Tecnologia Científica

Plantar a¡rvores pode não ser a solução para conter o aquecimento global
Grupo de pesquisadores aponta os problemas trazidos pelo reflorestamento desordenado
Por Thauane Silva - 17/12/2019

Foto: Mariana Heinz/CC BY-ND 2.0

A cada ano épossí­vel notar o aumento dasmudanças climáticas causadas pelo aquecimento global e ampliadas pela atividade humana. Temperaturas elevadas, secas prolongadas, derretimento de geleiras são somente uma parte dos sinais de que algo precisa ser feito para reverter a situação. A solução encontrada por pesquisadores do Instituto Federal de Tecnologia de Zurique, na Sua­a§a, publicada no artigo The global tree restoration potential (O potencial global de restauração de a¡rvores), éutilizar os 0,9 bilhaµes de hectares osequivalentes a  extensão do territa³rio brasileiro e de quase todo o colombiano ossituados fora das áreas urbanas e agra­colas para plantar a¡rvores que seriam capazes de capturar 205 gigatoneladas de carbono oscorrespondente a cerca de um tera§o da quantidade de carbono liberado atéhoje.

A solução apontada, poranãm, não obteve aceitação una¢nime na comunidade cienta­fica. Um grupo de pesquisadores de diferentes instituições mundiais decidiu, então, publicar um comenta¡rio tanãcnico, em que corrige algumas das afirmações apresentadas no artigo e recalcula o potencial de sequestro de carbono para 42 gigatoneladas. Além disso, dentre os hectares mapeados, estãoinclua­das áreas protegidas que, segundo o professor do Departamento de Bota¢nica da UFRGS e coautor do comenta¡rio tanãcnico Gerhard Overbeck, não poderiam ser consideradas para a plantação. Essas regiaµes abrigam biomas abertos, como os campos e as savanas, e o plantio de a¡rvores poderia torna¡-las um ambiente florestal (fechado), destruindo o ecossistema presente e agravando asmudanças climáticas.

No trabalho suiço, não foi levado em conta que campos e savanas tem capacidade de capturar e armazenar carbono tanto quanto ambientes florestais. Por exemplo, nas savanas tropicais aºmidas encontradas na áfrica e no Brasil oschamadas de cerrado aqui –, 86% de todo o carbono estãono solo. Os autores do comenta¡rio também advertem que o carbono sequestrado pelas a¡rvores nos ambientes fechados pode ser liberado para a atmosfera em casos de incaªndio.

A pesquisa também não considerou a influaªncia do albedo no clima local ossuperfa­cies escuras refletem mais calor. Assim, áreas com grande quantidade de cobertura vegetal produzem mais calor do que os ambientes abertos. Por fim, o professor lembra que foi deixada de lado a necessidade de ambientes de campo e savana terem distúrbios osfogo e pastejo controlados ospara promover maior biodiversidade e continuar provendo os servia§os ecossistemicos, como fornecimento de habitat para espanãcies polinizadoras e a garantia da infiltração de águano solo.

Os autores do comenta¡rio tanãcnico ainda defendem que, para impedir o avanço do aquecimento global, épreciso restaurar o estado original dos ecossistemas e parar com as emissaµes de carbono. Segundo Gerhard, isso são seria alcana§ado com o estabelecimento de políticas de apoio a  pesquisa e a  criação de uma infraestrutura para restaurar os biomas abertos, dos quais restam poucas sementes das espanãcies nativas.

Importa¢ncia da vegetação nativa

O professor Gerhard Overbeck também participou de uma pesquisa a respeito dos servia§os econa´micos e ambientais prestados pelas áreas de vegetação nativa no Brasil. O estudo foi realizado em parceria com pesquisadores brasileiros do grupo Coalização Ciência e Sociedade após a apresentação do Projeto de Lei nº 2.362/19, que retiraria da Lei 12.651 a necessidade de preservação dessas áreas. O projeto não foi aprovado pelo Senado Federal, poranãm o grupo ainda achou relevante sua publicação para a conscientização da população.

O trabalho aborda os problemas que a autorização do desmatamento da Reserva Legal osconstitua­da de faixas de terra dentro de propriedades privadas para uso econa´mico sustenta¡vel osacarretaria para o ser humano e, principalmente, para a biodiversidade. As consequaªncias iriam da perda da capacidade de recarga dos rios e aqua­feros, a  redução da qualidade da águaatéa erosão e perda do solo. Para alcana§ar uma conservação efetiva desses locais seria necessa¡rio realizar manutenções, mas também adotar mecanismos de produção com menor impacto ambiental, como a redução do uso de pesticidas e a melhor divisão da finalidade de cada Espaço.

A vegetação nativa cobre entre 65% e 69% de territa³rio brasileiro, mas somente 6% édestinado a  conservação de biodiversidade, e grande parte dessas zonas se localiza na regia£o amaza´nica, recentemente afetada por queimadas. Conforme o estudo, essas áreas geram aproximadamente R$ 6 trilhaµes para a economia brasileira por meio da prestação de servia§os ecossistemicos, como a regulação climática, o armazenamento de cerca de 21% do carbono dopaís e a captação de águapara consumo humano, para uso em hidrelanãtricas e na agricultura. Tais dados são uma estimativa, pois, conforme o pesquisador, os trabalhos usados utilizam diferentes valores para cada servia§o.

 

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