Tecnologia Científica

Ajudando seu filho a usar da melhor forma o tempo online
Os especialistas oferecem conselhos sobre como se tornar um 'pai conectado'
Por Liz Mineo - 15/12/2020


Urs Gasser e John Palfrey discutem como os pais podem gerenciar os filhos e o uso da tecnologia. Stephanie Mitchell / Fota³grafa da equipe de Harvard

Os adolescentes passam em média nove horas por dia online, e muitos pais se preocupam com o impacto do tempo de tela em seus filhos. Nãohánecessidade de se preocupar, disseram os especialistas digitais Urs Gasser e John Palfrey, autores do livro recanãm-lana§ado “The Connected Parent: Um Expert Guide to Parenting in a Digital World”. Gasser, professor de prática da Harvard Law School e diretor executivo do Berkman Klein Center for Internet & Society , e Palfrey, presidente da Fundação MacArthur e ex-diretor do centro, falaram sobre as maneiras como os pais podem abraçar a filosofia de “Parentalidade conectada” e ajude as criana§as a estarem seguras online e a aproveitar ao ma¡ximo as novas ma­dias e tecnologias.

Perguntas & Respostas
Urs Gasser e John Palfrey


Quemudanças vocêviu no panorama das novas ma­dias e tecnologia nos últimos 12 anos, desde que publicou seu livro “Born Digital: Understanding the First Generation of Digital Natives” em 2008?

GASSER: Uma primeira mudança tem a ver com os tipos de tecnologia que os jovens estãousando para navegar no espaço digital. Quando escrevemos “Born Digital”, os smartphones não existiam e hoje são o dispositivo principal. Outra mudança são os tipos de plataformas que os jovens estãousando e os problemas que surgem com esses usos. Doze anos atrás, por exemplo, havia um grande desafio em torno da música e do entretenimento; era muito difa­cil para os jovens encontrar música online e eles tinham problemas porque usavam servia§os de compartilhamento de arquivos para baixar suas músicas favoritas, o que era ilegal. Agora, isso foi amplamente resolvido por modelos de nega³cios inovadores, seja no Spotify ou em outras plataformas, onde os jovens tem música em qualquer lugar.

Por outro lado, vimos novos problemas surgindo nos ambientes de tecnologia e nega³cios. Uma das maiores preocupações éem torno do uso de dados [comportamentais do usua¡rio], ou o que échamado de "capitalismo de vigila¢ncia". Além disso, quando comea§amos nosso trabalho, juventude e tecnologia eram mais como um ta³pico de nicho, e essa consciência mudou muito. Os pais estãomuito preocupados com questões como o tempo de tela, assim como os educadores que estãolidando com isso diante do COVID. a‰ uma tendaªncia geral. Tanto os legisladores quanto os legisladores estãopensando nas questões da juventude e da tecnologia também - seja sobre como podemos mitigar alguns dos riscos associados a isso, mas também como podemos abraçar as novas oportunidades que as tecnologias oferecem aos jovens para se envolverem na sociedade e se tornarem participantes da economia digital.

Desenho de pai e filho. Ilustração de Claudia Thomas

5 chaves para paternidade conectada

Mantenha uma conversa aberta sobre questões digitais.

Abrace o que háde positivo em relação a s novas tecnologias, ao mesmo tempo em que desenvolve habilidades para mitigar riscos.

Procure um equila­brio entre oferecer apoio e independaªncia.

Mantenha a mente aberta em vez de temer novas tecnologias.

Envolva-se vocêmesmo com a tecnologia para que possa manter a credibilidade e exemplificar um bom comportamento.

Fonte: “The Connected Parent: An Expert Guide to Parenting in a Digital World,” Urs Gasser e John Palfrey

Vocaª pode explicar sua filosofia de “paternidade conectada”?

PALAFRa‰M: Uma coisa que édiferente sobre este livro éque ele apresenta os dados e os conselhos que oferecemos aos pais com uma filosofia consistente. Qualquer pessoa pode acessar a Internet e procurar dicas para os pais. Achamos que este livro éútil na medida em que vocêabraça a filosofia da criação de filhos conectados. As ideias são muito simples, mas bastante importantes e embasadas na pesquisa.

Uma delas éa importa¢ncia de os pais manterem o dia¡logo aberto com os jovens de sua vida. Parece um ponto a³bvio, mas nem sempre éfeito e envolve garantir que as criana§as saibam que podem fazer perguntas a vocaª, em geral, não apenas sobre tecnologia.

Isso leva a um segundo ponto: pedimos aos pais que sujem as ma£os com a tecnologia. Sugerimos que eles o usem para construir credibilidade com seus filhos. Vocaª não precisa ficar no Snapchat o dia todo, ou qualquer que seja a tecnologia mais recente no momento, mas vocêprecisa ser confia¡vel para que seus conselhos ressoem com os jovens.

Tambanãm achamos que vocêdeve ser conduzido em sua paternidade não pelo medo, mas pelos dados. E éisso que esperamos fazer com este livro: apresentar quais são os fatos reais relativos a  pesquisa no contexto das perguntas mais comuns que os pais nos fazem. a‰ também uma questãode estar aberto aos lados positivos da tecnologia e a s maneiras como os jovens estãoaprendendo e se conectando uns com os outros por meio dessas tecnologias.

GASSER: A única coisa que eu talvez adicionaria éque os pais precisam primeiro se conectar com seus filhos e, em seguida, se conectar com a tecnologia.

Como as novas ma­dias e tecnologias afetaram os pais?

PALAFRa‰M: A maior parte da pesquisa tem olhado especificamente para as experiências que os jovens tem, e a abordagem que adotamos nos últimos 15 anos no Laborata³rio de Ma­dia e Juventude do Berkman Klein Center tem sido realmente fazer as perguntas do ponto de vista dos jovens pessoa. Isso émuito importante porque fundamenta a pesquisa na realidade da criana§a. Pedimos aos pais que se concentrem na experiência vivida pelos jovens, porque nosso trabalho como pais éimportante, mas secunda¡rio ao que eles estãovivenciando. Essa érealmente a lição mais importante.

Vou dar um exemplo especa­fico, que éo bullying. As pessoas costumam falar sobre cyberbullying. Nosso argumento éque, embora haja cyberbullying online, hábullying regular que acontece no pa¡tio da escola. Na verdade, étudo apenas bullying. Simplesmente ocorre em maºltiplasDimensões e em diferentes ambientes. O que estamos incentivando os pais a fazer éconsidera¡-los conectados, então, se alguém estãointimidando alguém no refeita³rio, provavelmente também estãointimidando online e vice-versa. As estratanãgias para lidar com o bullying sera£o bastante semelhantes na maioria dos casos. A pesquisa mostra que a maioria das estratanãgias que tem funcionado para noshistoricamente na boa criação dos filhos va£o se manter neste novo mundo também.

GASSER: Minha sensação éque a paternidade em sua essaªncia ainda ésemelhante ao que experimentamos na era offline. Mas a taxa de mudança que a tecnologia introduz éapenas uma virada de jogo em muitos aspectos. O pai conectado precisa aprender coisas novas o tempo todo para acompanhar o desenvolvimento tecnola³gico e entender como seus filhos estãousando a tecnologia, com seus riscos e possa­veis benefa­cios. O ritmo muito rápido de mudança cria um desafio para nós, pais, porque temos que tomar decisaµes parentais sem ter o benefa­cio de anos de experiência ou conselhos de ava³s ou evidaªncias de pesquisadores. Eu mesma experimentei esse desafio. Como pai, sinto que preciso aprender, me reajustar e descobrir como posso capacitar meus filhos: onde preciso intervir para protegaª-los ou que ferramentas usamos para ter essas conversas?

Vocaª poderia falar sobre a importa¢ncia de ser um pai conectado nesta anãpoca?

PALAFRa‰M: Se um pai abdica nessa área e não se envolve com os jovens em questões relacionadas ao uso da tecnologia, esses pais estãodeixando seus filhos em uma situação difa­cil. Ter conversas difa­ceis para ajudar um jovem a navegar em um mundo onde ele tem um dispositivo conectado a ele 24 horas por dia, 7 dias por semana éliteralmente necessa¡rio. Em parte, o que estamos dizendo aos pais éque eles deveriam pular porque a águaestãoboa e vai ficar tudo bem. Vocaª não recebe um manual sobre como ser pai quando uma criana§a nasce; vocêapenas faz alguma versão do que aprendeu com aqueles que o criaram e pode se ajustar em uma direção ou outra. Mas isso não existe neste caso porque háuma virada geracional, e o que vocênão quer fazer édeixar os filhos sozinhos. Esperamos que este livro possa servir como o “manual que falta” para os pais neste caso.

A maioria dos pais estãoassustada e preocupada com o impacto da tecnologia na vida de seus filhos. Quais são os equa­vocos mais comuns sobre a influaªncia das novas ma­dias e tecnologia?

GASSER: Os adultos frequentemente subestimam o quanto as tecnologias digitais estãointegradas na vida dos jovens. Como adultos, ainda tendemos a fazer uma distinção entre “online” e “offline”, mas, para os jovens, essas distinções não são mais significativas. Tanto a interconexão quanto a inserção da tecnologia digital moldam a vida dos jovens de maneiras profundas.

Ao mesmo tempo, existe a noção entre os adultos de que os jovens são conhecedores de tecnologia porque estãoem seu DNA ou porque são jovens e interagem com a tecnologia o tempo todo. Sabemos por pesquisa, no entanto, que existem sanãrias lacunas de participação. Nem todas as criana§as tem acesso a s tecnologias digitais da mesma forma. Essas lacunas são persistentes aqui nos Estados Unidos. Tambanãm vemos grandes diferenças na distribuição das habilidades necessa¡rias para usar essas tecnologias de maneira significativa. Existem realmente grandes questões de equidade e nós, como adultos, temos a profunda responsabilidade de garantir a implementação de políticas que permitam a cada jovem acessar a tecnologia e usa¡-la de forma produtiva.

PALAFRa‰M: Uma razãopara escrever este livro e nosso livro anterior, “Born Digital”, antes disso, éo número de mitos que permeiam a compreensão dos adultos sobre como os jovens estãocrescendo. Consideramos nosso trabalho um trabalho destruidor de mitos porque existem muitos mitos que fazem os pais subestimarem os aspectos positivos que os jovens podem obter de suas experiências com as novas ma­dias, bem como os contornos reais dos perigos que enfrentam. Uma coisa que sempre dizemos éque para os jovens não existe uma vida offline e uma vida online; éapenas vida.

Entre os aspectos positivos da tecnologia estãoos altos na­veis de ativismo ca­vico entre os jovens nos Estados Unidos e em diferentes partes do mundo. Isso estãoconectado de muitas maneiras aos tipos de coisas que eles são capazes de fazer por meio da tecnologia e das novas ma­dias e ao senso de agaªncia que os jovens tem em relação a s novas tecnologias. Eles podem iniciar novas organizações e espalhar a palavra além das fronteiras geogra¡ficas. Eu destacaria os protestos Black Lives Matter, que cresceram em parte por meio de um conjunto de tecnologias em rede.

Outro exemplo éo ativismo clima¡tico, que se espalhou pelos Estados Unidos e outros lugares globalmente em parte por causa da Internet. Algumas pessoas são apenas “clictivismo” porque estãoapenas clicando em “curtir” no Facebook. Isso não éver a plenitude das maneiras como os jovens estãousando a tecnologia e como ela muda a maneira como eles se relacionam com o mundo.

Algumas pessoas temem que a Internet esteja tornando as pessoas mais burras. Isso éum mito?

PALAFRa‰M: Nãoacho que haja nada na pesquisa que diga que esta éuma geração mais burra. Foi um tí­tulo de livro inteligente (“The Dumbest Generation”) que vendeu muitas ca³pias, mas não acho que haja manãrito nos dados. Certamente hádaºvidas sobre os efeitos de longo prazo do uso extensivo de tecnologia no aprendizado dos jovens, mas, como acontece com outras coisas, eu não culpo a tecnologia em si. a‰ a maneira como o usamos e escolhemos usa¡-lo. Eu, pelo menos, acredito que esta seráa geração mais educada da história, não a geração mais idiota da história. Veremos.

Seu livro diz que os adolescentes passam em média nove horas por dia online. O que a pesquisa diz sobre o impacto de tanto tempo de tela nos jovens? Qual éo seu conselho para os pais?

GASSER: O importante éque quanto tempo os jovens passam online éimportante. Quando se trata de tempo de tela, talvez surpreendentemente, os estudos sugerem que o uso moderado de tecnologia pode ter um impacto positivo no bem-estar social e emocional dos jovens. O problema aparece com o tempo excessivo gasto em frente a s telas. Uma área particular de preocupação éo sono, porque muitas vezes as criana§as que usam a tecnologia de maneira excessiva não dormem o suficiente. A dificuldade édeterminar qual éo tempo certo de tela, e isso depende da faixa eta¡ria. Nosso livro oferece algumas orientações baseadas em pesquisas. No entanto, o maior insight da pesquisa éque o que importa não éapenas quantas horas alguém passa na frente das telas, mas com que tipo de atividades o jovem estãoenvolvido. Por exemplo, se uma criana§a usa um celular, ela usa para jogos? Se sim, que tipo de jogos ela estãojogando? Ou ela o usa para se comunicar com seus amigos, para se envolver em alguns tipos de ativismo, ou para fazer seu dever de casa e aprender online na anãpoca do COVID? Todos esses tipos de atividades podem ter um impacto diferente sobre o bem-estar e o desenvolvimento do jovem, e pesquisas futuras abordara£o essas questões qualitativas.

PALAFRa‰M: O mais importante a respeito do tempo de tela équalidade versus quantidade. a‰ especialmente importante quando se trata deste momento do COVID-19 porque, como os alunos estãofora da escola, eles estãoconectados a outras pessoas por meio de seus dispositivos quase que exclusivamente. O debate sobre o tempo de tela, portanto, mudou enormemente. Antigamente, os adultos ficavam preocupados com o fato de as criana§as passarem muito tempo online, mas não háescolha durante o COVID. Felizmente, estãode acordo com a pesquisa que mostra que o ponto qualitativo émais importante do que o quantitativo.

Quais são os efeitos reais das ma­dias sociais e do tempo de tela no aumento da depressão e da ansiedade entre os jovens?

PALAFRa‰M: A pesquisa estãonos dizendo que háum aumento para muitos jovens do estresse, ansiedade, depressão e suica­dio em geral. Tambanãm sabemos que as criana§as estãousando a tecnologia mais do que antes. Nãosabemos se existe uma ligação causal entre os dois. a‰ importante, como pesquisadores, dizer o que sabemos e o que não sabemos. Uma hipa³tese éque a tecnologia pode agravar as condições que os jovens tem. Um exemplo éum transtorno alimentar, que pode ser uma forma extrema de ansiedade, transtorno obsessivo-compulsivo e assim por diante, um jovem pode ser propenso, pela genanãtica e pelo ambiente, a ter esse transtorno. Quando eles acessam o Instagram e veem a versão mais bonita e magra de todo mundo, eles podem internalizar isso como parte da ansiedade que estãotendo. Em casos como esse, a tecnologia pode agravar as situações subjacentes, mas não éa causa. O desafio éter que analisar as coisas e responder apropriadamente de acordo com a situação de cada pessoa.

“Tanto os jovens quanto a tecnologia digital são melhores do que sua reputação.”

- Urs Gasser

GASSER:A pesquisa também mostra que criana§as com ansiedade moderada podem realmente se beneficiar e encontrar apoio nas redes sociais, como uma forma de lidar com seus desafios. Ha¡ um papel positivo que as ma­dias sociais podem desempenhar, não apenas sendo parte de um problema complexo, mas também da solução.

O que os pais podem fazer para manter seus filhos seguros online?

GASSER: O ponto mais fa¡cil éque os pais devem comea§ar respeitando a privacidade de seus filhos. Vemos muitos pais postando fotos de bebaªs no Facebook e, a  medida que as criana§as crescem, continuam a usar as redes sociais para compartilhar fotos bonitas com os amigos, o que écompreensa­vel. Mas isso aumenta a preocupação com a privacidade a  medida que o jovem envelhece. Existem conversas que precisam acontecer ao longo do tempo entre pais e jovens sobre o compartilhamento de dados particularmente sensa­veis, para que as criana§as desenvolvam uma consciência sobre o que acontece se vocêpostar uma selfie ou um instanta¢neo de seus amigos nas redes sociais que mais tarde possam fazer parte do o dossiaª digital de seus filhos e pode ser visto na secretaria de admissão da escola. Talvez essa seja a parte mais difa­cil para adultos e pais, mas precisamos entender o que estãoacontecendo com todos os dados e os rastros que deixamos online a  medida que usamos essas tecnologias. Isso remonta ao ta³pico do capitalismo de vigila¢ncia mencionado anteriormente. Os pais ou jovens são limitados pelo que podem fazer para salvaguardar sua privacidade. a‰ aa­ que legisladores e governos devem intervir e fornecer, especialmente aqui nos EUA, privacidade e proteção de dados mais robustas e salvaguardas para jovens e adultos. Os europeus estãoa  nossa frente e precisamos desesperadamente alcana§a¡-los. privacidade e proteção de dados mais robustas e salvaguardas para jovens e adultos. Os europeus estãoa  nossa frente e precisamos desesperadamente alcana§a¡-los. privacidade e proteção de dados mais robustas e salvaguardas para jovens e adultos. Os europeus estãoa  nossa frente e precisamos desesperadamente alcana§a¡-los.

PALAFRa‰M: Algumas palavras adicionais sobre segurança. Fomos levados a acreditar que o a­ndice de danos aos jovens aumentou muito durante a era da internet. Mas acontece que os dados sugerem exatamente o contra¡rio, que éque as criana§as tem menos probabilidade de serem prejudicadas física ou sexualmente por um estranho que conheceram fora de casa nas últimas décadas, durante o crescimento dessas tecnologias. Isso não quer dizer que os jovens não possam ter problemas online, seja em uma função de chat de um jogo ou em uma comunidade da web que édedicada ao sexo, por exemplo. Estas são áreas onde certamente os jovens podem se conectar com pessoas que desejam fazer-lhes mal. Assegurar que os pais estãodando bons conselhos aos jovens sobre a maneira como eles se relacionam com outras pessoas continua sendo importante.

Qual vocêacha que éo principal resultado do seu livro?

GASSER: Se eu pudesse dizer em um tweet, eu diria o seguinte: tanto os jovens quanto a tecnologia digital são melhores do que sua reputação.

Esta entrevista foi condensada e ligeiramente editada para maior clareza.

 

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