Tecnologia Científica

O que outros planetas podem nos ensinar sobre a Terra: pesquisadores explicam
Os cientistas que exploram o espaço estãotrazendo informaa§aµes sobre o passado profundo da Terra, sua complicada relação com a vida e o futuro do nosso planeta.
Por Josie Garthwaite - 05/03/2020

a€s vezes, vocêprecisa sair de casa para entender. Para o gea³logo planetario de Stanford, Mathieu Lapa´tre , "lar" abrange toda a Terra.

“Na³s não olhamos apenas para outros planetas para saber o que hápor aa­. a‰ também uma maneira de aprender coisas sobre o planeta que estãosob nossos pra³prios panãs ”, disse Lapa´tre, professor assistente de ciências geola³gicas da Escola de Ciências da Terra, Energia e Ciências Ambientais (Stanford Earth).

Uma imagem composta mostra a Terra do ponto de vista de uma Espaçonave
em a³rbita ao redor da lua do planeta em outubro de 2015.
(Crédito da imagem: NASA / Goddard / Arizona State University)

Desde Galileu, cientistas tem procurado entender outros corpos planetarios atravanãs de lentes terrestres. Mais recentemente, os pesquisadores reconheceram a exploração planeta¡ria como uma via de ma£o dupla. Estudos do espaço ajudaram a explicar aspectos do clima e a física do inverno nuclear, por exemplo. No entanto, as revelações não permearam todos os campos da geociaªncia igualmente. Esfora§os para explicar processos mais pra³ximos do solo - nasuperfÍcie da Terra e profundamente em sua barriga - estãoapenas comea§ando a se beneficiar do conhecimento reunido no Espaço.

Agora, a  medida que os telesca³pios adquirem mais energia, os estudos sobre exoplanetas se tornam mais sofisticados e as missaµes planeta¡rias produzem novos dados, hápotencial para impactos muito mais amplos nas ciências da Terra, como Lapa´tre e coautores da Arizona State University, Harvard University, Rice University, Stanford e Yale Universidade argumentam na revista Nature Reviews Earth & Environment .

"A multida£o e variedade de corpos planetarios dentro e além do nosso sistema solar", eles escrevem em um artigo publicado em 2 de mara§o , "pode ​​ser a chave para resolver mistanãrios fundamentais sobre a Terra".

Nos pra³ximos anos, os estudos desses corpos podem alterar a maneira como pensamos sobre o nosso lugar no universo.

“a€s vezes, ao explorar outro planeta, vocêfaz uma observação que desafia sua compreensão dos processos geola³gicos e que o leva a revisar seus modelos.”


MATHIEU LAPa”TRE

Formas aliena­genas

As observações de Marte já mudaram a maneira como os cientistas pensam sobre a física dos processos sedimentares na Terra. Um exemplo começou quando o Curiosity Rover da NASA atravessou um campo de dunas no planeta vermelho em 2015.

"Vimos que havia grandes dunas de areia e pequenas ondulações em escala de deca­metros como as que vemos na Terra", disse Lapa´tre, que trabalhou na missão como estudante de doutorado em Caltech em Pasadena, Califa³rnia. "Mas havia também um terceiro tipo de forma de cama, ou ondulação, que não existe na Terra. Nãoconseguimos explicar como ou por que essa forma existia em Marte. ”

Os estranhos padraµes levaram os cientistas a revisar seus modelos e inventar novos, o que levou a  descoberta de uma relação entre o tamanho de uma ondulação e a densidade da águaou outro fluido que a criou. “Usando esses modelos desenvolvidos para o ambiente de Marte, agora podemos observar uma rocha antiga na Terra, medir ondulações nela e depois tirar conclusaµes sobre o quanto fria ou salgada a águaestava no momento em que a rocha se formou”, disse Lapa´tre, “ porque a temperatura e o sal afetam a densidade do fluido ".

Essa abordagem éaplica¡vel nas geociências. “a€s vezes, ao explorar outro planeta, vocêfaz uma observação que desafia sua compreensão dos processos geola³gicos e que o leva a revisar seus modelos”, explicou Lapa´tre.

Planetas como experimentos

Outros corpos planetarios também podem ajudar a mostrar com que freqa¼aªncia os corpos semelhantes a  Terra são no universo e o que, exatamente, torna a Terra tão diferente do planeta manãdio.

“Estudando a variedade de resultados que vemos em outros corpos planetarios e entendendo as varia¡veis ​​que moldam cada planeta, podemos aprender mais sobre como as coisas poderiam ter acontecido na Terra no passado”, explicou a coautora Sonia Tikoo-Schantz , uma professor de geofa­sica na Stanford Earth, cuja pesquisa se concentra no paleomagnetismo.

Considere, ela sugeriu, como os estudos de Vaªnus e da Terra ajudaram os cientistas a entender melhor as placas tecta´nicas. "Vaªnus e Terra são do mesmo tamanho e provavelmente se formaram em condições bastante semelhantes", disse Tikoo-Schantz. Mas enquanto a Terra tem placas tecta´nicas se movendo e águaem abunda¢ncia, Vaªnus tem uma tampa quase sãolida, sem águaem suasuperfÍcie e uma atmosfera muito seca.

"De tempos em tempos, Vaªnus tem algum tipo de perturbação catastra³fica e um ressurgimento de grande parte do mundo", disse Tikoo-Schantz, "mas não vemos esse ambiente tecta´nico conta­nuo de estado estaciona¡rio que temos na Terra".

Os cientistas estãocada vez mais convencidos de que a águapode explicar grande parte da diferença. "Sabemos que a subducção de placas tecta´nicas traz águapara a Terra", disse Tikoo-Schantz. "Essa águaajuda a lubrificar o manto superior e a convecção, o que ajuda a impulsionar a tecta´nica de placas".

Essa abordagem - usando corpos planetarios como grandes experimentos - pode ser aplicada para responder a mais perguntas sobre como a Terra funciona. "Imagine que vocêdeseja ver como a gravidade pode afetar certos processos", disse Lapa´tre. "Ir a outros planetas pode permitir que vocêfaz um experimento em que épossí­vel observar o que acontece com uma gravidade mais baixa ou mais alta - algo que éimpossí­vel de fazer na Terra."

Paradoxo do núcleo

Estudos medindo magnetismo em rochas antigas sugerem que o campo magnético da Terra estãoativo hápelo menos 3,5 bilhaµes de anos. Mas o resfriamento e a cristalização do núcleo interno que os cientistas acreditam que sustenta o campo magnético da Terra hoje começam hámenos de 1,5 bilha£o de anos atrás. Essa lacuna de dois bilhaµes de anos, conhecida como o novo paradoxo central, deixou os pesquisadores intrigados sobre como o da­namo da Terra poderia ter comea§ado tão cedo e persistiu por tanto tempo.

As respostas podem estar em outros mundos.

"Em nosso ca­rculo de vizinhos pra³ximos - Lua, Marte, Vaªnus - somos o aºnico planeta com um campo magnético que estãoforte desde o ini­cio e permanece ativo hoje", disse Lapa´tre. Mas exoplanetas do tamanho de Jaºpiter que orbitam perto de sua estrela foram identificados com campos magnanãticos, e em breve podera¡ ser tecnicamente via¡vel detectar campos semelhantes em mundos menores, rochosos e semelhantes a  Terra. Tais descobertas ajudariam a esclarecer se o da­namo de longa duração da Terra éuma anomalia estata­stica no universo cuja inicialização exigiu alguma circunsta¢ncia especial.

Por fim, o mistério em torno da origem e do mecanismo por trás do da­namo da Terra éum mistério sobre o que cria e sustenta as condições da vida. O campo magnético da Terra éessencial para a sua habitabilidade, protegendo-o contra ventos solares perigosos que podem retirar um planeta de águae atmosfera. "a‰ por isso que Marte éum deserto tão seco em comparação com a Terra", disse Tikoo-Schantz. "Marte começou a desidratar quando seu campo magnético morreu."

campo magnético de jaºpiter quente Visão noturna de linhas de campo magnético
na simulação de um exoplaneta "Jaºpiter quente". Simulações como essas ajudam
os pesquisadores a entender melhor a dina¢mica interior desses planetas e aprender
mais sobre como eles podem ter se formado. Magenta indica campos magnanãticos
com polaridade positiva e azul indica campos com polaridade negativa.
(Crédito da imagem: Tamara Rogers, Jess Vriesema, Universidade do Arizona)

Terra em constante mudança

Grande parte do a­mpeto de olhar muito além da Terra ao tentar decodificar seu funcionamento interno tem a ver com a natureza inquieta de nosso planeta. Em muitos momentos de sua existaªncia de 4,5 bilhaµes de anos, a Terra não se parecia em nada com o ma¡rmore azul-esverdeado que éhoje.

"Estamos tentando chegar ao ponto em que podemos caracterizar planetas que são como a Terra e, esperana§osamente, algum dia encontrar vida em um deles", disse a co-autora Laura Schaefer , cientista planeta¡ria de Stanford Earth que estuda exoplanetas. Provavelmente, seráalgo mais parecido com bactanãrias do que ET, disse ela.

"Apenas ter outro exemplo de vida em qualquer lugar seria incra­vel", disse Schaefer. Tambanãm ajudaria a iluminar o que aconteceu na Terra durante bilhaµes de anos antes que o oxigaªnio se tornasse abundante e, atravanãs de processos e ciclos de feedback que permanecem opacos, uma vida complexa explodiu.

"Estamos perdendo informações de diferentes ambientes que existiam nasuperfÍcie da Terra durante esse período", explicou Schaefer. A tecta´nica de placas recicla constantemente as rochas dasuperfÍcie, mergulhando-as nas entranhas ardentes do planeta, enquanto a águase espalha pelos oceanos, despeja nas nuvens da chuva, pairando no ar e escorrega nos rios e ca³rregos tende a alterar a geoquímica de rochas e minerais que permanecem perto dasuperfÍcie.

A própria vivacidade da Terra o torna um arquivo pobre para evidaªncias de vida e seus impactos. Outros corpos planetarios - alguns mortos ainda e secos, outros de alguma forma parecidos com a antiga Terra - podem se mostrar mais adequados a  tarefa.

a‰ por isso que os cientistas ficaram tão empolgados em descobrir, em 2019 , que uma amostra de rocha coletada pelos astronautas da Apollo 14 em 1971 pode de fato conter minerais que dispararam da Terra como um meteorito bilhaµes de anos atrás. "Na Lua, não háplacas tecta´nicas ou intemperismo aquoso", disse Lapa´tre. "Então, este pedaço de rocha estãointacto nos últimos bilhaµes de anos, apenas esperando que o encontremos."

Certamente, os cientistas planetarios não esperam encontrar muitas ca¡psulas antigas da Terra preservadas no Espaço. Mas a exploração conta­nua de outros mundos em nosso sistema solar e além pode eventualmente render uma pequena amostra estata­stica de planetas com vida neles - não ca³pias de carbono dos sistemas da Terra, mas sistemas onde as interações entre vida e atmosfera podem ter um foco mais na­tido.

"Eles não estara£o no mesmo esta¡gio da vida que temos hoje na Terra, e assim poderemos aprender sobre como os planetas e a vida evoluem juntos", disse Schaefer. "Isso seria bastante revoluciona¡rio".

 

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