Tecnologia Científica

Novo processo ampliara¡ produção nacional de antiviral que pode reduzir tempo de internação por covid-19
Em testes com células infectadas, substância com estrutura similar a antiviral não fabricado no Brasil inibiu replicaça£o do va­rus da covid-19
Por Júlio Bernardes - 01/06/2020


Princa­pio ativo do antiviral tenofovir tem efeito similar ao do usado em outro
medicamento do mesmo tipo, o remdesivir, em células infectadas pelo
va­rus da covid-19, inibindo sua replicação em testes de
laboratório, o que pode ajudar a reduzir o tempo de
internação dos pacientes com a doença – 
Foto: Marcos Santos/USP Imagens

Ofumarato de tenofovir, substância que éo princa­pio ativo de um medicamento antiviral produzido no Brasil, o tenofovir, inibe in vitro a replicação do va­rus SARS-CoV-2, que causa a covid-19, revela pesquisa realizada na Faculdade de Ciências Farmacaªuticas de Ribeira£o Preto (FCFRP) e na Faculdade de Medicina de Ribeira£o Preto, ambas da USP. O estudo aponta que o efeito verificado em células infectadas com o va­rus ésimilar ao de outro antiviral, o remdesivir, o que indica uma possí­vel ação para reduzir o tempo de internação dos pacientes com a doena§a. Embora sejam necessa¡rios novos estudos para verificar o efeito em seres humanos, os pesquisadores desenvolveram uma rota completa de sa­ntese do medicamento em escala piloto, permitindo que ele seja totalmente fabricado no Brasil, que não produz o remdesivir.

As conclusaµes do estudo são relatadas em artigo publicado em 29 de maio pelo Journal of the Brazilian Chemical Society, editado pela Sociedade Brasileira de Quí­mica (SBQ). O professor Norberto Peporine Lopes, membro do grupo de pesquisadores que elaborou o texto, conta que o trabalho tem origem nas pesquisas para verticalização da sa­ntese total de antirretrovirais usados no tratamento de aids no Brasil, iniciadas em 2014.

“O fumarato de tenofovir éproduzido no Paa­s, poranãm as empresas compram no exterior os intermediários avana§ados para sa­ntese do princa­pio ativo e concluem o processo por aqui”, diz o pesquisador ao Jornal da USP. “O que vinha sendo pesquisado era a realização das fases mais iniciais da sa­ntese do princa­pio ativo, em escala piloto, pré-industrial, tanto do fumarato de tenofovir quanto de seus derivados.”

Com o surgimento da covid-19, os pesquisadores iniciaram testes em laboratório com o princa­pio ativo, usando amostras do va­rus SARS-CoV-2 em parceria com a Faculdade de Medicina de Ribeira£o Preto (FMRP). “Quando foi divulgada a estrutura da enzima do va­rus que seria o alvo do remdesivir, foi feito um estudo de química computacional com o fumarato de tenofovir, mostrando que ambos se ligam ao va­rus pelo mesmo sa­tio ativo”, relata o professor. “Por serem moléculas da mesma fama­lia, acreditamos que tivessem ação similar.”

Menor replicação

Os testes em laboratório mostraram que o fumarato de tenofovir reduziu de forma significativa a replicação do va­rus da covid-19. “Isso confirma os estudos de química computacional que apontaram a similaridade entre os princa­pios ativos,

indicando que ele pode atuar de maneira ana¡loga ao remdesivir”, observa Peporine Lopes. “Isso éo que acontece do ponto de vista qua­mico, sendo necessa¡rios estudos clínicos para confirmar o efeito antiviral, e se ele ésuperior ou inferior ao do remdesivir.”

“O fumarato de tenofovir éproduzido no Paa­s, poranãm as empresas compram no exterior os intermediários avana§ados para sa­ntese do princa­pio ativo e concluem o processo por aqui”, diz o pesquisador ao Jornal da USP. “O que vinha sendo pesquisado era a realização das fases mais iniciais da sa­ntese do princa­pio ativo, em escala piloto, pré-industrial, tanto do fumarato de tenofovir quanto de seus derivados.”


De acordo com o professor, embora o remdesivir tenha sido anunciado como uma possí­vel cura para a covid-19, na prática ele diminui o tempo de internação dos pacientes infectados. “Espera-se que o fumarato de tenofovir tenha o mesmo efeito, o que já seria muito positivo”, salienta. “A indústria no Brasil tem muito mais condições de disponibilizar o medicamento com esse princa­pio ativo para a população do que no caso do remdesivir. Desde que sejam feitos estudos clínicos, o Paa­s possui muito mais autonomia para produzir essa medicação.”

Peporine Lopes relata que os professores Giuliano Clososki e Joa£o Luis Callegari Lopes, da FCFRP, coordenaram um projeto em parceria com a empresa Lychnoflora Pesquisa e Desenvolvimento em Produtos Naturais, incubada no Supera Parque de Ribeira£o Preto (interior de Sa£o Paulo), que estudou a degradação do princa­pio ativo para efeitos toxicola³gicos. “Na verticalização do processo, por meio do monitoramento das reações químicas que formam o princa­pio ativo, foi possí­vel otimizar o seu processo de sa­ntese”, destaca o professor ao Jornal da USP. “Paralelamente, foi feita a produção em escala piloto nos laboratórios da FCFRP, o que da¡ condições para a transferaªncia da tecnologia ao setor produtivo.”

Segundo o pesquisador, já existem indaºstrias no Brasil que realizam parte da sa­ntese do fumarato de tenofovir, e a adaptação para o processo completo, se necessa¡ria, émais simples do que iniciar do zero a produção do remdesivir, que ainda não tem patente dispona­vel no Paa­s. A parte de avaliação biológica do estudo foi realizada com a colaboração dos professores Eurico de Arruda Neto e Luis Lamberti da Silva, da FMRP. As pesquisas para aumentar a escala de produção do princa­pio ativo contam com o auxa­lio da Lychnoflora e da Fipase/Supera Parque, com apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Cienta­fico e Tecnola³gico (CNPq) e da Financiadora de Estudos e Pesquisas (Finep).

 

.
.

Leia mais a seguir