebeu apenas o veaculo utilizado na nebulização como solvente do contaminante.
Nos animais que inalaram 1,2-NQ observou-se aumento da glicemia de jejum e da intolera¢ncia a glicose. Ao final, constatou-se também inflamação do tecido adiposo, mas diferentemente do que os pesquisadores esperavam, não havia ocorrido alterações de peso corpa³reo e variação de gordura nos animais expostos ao poluente. As alterações observadas foram associadas, como mencionado na literatura, ao aumento da inflamação no tecido adiposo epididimal devido ao aumento de macra³fagos pra³-inflamata³rios M1 e redução dos macra³fagos regenerativos M2, que são células que constituem o sistema imunológico.
Na sequaªncia, os camundongos knockouts foram submetidos aos mesmos procedimentos para investigar, separadamente, o papel do receptor 1 do fator de necrose tumoral (TNFR1KO) e do receptor tipo toll 4 (TLR4KO) na inflamação decorrente da exposição ao poluente. Uma das associações que se estabelece entre poluição e balana§o energanãtico refere-se ao aumento da inflamação nos tecidos por meio da ativação dos TLR4 da imunidade inata ou ainda pelos efeitos de citocinas pra³-inflamata³rias como o TNF alfa. Verificou-se então, que os animais, nos quais os receptores TNFR1 ou TLR4 foram supressos, revelaram-se protegidos dos efeitos provocados pela exposição crônica a substância 1,2-NQ.
Para a docente, estas constatações sugerem que a exposição crônica ao composto 1,2-NQ, derivada da combustão do diesel, pode afetar a glicemia de jejum e levar a intolera¢ncia a glicose que seria um quadro semelhante ao pré-diabetes nos humanos. Segundo ela, essas alterações parecem associadas ao aumento da inflamação induzida pelo contaminante, pois a retirada de receptores ligados a inflamação, como o TLR4 e TNFR1, protegeu os animais dessas ocorraªncias.
A modelagem e a metodologia utilizadas para a exposição ao 1,2-NQ já haviam sido validadas para o estudo do desenvolvimento de doenças pulmonares pelo grupo liderado pela professora Soraia Katia Pereira Costa, do Departamento de Farmacologia da USP, com a qual a professora Patricia mantem colaboração em trabalhos que constituem sua linha de pesquisa. Ela explica a diferença: “Aqui na Unicamp, o nosso foco ao reproduzir a exposição ao 1,2-NQ foi determinar o possível efeito do poluente no desenvolvimento de diabetes mellitus tipo 2 e de obesidadeâ€. A grande maioria das análises exigidas pelo estudo foram realizadas no pra³prio LabIMO e, no caso, o financiamento do projeto foi da Fapesp.